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Marília Mendonça é motivo de orgulho para o Brasil

"Marília dedicava tanta realidade às canções dela que as histórias pareciam inventadas. Mas a maioria tinha acontecido com ela. E o Brasil era o fiel confidente dela"

Eduardo Laviano

Caetano Veloso apelidou ela de Maravília Mendonça na canção Sem Samba Não Dá do novo disco dele, lançado este mês. E de fato não há palavra melhor para descrevê-la.

Marília era uma Maravilha por muitos motivos. Para começar, ela botou na mão das mulheres o protagonismo da música sertaneja brasileira, escrevendo e interpretando as dores reais do dia a dia de milhares de brasileiras apaixonadas e traídas, com a mesma garra e sagacidade com a qual dezenas de homens dominaram o gênero no país por décadas.

Falou de chifres, porteiros que nem interfonam quando o namorado chega, farras que terminam em recaídas com paixões do passado (quem nunca?) e a solidão de quem é a “outra” e sempre será.

Marília dedicava tanta realidade às canções dela que as histórias pareciam inventadas. Mas a maioria tinha acontecido com ela. E o Brasil era o fiel confidente dela.

Com a própria obra, a compositora discorreu sobre os defeitos e qualidades que cabem a todos os humanos e emocionou e divertiu plateias nababescas, sempre em grandes arenas e estádios.

Na internet, todos ficavam impressionados com a simplicidade dos vídeos dela tomando uma cervejinha e cantando um modão no violão, sempre em uma cadeira de plástico como todo bom brasileiro no final de semana.

Marília era tão apaixonada pelo Brasil que em 2018 deu início a um projeto ambicioso: o disco “Todos os cantos” teve cada música gravada em uma capital brasileira, e Belém foi eleita para ser a primeira, em gesto de agradecimento ao Pará, o estado onde ela fez o primeiro show dela, em Itaituba, oeste paraense.

Tudo feito de surpresa em palco montado na Praça do Relógio. A cidade parou, o trânsito ficou congestionado por horas e Marília era só sorrisos. Quem estava lá não esqueceu. A música “Ciumeira” se tornou uma das mais tocadas do ano e deu o pontapé inicial para uma das turnês mais bem sucedidas do Brasil.

Marília era Goiás no sotaque e Brasil no coração. Turistava nas cidades, comia comidas típicas, fazia videochamadas com os fãs e compartilhava tudo no Instagram como uma amiga íntima. Foi motivo de orgulho para milhões de gordinhas que se inspiravam com toda a beleza e sensualidade dela, respondendo com classe às críticas ao seu corpo, e motivo de mais orgulho ainda após se retratar por uma piada LGBTFóbica e convidar especialistas no tema para esclarecer os sofrimentos que a comunidade sofre no Brasil, tudo ao vivo em lives que bateram recordes na pandemia.

Marília leva com ela parte de um Brasil jovem, criativo, que ocupa os espaços com bom humor, talento e autenticidade em uma época em que tudo é “fake” demais. Num mundo que valoriza o ego, Marília era humildade pura. Num cotidiano que valoriza a mentira, Marília era verdade da cabeça aos pés. A sofrência (e a música brasileira) nunca mais será a mesma.

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