COP 30 termina com tensão, protestos e sensação de “montanha-russa” nas negociações
A avaliação de que a conferência foi “uma montanha-russa”, como definiu Liuca Yonaha, vice-presidente do Instituto Talanoa, resume o clima predominante: momentos de otimismo, bloqueios inesperados e negociações intensas até o último minuto
A programação oficial da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) chegou ao fim em Belém, após uma semana marcada por tensões diplomáticas, expectativas frustradas e pressão crescente por resultados concretos. A avaliação de que a conferência foi “uma montanha-russa”, como definiu Liuca Yonaha, vice-presidente do Instituto Talanoa, resume o clima predominante: momentos de otimismo, bloqueios inesperados e negociações intensas até o último minuto.
Negociações lentas e clima de incerteza
Para Liuca, esta COP foi diferente das anteriores.
“Em termos de negociação, ela teve essa cara de montanha-russa. Parece que vai, mas não vai; sobe, para, não desenrola. Isso sempre acontece, mas desta vez foi mais intenso”, afirmou.
Ela explica que o Brasil, ao assumir a presidência da conferência, não pode atuar como parte interessada. Age como mediador — o “juiz” do processo. Por isso, tentava acelerar o ritmo das negociações. Desde o início, a meta era apresentar textos-base já na quarta-feira, 13.
A aprovação da agenda logo na segunda-feira (10) indicou um começo rápido. Ainda havia dúvida se seria uma “agenda de paz” ou “de guerra”. Mas o martelo foi batido rapidamente — apesar de quatro dos oito itens terem permanecido em aberto. A partir daí, instalou-se o ciclo de consultas, balanços, avanços e recuos que marcou a semana.
Transição energética e adaptação ganham força
Apesar dos entraves, Liuca avalia que a COP30 consolidou debates importantes — especialmente o da transição energética.
“Mesmo sem saber se haverá texto final, só o fato de termos conversas tão abertas pode ser o início de um mapa político mais consistente”, disse.
Outro tema fortalecido foi a adaptação climática. Desde o primeiro dia, anúncios de políticas brasileiras, iniciativas privadas e compromissos internacionais colocaram o tema no centro da conferência.
“Isso é positivo, porque estamos sentindo o planeta mais quente agora”, afirmou.
Protestos e presença indígena marcam a COP 30
A participação dos povos indígenas e organizações da sociedade civil foi mais intensa nesta edição. No dia 11, manifestantes tentaram entrar na área restrita da Blue Zone. Na sexta-feira (14), o grupo fechou a Avenida Brigadeiro Protásio, principal acesso ao pavilhão.
Para Liuca, a mobilização foi maior e mais visível — algo positivo para o processo.
“Dentro das negociações, ainda não é suficiente. Mas foi uma COP mais democrática, mais plural, até pelos chamados do público”, avaliou.
Impasses e frustração na reta final
Na sexta-feira (21), os impasses continuavam. A ministra da Colômbia, Irene Vélez-Torres, afirmou que o texto em negociação era “frustrante” por não reconhecer a urgência de um caminho claro para eliminar os combustíveis fósseis.
Ela criticou ainda a ausência de diretrizes para conservação da natureza, falta de transparência no financiamento climático e a possibilidade de que os recursos ao Sul Global ampliem a dívida externa.
“Sem esses elementos, essa crise climática se torna um colapso. Estamos condenando a humanidade e a vida no planeta”, afirmou.
Do lado brasileiro, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, avaliou que a fase final é marcada por um esforço concentrado para alcançar um resultado “forte e profundamente desejado”. Segundo ela, a COP30 elevou o nível das conversas multilaterais e mostrou a urgência de decisões estruturantes — embora essas decisões continuem difíceis diante das divergências técnicas e políticas.
Amazônia no centro: avanços e desafios
Para Paulo Moutinho, cofundador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), a COP reforçou a importância da Amazônia para o clima global, mas ainda está longe de metas alinhadas à ciência.
“O mundo clama por maior ambição. Isso passa pela erradicação do uso de combustíveis fósseis por meio de uma transição planejada e gradual”, afirma.
Ele destaca que temas como desmatamento zero, transição econômica sustentável e proteção de populações tradicionais avançaram na retórica, mas seguem sem compromissos suficientes.
“É crucial intensificar a proteção e a recuperação das florestas, especialmente as tropicais, e promover adaptação a um cenário climático que continuará a mudar por muitos anos”, disse.
Recursos financeiros, segundo Moutinho, seguem no centro da discussão — e precisam ser compartilhados de forma justa.
“É um desafio global que exige articulação, responsabilidade e alocação adequada de recursos”, concluiu.
Incêndio interrompe negociações e aumenta tensão
Na quinta-feira (20), penúltimo dia da COP30, a expectativa era alta para a divulgação do texto prometido pelo presidente Lula para o dia anterior. Mas por volta das 14h, um incêndio no pavilhão dos países africanos mudou o rumo das discussões.
Para Liuca, o episódio agravou o clima de incerteza.
“Todo mundo esperando o texto e, de repente, tudo para por um fator externo. Isso quebrou o ritmo”, disse.
Com a interrupção inesperada, as negociações devem seguir nos próximos dias — mesmo após o encerramento oficial.
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