Coluna do Estadão: O que está por trás da nova declaração de Lula sobre sua saúde e as eleições
Por Roseann Kennedy, do Estadão
Há um cálculo político por trás da declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante Congresso do PT no final de semana, de que precisa estar com 100% de saúde para disputar a reeleição em 2026. A princípio, não há novidade em seu quadro clínico. Os laudos mais recentes dos médicos apontam plenas condições de ser candidato. Porém, o balde de água fria da pesquisa DataFolha divulgada neste domingo, 3, gerou reflexões no Palácio do Planalto.
Não é a primeira vez que Lula condiciona a candidatura à sua condição de saúde, mas fazia algum tempo que esse critério não aparecia em seus discursos. O petista disse que precisa ser honesto com ele mesmo, com a sociedade e com o partido para que não se lance como fez Joe Biden. O ex-presidente americano tentou concorrer à reeleição no ano passado, mas recuou por questões de saúde.
Lula, entretanto, afirmou que nunca esteve tão bem fisicamente e que, se concorrer, pretende disputar para ganhar. "Tenho que ser muito honesto comigo. Preciso estar 100% de saúde. Me candidatar e acontecer o que aconteceu com Biden, jamais. Quando falo que tenho 80, energia de 30, podem acreditar", ressaltou.
O levantamento do DataFolha, ao contrário de outras pesquisas, mostrou que Lula não decolou. O petista manteve 40% de avaliação ruim ou péssima, e oscilou de 28% para 29% de ótimo ou bom.
PT não tem alternativa a Lula, mas petista pensa na própria biografia
A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, já disse que não há alternativa a Lula para 2026 e que somente o presidente poderia vencer a direita. No entanto, está em jogo a própria História do petista. Lançar-se candidato com risco de ser esmagado é algo que não honraria sua trajetória, especialmente após a volta ao poder depois da prisão.
Lula foi derrotado três vezes - em 1989, 1994 e 1998 - antes de chegar à Presidência. Conseguir o posto nunca foi fácil. Primeiro, chegou lá pela apatia do PSDB. E não porque fora ungido. Apesar de ter pregado a "onda vermelha", não foi bem assim. Foi eleito em 2022 com 61,24 % em segundo turno. Também teve reeleição fácil. Lula não conseguiu vitória em primeiro turno, como ocorrera com seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso.
Depois, Lula chegou novamente à presidência mais pelos escárnios do bolsonarismo - com os casos Carla Zambelli e Roberto Jefferson - e a veborragia negacionista de Jair Bolsonaro do que pelos próprios méritos. Venceu o ex-presidente por 50,9% a 49,10 em 2022, no resultado mais apertado desde a redemocratização.
Centrão mantém distância segura de Lula
Os próprios petistas admitem internamente que a reeleição não será fácil. Uma mostra disso é a postura do Centrão. Quando esse bloco sem coloração partidária enxerga a vitória, logo pula para dentro do barco e levanta a coroa. Mas, ao contrário disso, agora está cada vez mais com o pé fora.
O União Brasil, por exemplo, tem presidenciável - o governo de Goiás, Ronaldo Caiado - e já se afasta até no Nordeste. Caso do senador Efraim Filho (PB), que recebeu apoio da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro para disputar o governo local, e do presidente da sigla, Antonio de Rueda, que é de Pernambuco, terra de Lula.
O PSD já deixou claro que apoiaria Tarcísio de Freitas ao Planalto. Sem o governador de São Paulo na disputa, o partido de Gilberto Kassab tem candidatura a presidencial do governador do Paraná, Ratinho Júnior, que tem se movimento para angariar apoio.
O MDB, que já teve pretensos candidatos a vice de Lula - o governador do Pará, Helder Barbalho, e o ministro dos Transportes, Renan Filho - acompanha o passo a passo o cenário e adota parcimônia. Por ora, não fará nenhum movimento enfático para 2026. Continuará com apoio a Lula no Nordeste e mantendo certo afastamento no Sudeste e Centro-Oeste.
Obviamente, qualquer alteração no quadro clínico de Lula pode ser o mais relevante dos cenários. Entretanto, mesmo com a saúde boa, o presidente terá esse argumento como álibi para não correr o risco de um vexame em 2026.