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Liminar do TSE contra Lollapalooza preocupa produtores culturais

Desde 2020, o evento paraense Facada Fest responde processo por um cartaz do evento.

Enize Vidigal

A realização do Festival Lollapalozza, nos últimos dias 25, 26 e 27, em São Paulo, marca a volta dos grandes festivais no Brasil desde o início da pandemia. Mas a decisão liminar emitida no fim de semana pelo ministro Raul Araújo, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), impedindo as manifestações políticas no evento, foi criticada como censura e desperta a preocupação de novas investidas contra a liberdade dos artistas e do público, mesmo fora do período eleitoral. A decisão de Araújo atendeu a pedido do partido do presidente Jair Bolsonaro (PL).

A situação faz lembrar o Festival Facada Fest, que aconteceu em Belém, em 2019, e que levou os organizadores a responderem processo até os dias de hoje devido a um cartaz do evento que trazia um palhaço empalado por um lápis que usava a faixa presidencial. “Só estávamos fazendo um show”, diz um dos organizadores daquela edição, o músico Jayme Katarro. Ele conta que a intenção do ilustrador Paulo Victor foi criticar os cortes na educação. O cartaz rendeu críticas do deputado federal Éder Mauro (PL) e de um dos filhos do presidente, antes do processo ser processo, em 2020. “Os festivais punks sempre fizeram críticas sociais, desde os anos 80, no Brasil e no mundo”, justifica.

Desde o início do Lollapalooza, o coro “Fora Bolsonaro” foi entoado em vários shows. O ponto alto foi quando a cantora Pabllo Vittar - apoiadora declarada do ex-presidente Lula (PT) - desceu do palco e apanhou uma bandeira do Lula com a qual circulou entre a plateia. A decisão do ministro fixou multa de R$ 50 mil a quem violasse a proibição de “manifestação de propaganda eleitoral ostensiva”.

A decisão foi criticada por outros ministros do próprio TSE, com promessa de reversão no julgamento do caso em plenário. “Merece o repúdio dos que respeitam o regime democrático e a liberdade de manifestação do pensamento”, declarou o decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello. O Partido dos Trabalhadores e a organização do festival entraram com recurso junto ao TSE, enquanto Emicida recorreu ao STF.

Ao contrário do que visou a decisão, os artistas se sentiram ainda mais estimulados a criticar o presidente: “Cala a boca já morreu. Quem manda na minha boca sou eu. Censura nunca mais”, bradou Lulu Santos do palco. A Banda Fresno estampou o “Fora Bolsonaro” no telão do palco durante a apresentação, enquanto Emicida usou o espaço para incentivar os jovens menores de 18 anos a tirarem o título de eleitor para votar contra a reeleição do presidente.

O produtor cultural paraense Gustavo Moreira, que atua em eventos como Circuito Mangueirosa e Arrastão do Pavulagem, avalia que a tentativa de calar os artistas é preocupante. “Há algum tempo, (governo) vem cercando as pessoas que fazem cultura com esse tipo de atitude”, diz ele, referindo-se, por exemplo, à recente alteração na lei federal de incentivo à cultura que impõe cachês menores. “É evidente que há ações que vão de encontro com à indústria cultural, os artistas e os produtores”.

“A gente não pode censurar os artistas que a gente contrata, é impossível, é inconstitucional. É uma cobrança sempre irracional e pautada em manipulação dos fatos”, critica. “É natural que isso (crítica) aconteça em qualquer país. Onde tem cultura, tem questionamento. Quem não entende dessa forma, talvez não tenha amor pela democracia”, avalia. “Esse tipo de represália é comum agora, a gente não se lembra de represálias desse tipo em um passado recente. Nem os produtores e nem os artistas devem se abalar por isso”, conclui.

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