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Conheça a história de Eneida de Moraes, escritora paraense que faria 115 anos nesta quarta

Ela é considerada uma das escritoras mais importantes na história da literatura paraense

Vito Gemaque
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Vanguardista revolucionária na literatura, na política e no Carnaval, as influências da escritora Eneida de Moraes (1904 – 1971) estão em toda a cultura paraense e brasileira. Eneida, como era conhecida pelos amigos, completaria hoje, dia 23 de agosto, 115 anos de nascimento. A escritora de vários livros de crônicas que defendia e transmitia a cultura popular em tudo o que escrevia, assim como a defesa de um mundo mais justo e igualitário, continua viva e semeando a liberdade para quem lê suas obras.

Leia também: - Onde estão os herdeiros de Eneida de Moraes?

Com 11 obras publicadas e várias traduções Eneida foi influente no meio literário e semeava profícuas amizades com outros grandes escritores modernistas como Carlos Drummond de Andrade, Dalcídio Jurandir e Graciliano Ramos. Dentre os livros mais famosos estão os de crônicas ‘Aruanda’ e ‘Cão da Madrugada’ e o autobiográfico ‘Banho de Cheiro’. Ela ainda foi a primeira a escrever sobre o carnaval brasileiro no livro ‘História do Carnaval carioca’ (1958).

Jornalista comunista e feminista, a paraense nunca se furtou em enfrentar o lugar que lhe reservavam. Era considerada subversiva por sempre estar envolvida em greves e manifestações contra o capitalismo e o governo de Getúlio Vargas. Em entrevista para o Museu da Imagem e do Som, Eneida sucintamente resumiu sua personalidade em 1967. “Eu sou rigorosamente uma mulher do povo. Nada que for fora do povo não me interessa. E também não nasci espectadora. Nasci para tomar parte no negócio. Então todas as coisas do Brasil me interessam, tudo, tudo me interessa”, declarou.

A declaração é confirmada pela história. Como participação na tentativa de revolução brasileira do Partido Comunista, em 1935, sofreu uma das prisões mais demoradas da vida. Durante um ano e cinco meses Eneida ficou presa na Casa de Detenção da Rua Frei Caneca, no Rio de Janeiro. Junto com ela, na sala 4, estavam outras militantes presas como Maria Werneck de Castro e Olga Benário, da qual foi intérprete na cadeia, já que a alemã só se comunicava em francês. Este período foi imortalizado em suas crônicas e na obra “Memórias do Cárcere”, de Graciliano Ramos.

image Eneida de Moraes foi presa durante a Ditadura do Estado Novo pelas atividades políticas. (Acervo do Grupo de Estudo Eneida de Moraes)

Outra característica era a solidariedade com os novos escritores. Em 1962, um jovem poeta promissor foi incentivado e ajudado por Eneida para que tivesse sua poesia publicada. O escritor, que depois virou um amigo, e um dos mais importantes autores paraenses da atualidade era João de Jesus Paes Loureiro. O universitário foi ao Rio de Janeiro publicar um poema em uma coletânea de novos poetas do Brasil da editora Civilização Brasileira por indicação de Eneida.

“A lembrança é uma mulher de sentimento livre, de uma grande inteligência, com uma utopia política de um Brasil justo com forte expressão literária, sendo que tanto no romance, quanto nas crônicas sempre estava presente a memória do Pará, mas sobretudo a expressão de uma mulher escritora que ultrapassou as limitações do seu tempo, sendo pioneira na afirmação da mulher como intelectual independente e com a sua maneira de viver livre e precursora na mentalidade feminina atual”, recorda o poeta.

Uma máscara utilizada por Eneida de Moraes era a carnavalesca. Ela foi autora da primeira grande obra sobre a maior festa popular brasileira com o livro ‘História do carnaval carioca’ (1958), que estabeleceu as principais categorias do carnaval brasileiro ao definir o conceito de cordões, corso, ranchos, sociedades e entrudo, e outros. Foi ainda criadora do Baile do Pierrot, no Rio de Janeiro e em Belém.

image Eneida de Moraes foi uma grande carnavalesca criadora do tradicional Baile do Pierrot no Rio de Janeiro e em Belém. (Acervo Grupo de Estudos Eneida de Moraes)

O professor de doutorado do Programa de Pós-Graduação Comunicação, Linguagens e Cultura da Universidade da Amazônia (Unama), José Guilherme Castro, afirma que a escritora sempre rompeu todas as barreiras desde criança, desde quando se negou a vestir somente azul e branco, por causa da promessa de uma parente. “Eneida é uma mulher de vanguarda que abriu a porta para outras mulheres não só na literatura como na história social”, enfatiza.

Castro teve objeto de mestrado as crônicas de Eneida de Moraes. As obras dela continuam importantes e atuais para entender o mundo. “Quem lê a obra da Eneida está praticamente vendo a atualidade”, destaca. “Ela abre caminho para outras mulheres escreverem na literatura brasileira. Acredito que a Eneida não teve mais projeção devido ao problema da política. Antes quando se falava em Eneida se torcia a cara, era vista com olhos esquisitos, por ser comunista”, enfatiza.

image Eneida sempre esteve ladeada por grandes escritores e intelectuais brasileiros como o poeta Carlos Drummond de Andrade. (Acervo Revista Asas da Palavra nº 6)

Segundo jornalista e escritor, João Carlos Pereira, Eneida foi uma cronista extraordinária que revolucionou a crônica brasileira. “A Eneida subverte qualquer conceito de crônica. Ela faz um texto muito longo, mas que é crônica, não tem nada a ver com conto. Ela subverte com o tamanho e são crônicas em que o texto dela é especial pelo lirismo que imprime”, destaca.

Os versos do refrão do poeta João de Jesus Paes Loureiro, no samba-enredo da Escola ‘Quem São Eles’ de 1970, Eneida segue sempre livre, sempre livre e sempre viva. Todos tem a certeza que a escritora hoje estaria na vanguarda dos movimentos que pedem um Brasil mais justo, democrático e digno para o povo, sendo principalmente um baluarte e bussola para o feminismo brasileiro. “A mulher como protagonista da história”, define Paes Loureiro.

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