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Paraense de 10 anos busca apoio para participar de seletiva do Bolshoi

Kézia Costa foi uma das 12 pessoas selecionadas para participar da seleção no sul do país; assista

Ana Carolina Matos/Redação Integrada

Quem observa de longe Kézia Costa, de 10 anos, nem imagina o tamanho da menina de sorriso doce e olhar que prefere mirar o horizonte quando fala com estranhos. A pequena se mostra gigante quando prende o cabelo em um coque alto, coloca o collant, a meia-calça rosa quase sem cor e calça a sapatilha de ponta. A dedicação ao balé que começou com pouco mais de 3 anos de idade já rendeu frutos. A garota foi uma das 12 paraenses escolhidas para participar de uma seleção da Escola do Teatro Bolshoi no Brasil, durante a seletiva anual da filial que ocorreu em Belém em junho deste ano. 

Agora, a luta dos familiares e dos envolvidos no projeto Meia Ponta-Ponta realizado na Paróquia de Senhora do Perpétuo Socorro, o qual menina faz parte, é conseguir que Kézia participe das seleções na cidade Joinville, em Santa Catarina, onde está o Bolshoi no Brasil. 

Para o pai da menina, Semuel Costa, o desafio é grande. Desempregado desde o final de 2017, o bacharel em Sistemas da Informação fez rifas e criou uma vaquinha online para conseguir apoio, mas ainda não obteve o valor necessário. Uma boa notícia, entretanto, já deixa o sonho de pai e filha mais próximos da concretização: as passagens já foram garantidas pela Pastoral do Menor, que também auxilia o projeto.

Semuel não esconde o orgulho da filha mais velha. "Esse ano foi a primeira vez que coloquei ela pra fazer a seleção, com incentivo da professora. Fui surpreendido com a classificação. Ela tem muito talento, mas é muito concorrido. Eu pude observar a grande quantidade de meninas, tinham 150 meninas só na turma que ela foi. E ela está entre as 12 classificadas do Estado", destaca, com uma felicidade que transparece mesmo para quem tem um ar mais sério. 

"Sei que ela vai bater essas asinhas e voar muito alto"

A próxima etapa da seleção ocorrerá nos dias 18, 19 e 20 de outubro de 2019 e, para o pai, representa uma mudança de vida. "Com certeza pra ela vai ser um divisor de águas e na nossa família também. Ela é a minha filha mais velha. É minha companhia indispensável. Não consigo me imaginar longe dela. Por um lado é uma alegria e realização pra mim e pra ela também. Existe uma preocupação de mudança de vida porque lá é outro estado, outra realidade, mas quero dizer que vale a pena, sim, enfrentar os riscos. Vou fazer o possível pra realizar isso pra ela porque sei que ela vai bater essas asinhas e voar muito alto", comenta.

Com uma timidez característica das crianças, os olhos da pequena Kézia brilham ao falar da sua maior paixão: o balé. "Eu espero que dê tudo certo porque pra mim é um grande sonho ser uma bailarina um dia", comenta, sorrindo. Durante a intensidade das seleções locais, a bailarina, mesmo nervosa, conseguiu dar o melhor de si. "Na hora bateu um pouquinho de nervoso mas depois passou. Eu tava passeando com a minha tia e quando o pai me ligou avisando, eu fiquei muito feliz", relembra a menina.

PROJETO

A professora Elaine Brandão explica que o Projeto Meia Ponta-Ponta já existe há dez anos e, pelo menos há três deles, é realizado na paróquia. Neste ano, a inscrição de Kézia na seletivas do Bolshoi foi como um "teste". "Quando participamos do Dança Pará, fomos muito assediadas por conta das meninas por outras escolas. Aí aquilo foi despertando na gente um interesse. Acabou que deu certo de uma passar mas a gente resolveu fazer um teste pra ver como funciona, mas temos outras meninas com muito potencial também", conta. "Pra ela que é de baixa renda, o Bolshoi é muito bom porque ela não vai pagar nada. São oito anos de formação e ela já sai profissional. Se quiser, pode ir pra outro país, conseguir uma bolsa... Tudo vai depender do empenho dela", ressalta. 

Atualmente, a iniciativa atende 70 meninas carentes, com idade entre quatro e 16 anos de idade e as inscrições ficam abertas durante todo o ano. "Quem quiser, é só chegar na sala do balé e solicitar a inscrição. As aulas funcionam às segundas e quartas, às 17 horas. Há apenas uma taxa de ajuda de R$30. São quatro turmas e a gente vai dividindo conforme o grau de dificuldade", detalha. "Fiz um projeto e a igreja abraçou a ideia. Pedi uma sala pra dar aula e consegui. Já tinha os espelhos e fui estruturando com as barras e outras coisas. A gente cobra esse valor só pra manter o espaço. A igreja entra com ajuda em figurino, transporte, ajuda muito", acrescenta.

"Assim como a Kézia conseguiu, outras crianças podem também"

Mesmo com dificuldades financeiras enfrentadas pelas famílias das alunas, a professora pontua o empenho dos familiares em fazer com que as meninas tenha uma oportunidade diferente por meio da dança. "A gente vê como é grande a dificuldade, mas elas vêm. As mãezinhas se esforçam pra trazer. A gente vai vendo isso e vai criando amor, vai criando uma família, então a gente se esforça pra manter esse projeto", conclui.  

Coordenadora da Pastoral do Menor em Belém, Irna Pantoja destaca a importância social de projetos de resgate de crianças em locais de vulnerabilidade, como os bairros do Barreiro e do Telégrafo, por exemplo. "O balé não é uma fuga, é a transformação da vida dos nossos meninos porque enquanto eles estão nas atividades, seja balé, esporte, cultura de modo geral, isso garante que eles estão fora da violência. Eles não correm risco. E acaba que é bom não só para a questão física, mas como para a educação", defende.

"O projeto oportuniza sonhos altos e eles vão voar bastante"

Além disso, promover aulas de modalidades restritas à nichos sociais elitizados, também é uma forma de proporcionar uma reinserção dos pequenos, avalia ainda Irna. "O projeto vem garantir o direito que essas crianças tenham à cultura, ao lazer e em especial, claro, ao balé que a gente sabe que ainda é uma dança que é pras pessoas que tem um recurso a mais, é algo elitizado ainda", pontua. 

Confira o vídeo:


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