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Inteligência artificial e satélites impulsionam novo monitor da mineração na Amazônia

Plataforma MinerIA, apresentada na TechZone da COP 30, usa redes neurais e imagens de satélite para identificar garimpos, analisar processos minerários e apoiar ações de sustentabilidade no território

Eva Pires | Especial para O Liberal

A discussão sobre como a tecnologia pode ajudar a enfrentar desafios ambientais e econômicos ganhou espaço na TechZone, área dedicada à inovação no Parque de Ciência e Tecnologia (PCT) Guamá, durante a COP 30, em Belém. No dia 13 de novembro, o geógrafo e especialista em sensoriamento remoto Arlesson Souza apresentou a plataforma MinerIA, uma solução que combina inteligência artificial e imagens de satélite para monitorar atividades de mineração no Brasil, com foco especial na Amazônia.

A palestra, acompanhada por estudantes, pesquisadores e representantes do setor de tecnologia, explicou de forma didática como sistemas avançados de dados conseguem apoiar políticas de controle, fiscalização e análise de impactos. O trabalho é desenvolvido pela Solved, em parceria com MapBiomas e a World Wildlife Fund (WWF), integrando equipes multidisciplinares formadas por geógrafos, geólogos, oceanógrafos, especialistas em TI e analistas de sensoriamento remoto.

Segundo Arlesson, a proposta central da plataforma é ampliar a capacidade de vigilância e interpretação de atividades minerárias. Ele explicou que a tecnologia atua tanto no monitoramento de processos legais quanto na detecção de operações irregulares. “Nossa plataforma envolve o uso de inteligência artificial, especificamente redes neuronais computacionais, para identificar áreas de mineração”, afirmou.

A ferramenta se estrutura em dois grandes módulos. O primeiro é o Monitor da Mineração, que reúne informações sobre processos minerários oficiais, incluindo dados de licenciamento ambiental, fases de operação, delimitação espacial das áreas e recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM). Essas áreas são chamadas de poligonais e representam, no mapa, os limites autorizados para exploração.

O segundo núcleo é o SAG, o Sistema de Alerta Garimpeiro, que monitora garimpos de superfície, balsas garimpeiras e até pistas de pouso criadas de forma improvisada — estruturas frequentemente ligadas a atividades ilegais. Esses elementos são identificados com apoio de redes neurais convolucionais, como a arquitetura U-Net, capaz de comparar padrões em imagens de satélite e detectar alterações de forma rápida e automática.

Na explicação de Arlesson, essa automação representa um salto tecnológico importante, já que antes o trabalho dependia de especialistas marcando manualmente áreas suspeitas. “Eu ia lá na imagem de satélite, baixava e desenhava o polígono manualmente. Isso é muito legal, mas é muito lento. Então, qual é o ganho? A gente usa inteligência artificial, consegue escalar e fazer detecções automáticas”, disse.

O MinerIA também tem como foco integrar análise técnica e critérios legais. A plataforma cruza informações sobre cada poligonal minerária com o status de licenciamento, situação jurídica, recolhimento de tributos e eventuais conflitos com áreas de conservação. O objetivo é fornecer um panorama confiável para órgãos de controle, pesquisadores e até investidores que buscam indicadores de regularidade.

Arlesson explicou que a equipe monitora imagens históricas desde 1985, por meio do acervo Landsat (programa de satélites de observação da Terra de origem Norte americana), e atualiza anualmente os dados de mineração para todo o Brasil. Entretanto, o SAG exige acompanhamento quase diário, algo que ainda depende de ampliação de recursos financeiros e computacionais para cobertura integral da Amazônia e, futuramente, do país. A plataforma completa será lançada no dia 2 de dezembro, em evento com participação da Polícia Federal.

Mais aplicações da I.A. na sustentabilidade 

Além da mineração, o tema da palestra se conectou a discussões mais amplas sobre monitoramento ambiental e sustentabilidade. A professora e desenvolvedora de software e hardware Luciana Vieira, que acompanhou as apresentações na TechZone, destacou que o uso combinado de satélites, inteligência artificial e Internet das Coisas pode fortalecer diversas agendas ambientais. Para ela, a automação é essencial para detectar mudanças rápidas no território.

Luciana explicou que o uso de redes neurais permite comparar imagens captadas em dias consecutivos e identificar padrões de alteração que indiquem riscos. Ela exemplificou com o desmatamento, que pode ser percebido mesmo em pequenas aberturas na vegetação quando o sistema está bem treinado. “Se ele puder, com a inteligência artificial, comparar, ele vê que está aparecendo o desmatamento e tem que disparar um alerta. Seria fundamental e a IA é a ferramenta própria para isso”, afirmou.

A pesquisadora também comentou sobre os desafios para implementar essas tecnologias em larga escala na Amazônia, especialmente no Pará. Para ela, além de investimentos em pesquisa e equipamentos, é preciso que as instituições responsáveis pela fiscalização tenham condições práticas de agir. A ferramenta pode indicar onde está o problema, mas a execução depende de articulação com forças policiais e órgãos federais e estaduais.

Luciana também destacou que há boa perspectiva de avanço quando governo e academia atuam de forma integrada. Em sua fala, lembrou que a inteligência artificial não substitui especialistas, mas potencializa o trabalho humano. A educação e o treinamento adequado, segundo ela, definem a qualidade do uso dessas tecnologias. A combinação entre conhecimento técnico, ação estatal e soluções inovadoras pode contribuir para metas como a redução do desmatamento e a construção de modelos mais responsáveis de ocupação do território.