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‘Maior delegação indígena da história das COPs’: Sonia Guajajara destaca resultados na COP 30

Ministra dos Povos Indígenas, destacou os avanços na participação indígena na COP 30 e reforçou a necessidade de políticas de financiamento e demarcação de terras para enfrentar a crise climática.

Jéssica Nascimento

A ministra dos Povos Indígenas do Brasil, Sonia Guajajara, celebrou a maior delegação indígena da história das conferências climáticas na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30) em Belém. Em entrevista exclusiva ao Grupo Liberal, ela destacou o impacto positivo da articulação entre o Ministério dos Povos Indígenas, organizações indígenas e o governo federal para garantir uma presença marcante dos povos no evento climático internacional.

egundo ela, essa união garantiu não apenas credenciais para a Zona Azul, mas também processos preparatórios que permitiram aos povos indígenas ocupar todos os espaços de debate climático. Guajajara afirmou que espera que a forte participação desta edição se consolide nas próximas conferências, defendendo que nenhum debate climático pode avançar sem considerar o protagonismo indígena. Para ela, o reconhecimento dos territórios como ferramentas de mitigação e a criação de mecanismos de financiamento direto aos povos são condições essenciais para enfrentar a crise global.

A ministra também ressaltou que as operações de desintrusão realizadas principalmente no Pará tiveram impacto direto na queda do desmatamento na Amazônia, que registra dois anos consecutivos de redução. Ela afirmou que a retirada de invasores — do garimpo ilegal à grilagem de terras — tem demonstrado que a proteção efetiva dos territórios indígenas é uma das medidas mais eficientes para conter a devastação e enfrentar a crise climática.

Ao comentar sobre a importância de sediar a COP em Belém, Guajajara afirmou que o evento aproxima o mundo da realidade amazônica, permitindo conhecer não apenas a floresta, mas também os povos e culturas que a sustentam. Para ela, proteger a Amazônia implica proteger quem cuida dela diariamente. 

A ministra reforçou que proteger o bioma exige garantir segurança, valorização cultural e condições dignas para quem o defende diante da exploração e da destruição que ainda ameaçam a região. Ela destacou que a Amazônia tem a maior quantidade de floresta em pé e maior quantidade de biodiversidade viva.

Ela também enfatizou que a preparação para a conferência envolveu um amplo ciclo de debates em todos os biomas do país, o “COParente”, que serviu para formar lideranças e discutir os impactos da crise climática nos territórios. Essa mobilização resultou na presença de cerca de 360 indígenas credenciados para a Zona Azul e de mais de 5 mil participantes em Belém, marcando uma articulação inédita que une formação política, fortalecimento cultural e alianças internacionais.

Guajajara também elencou as prioridades após o evento da ONU (Organização das Nações Unidas), incluindo acelerar demarcações indígenas, ampliar ações de desintrusão e transformar em política de Estado a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial das Terras Indígenas. Para isso, a ministra citou a garantia do recurso do TFFF (Fundo Florestas Tropicais para Sempre)  Ela reforçou que essas medidas são fundamentais para que o Brasil cumpra a meta de zerar o desmatamento até 2030.

Por fim, a ministra fez um apelo direto aos países desenvolvidos, pedindo que reconheçam a urgência da crise climática e aportem recursos financeiros compatíveis com a gravidade do momento. Guajajara defendeu que as NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas) passem a incluir o reconhecimento dos territórios indígenas como estratégia global de mitigação, reforçando a centralidade dos povos originários na preservação das florestas.

1. Como a COP 30 ampliou a representatividade dos povos indígenas?

Sonia Guajajara: A ampliação dos povos indígenas está se dando a partir de muita articulação do Ministério dos Povos Indígenas com as organizações indígenas, com o movimento indígena internacional e também com o conjunto do governo federal. 

Trabalhamos para que nesta COP a gente tivesse a maior delegação indígena da história das COPs. Conseguimos essa articulação. Conseguimos, além da garantia das credenciais para a zona azul, fazer um processo preparatório também para garantir a presença e a participação indígena em todos os outros espaços da COP.

2. Qual o resultado que você  espera como ministra para os povos indígenas da Amazônia paraense, da Amazônia do Pará, após a COP 30?

Olha, a gente espera que essa participação se consolide e a gente continue com essa grande participação dos povos indígenas nas próximas COPs, porque não dá para continuar esse debate de construir soluções para enfrentar a crise climática sem considerar a participação indígena. 

Então, esse é um ponto. O outro é o reconhecimento dos territórios indígenas como medidas de mitigação da crise climática. Por último, o financiamento direto para povos e organizações indígenas.

Garantindo esse repasse direto para povos indígenas, nós estamos falando, enquanto Brasil, da Amazônia, dos nove estados da Amazônia Legal, dos nove países da Bacia Amazônica. Portanto, a Amazônia paraense, a Amazônia maranhense, toda essa região amazônica estará inclusa dentro desse processo de benefícios do financiamento climático. 

