A riqueza do imaginário amazônico em destaque na Feira Pan-Amazônica do Livro
Pesquisadora Socorro Simões fala sobre as narrativas inspiradas na tradição oral no Encontro Literário e Vicente Cecim lança 'Os Jardins e a Noite'
A região amazônica concentra uma riqueza viva em constante transformação em fase de descoberta pelos pesquisadores. Essa riqueza incomensurável em números pode até ser confundida com a biodiversidade de fauna e flora da região. Entretanto, este é um tipo de patrimônio criado pelo homem amazônida - o imaginário.
A imaginação dos habitantes das florestas e das cidades, que procura dar explicações para os fatos vivenciados no dia a dia, será o tema da programação desta quarta-feira, dia 28, da 23ª Feira Pan-Amazônica do Livro e das Multivozes.
Podemos considerar imaginário como o conjunto de "imagens", ou lembranças, que guardamos no decorrer da vida, intimamente relacionados com nossas emoções. De acordo com a professora e pesquisadora da Universidade Federal do Pará (UFPA), Maria do Socorro Simões, este imaginário amazônico ainda está sendo registrado em livros. A tradição oral das populações, principalmente dos interiores da Amazônia, passa as histórias de geração em geração.
"Nós ainda não temos muitos registros disso. Temos referências em livros sobre a Amazônia como criação dos nossos escritores e teóricos, como Vicente Salles. Outra coisa é a vivência do contador. É a pessoa falar 'e daí aquele rapaz bonito veio para festa, e conquistou a minha filha, depois quando olhamos pela fechadura vimos que não era um homem, era um boto'. Essa vivência é particular, com suporte da experiência, isso só os nossos contadores podem fazer", explica.
A coordenadora do projeto de extensão e pesquisa da UFPA "Imaginário nas Formas Narrativas Orais Populares da Amazônia Paraense" (Ifnopap), Socorro Simões, já visitou 133 municípios paraenses recolhendo os causos, lendas e mitos da população. No total foram publicados 26 livros, dentre eles quatro específicos com as narrativas dos moradores de Belém, Bragança, Abaetetuba e Santarém. Socorro Simões será a convidada do Encontro Literário, que acontecerá às 20h, na Arena Multivozes, no dia das 'Vozes do Imaginário Amazônico'.
Os Jardins e a Noite e o mundo de Andara
Os escritores paraenses se inspiram na região para transformá-la em literatura, rescrevendo e sendo influenciados, cada um a sua maneira, pelo imaginário amazônico. Um dos autores criador de um universo imaginário é Vicente Franz Cecim, que apresentará a palestra "Amazônia Imaginal", às 17h, na Arena Multivozes.
Junto com a palestra Cecim lançará a edição bilíngue português e francês de "Os jardins e a noite". O livro recebeu menção especial no Prêmio Literário Internacional Plural, no México, em 1981, e, em 1988, foi um dos sete livros de Andara reunidos no volume que recebeu o Grande Prêmio da Crítica da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).
"Geografia verbal dialogando com a geografia física da Amazônia, onde nasci, que, por ser lugar de natureza é lugar do sagrado em epifania. Se não existisse a Amazônia e não se desse o acontecimento fatal de eu ter nascido nela, não haveria Andara. Andara começou se nutrindo da Amazônia. Da realidade onírica da Amazônia. A Amazônia é um tecido de existências e fábulas. Aqui, não há fronteiras nítidas demarcando onde terminam as realidades manifestas e começa o sonho. Como em Andara não há", reflete Cecim.
Walcyr Monteiro, o escritor das visagens e assombrações, é lembrado
Um dos melhores tradutores do imaginário amazônico foi Walcyr Monteiro. O conhecido escritor do livro "Visagens e Assombrações de Belém" deixou como legado extensa bibliografia sobre as lendas, mitos, assombrações e visagens.
Em homenagem ao escritor, que faleceu em maio deste ano vítima de uma pneumonia, aos 79 anos, a 23ª Feira Pan-Amazônica do Livro nomeou o espaço voltado para as crianças de Arena Walcyr Monteiro.
Um dos filhos de Walcyr, o advogado Átila Monteiro, revela que a família ficou honrada com a homenagem. "Em seus últimos momentos de vida, assumi o compromisso pessoal com meu pai de divulgar, distribuir, publicar, editar e reeditar, todas as obras que ele produziu como fruto de pesquisas de toda a sua vida. Walcyr foi pioneiro no registro das histórias contadas até hoje, pelo ribeirinho, pelo caboclo, e por todos aqueles que habitam as pequenas e grandes cidades de nossa imensa Amazônia", detalha.
Em frente à arena, os visitantes podem comprar todas as 19 publicações deixadas como legado pelo escritor. Os valores vão de R$ 5 a R$ 55, com descontos para pagamentos em dinheiro e para estudantes e professores da rede pública de ensino.
"Ele levantou e empunhou a bandeira de que nossa riqueza maior não se encontra em nossas jazidas de minério de ferro, de ouro ou de bauxita, muito menos em nossas madeiras nobres, mas, sim, nas nossas lendas, mitos, folclore e tradições da Amazônia", destaca o filho."Walcyr acabou se tornando o que tanto registrou em seus livros: uma lenda do folclore Amazônico", complementa.
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