Dia do Cinema Brasileiro, nesta quinta-feira, 19, causa reflexões sobre o momento atual
Data serve para lembrar o dia em que foram feitas as primeiras imagens no Brasil a partir do cinematógrafo e oportuniza reflexões acerca da produção nacional, o que inclui o cinema produzido na Amazônia
Em 2025, o Dia do Cinema Brasileiro, que transcorre nesta quinta-feira (19), tem muitos motivos para ser celebrado. Além de toda uma trajetória consistente e funcionando como fonte de conhecimentos artísticos, históricos e culturais, o cinema produzido no Brasil conquistou, no ano em curso, o seu primeiro Oscar, como melhor filme internacional com “Ainda Estou Aqui”, do diretor Walter Salles.
Com esse mesmo filme, a atriz Fernanda Torres obteve duas conquistas magistrais: o Globo de Ouro de Melhor Atriz de Drama no Festival de Cinema de Berlim e o de Melhor Atriz do Satellite Awards. Além disso, Wagner Moura foi premiado como Melhor Ator no Festival de Cannes 2025, pela atuação dele em “O Agente Secreto”, dirigido por Kleber Mendonça Filho. Kleber levou a estatueta de melhor diretor no festival. Essa projeção da Sétima Arte brasileira envolve a descoberta de talentos regionais, inclusive, no Pará, na Amazônia.
“O cinema brasileiro vive o seu momento de ouro. Fazia tempo que o cinema brasileiro não ganhava uma projeção tão grande em nível internacional e nacional que pudesse ser comemorada. Hoje, a gente tem uma grande média de ocupação de salas com o cinema brasileiro e, ainda mais, nós temos uma visibilidade muito grande para o cinema brasileiro, isso acontece no mundo todo, com a premiação de vários filmes em vários festivais”, afirma o jornalista e crítico de Cinema, Ismaelino Pinto.
Ele esclarece que não se trata apenas de premiações em grandes festivais, mas em eventos dessa natureza pouco conhecidos, como Málaga, San Sebastian e outros. Ismaelino também comemora, como consequência desse processo, uma afluência maior dos espectadores às salas de cinema “para ouvir a sua língua”.
O incentivo governamental dado ao cinema do Brasil tem sido um dos fatores do sucesso da produção nacional, como pontua Ismaelino Pinto. Ele observa, inclusive, o crescimento da produção regional. Nesse processo, são importantes os festivais de cinema organizados pelo Brasil afora, com destaque para os eventos regionais. Ismaelino lembra que o Brasil perdeu a Embrafilme, em contraponto ao fato de que países europeus têm suas distribuidoras estatais para essa finalidade. Mas, o Brasil retorna com novas perspectivas. “O que falta são salas de cinema. Tem muito filme brasileiro sendo feito mas não consegue chegar, porque nós precisamos de uma cadeia exibidora que seja adequada e que seja cumprida a legislação sobre a cota de exibição de filmes nacionais”, destaca. “O cinema brasileiro é a cara do Brasil, é plural, diverso, é o nosso espelho”, arremata Ismaelino.
Comunidade nas telas
Aos 28 anos de idade, a paraense Joyce Cursino nasceu em Belém, mas tem uma relação umbilical com o interior da Amazônia. Joyce é, por parte de mãe. descendente de comunidades quilombolas do município paraense de Bujaru. Já por parte de pai, a origem dela é ribeirinha, da região do Acará, especificamente da Ilha do Maracujá. Cresceu na periferia, no bairro do Jurunas. “É desse cruzamento de vivências: quilombola, ribeirinha, periférica e amazônida, que construo meu caminho como artista. Sou atriz, diretora, roteirista, jornalista e ativista dos direitos humanos e da floresta. Minha arte é uma extensão da minha ancestralidade”, destaca Joyce Cursino.
Como atriz, Joyce já atuou em quatro séries de TV nacionais: “Squat na Amazônia”, “Sacoleiras S/A”, “Amazônia Oculta” e “Condor”, esta última da produtora amazônida Visagem Filmes. “Também atuei em curtas, videoclipes e campanhas, como a narração de ‘Amazônia, Mãe do Brasil’ e o curta internacional dirigido por David Darg para a série ‘Future Forward’, lançada na Amazon Prime”, conta.
No longa “Os Fãs Mais Rebeldes que a Banda, recebeu o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante no Festival Guarnicê, em 2022. Também integra o elenco principal do longa “Eu, Nirvana”. Meu trabalho mais recente é em ‘Geni e o Zepelim’, direção de Anna Muylaert, onde divido o set com grandes nomes do cinema brasileiro como Seu Jorge, Shirley Cruz e a protagonista Ayla Gabriela”, destaca Joyce.
Como diretora e roteirista, ela assina: os curtas premiados “É Coisa de Preta” (2017) e “Ele Não: Mulheres Paraenses contra o Fascismo” (2019); e ainda o curta híbrido “Sangue Bom” (2022), sobre dignidade menstrual, selecionado no Festival Curta o Ciclo da Kimberly-Clark Brasil; o média-metragem documental “7 Palmas da Liberdade”; o curta de ficção “Bárbara”, em fase de pós-finalização; o documentário “Amazônia Segundo as Juventudes – Um Olhar Intergeracional” (2022), exibido na COP 27, no Egito; e as webséries “Pretas na Pandemia” (Lei Aldir Blanc) e “Resiliência”, que representou o Brasil na competição internacional Black Women Disrupt the Web, transmitida pela plataforma KweliTV.
“Conheci o audiovisual pela atuação. Minha primeira experiência foi como atriz na websérie ‘Squat na Amazônia’, o que despertou em mim um interesse maior pela linguagem do cinema. Mas foi ao entrar de fato no mercado, entendendo como funcionam os bastidores da indústria audiovisual, que percebi a profundidade das desigualdades — especialmente raciais, sociais e territoriais — que estruturam esse espaço”, diz Joyce.
Ligada à luta por mais representatividade e justiça dentro do cinema, Joyce fundou a Negritar Filmes e Produções, produtora de impacto composta por pessoas negras da Amazônia. E também criou o projeto Telas em Movimento – voltado para a democratização do acesso ao cinema nas periferias e comunidades tradicionais da Amazônia.
“Já percorremos diversas regiões do Pará — das baixadas urbanas às ilhas e comunidades indígenas e quilombolas— levando exibições, oficinas, trocas e afeto. O objetivo é claro: mostrar que a Amazônia também é autora de suas próprias narrativas, e não apenas cenário para olhares de fora. O cinema que construo é uma ferramenta de educação, afirmação e defesa do território”, afirma. No Dia do Cinema Brasileiro, a produção cinematográfica amazônida pulsa.
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