3. De que forma o reconhecimento e a demarcação de terras indígenas contribuem para a mitigação da crise climática?

A Amazônia tem a maior quantidade de floresta em pé, de biodiversidade viva. Nós fizemos agora, pelo Ministério dos Povos Indígenas, as ações de desintrusão dos territórios. A maioria deles foi aqui no estado do Pará, de retirar invasores, seja do garimpo ilegal, seja da extração ilegal de madeira, da grilagem de terra.

Realizamos essas operações e todos os territórios já livres desses invasores trouxeram uma grande contribuição para a redução do índice do desmatamento na Amazônia. A gente já comemora dois anos sequenciais de redução do desmatamento na Amazônia e os territórios indígenas desintrusados tiveram uma contribuição significativa para a redução desse índice do desmatamento.

Portanto, territórios indígenas ou a presença indígena nos territórios demarcados ou não é garantia de floresta em pé, de biodiversidade e de meio ambiente protegido.

4. O que significa para os povos da floresta ter a COP sediada em Belém, no coração da Amazônia?

É a hora do mundo conhecer a Amazônia, ver de perto não só essa Amazônia de florestas, como muitos pensam que é, mas também de conhecer as pessoas, de conhecer a diversidade cultural que tem aqui na Amazônia.

Pensar a proteção da floresta amazônica é também pensar formas de proteger quem protege a Amazônia, de cuidar das pessoas, de valorizar as culturas e de enfrentar toda essa exploração e destruição que a Amazônia sofre hoje.

Então, é muito importante esta COP no coração da Amazônia para que as pessoas entendam a urgência que as pessoas que protegem a Amazônia também têm para ter segurança dentro de toda essa maior floresta tropical do mundo.

5. Como os povos indígenas se organizaram para participar desse momento histórico, dessa conferência climática histórica? 

Foi muita articulação, muita preparação. O Ministério dos Povos Indígenas realizou uma iniciativa que nós chamamos do Ciclo COParente, onde nós realizamos debates com formação e informação e fazendo todo esse diálogo nos territórios, falando sobre a estrutura da COP, sobre o que se discute na COP, quais os temas centrais para este momento, quais os impactos que os povos indígenas já vivem nos territórios como consequência da mudança do clima.

Fizemos um debate muito amplo no Brasil inteiro, em todas as regiões, em todos os biomas. Trazemos pra cá também a necessidade de se reconhecer a importância de proteger de forma igualitária a Amazônia, mas também o Cerrado, a Mata Atlântica, o Pantanal, o Pampa e a Caatinga - todos esses biomas brasileiros que estão sendo igualmente explorados, destruídos.

Foi um debate muito amplo, uma discussão muito ampla para que a gente pudesse ter aqui hoje 360 indígenas credenciados para a Zona Azul, numa articulação com a Casa Civil, com o Itamaraty. Temos aqui 3 mil indígenas alojados na nossa Aldeia COP - esse espaço que a gente construiu pra receber os indígenas.

Além de alojamento, é um espaço de diálogo, de encontros, de trocas, de fortalecimento da cultura espiritual, que é um lugar que nós construímos para apresentar os indígenas do Brasil ao mundo, mas recebemos também os indígenas que vieram de outros países. 

Temos em Belém uma quantidade de pelo menos 5 mil indígenas. Esses 5 mil indígenas estão distribuídos para participar de todos esses espaços de diálogo, do debate que acontece durante toda a conferência. 

6. Quais serão as prioridades do Ministério dos Povos Indígenas após a conferência climática em Belém?

Esperamos que aqui tenham decisões concretas que garantam o reconhecimento dos territórios como política climática, que garantam o financiamento direto para povos indígenas, que reconheçam toda a importância das florestas para mitigação do clima, e em seguida tudo isso possa virar ações de implementação.

O Brasil está com esse compromisso de implementar as ações para zerar o desmatamento na Amazônia, no Brasil, até 2030, e nós nos somamos a todas essas ações. 

Queremos muito avançar com os processos de demarcação de terra indígena, com a continuidade da política de desintrusão dos territórios, como forma de proteger a Amazônia, e a garantia do recurso do TFFF (Fundo Florestas Tropicais para Sempre) para implementar a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial das Terras Indígenas, que já é uma política assinada por decreto.

Estamos em uma articulação no Congresso Nacional para que seja aprovada enquanto lei, enquanto uma política permanente de Estado. Tudo isso acontece durante todo esse período para que a gente tenha resultados concretos e legados desta COP, para que a gente possa implementar ações nos territórios.

7. Qual o apelo da ministra aos países desenvolvidos diante da emergência climática?

É que reconheçam a urgência que o mundo já vive, que aportem os recursos financeiros para que a gente possa seguir protegendo as florestas, os territórios e os povos, e que coloquem nas suas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas) a importância de reconhecer os territórios como uma política climática global.