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Zeno Veloso

Zeno Veloso é jurista, especializado em Direito de Famíliia. Escreve toda semana sobre os temas jurídicos que impactam no nosso cotidiano. | zenoveloso@hotmail.com

Mãe pode determinar como será a divisão de sua herança?

Zeno Veloso

No Capítulo “Da Partilha", o Código Civil prevê no art. 2.014: “Pode o testador indicar os bens e valores que devem compor os quinhões hereditários, deliberando ele próprio a partilha, que prevalecerá, salvo se o valor dos bens não corresponder às quotas estabelecidas".

Izaura de Oliveira, do alto de seus 77 anos de idade, quer se utilizar deste dispositivo legal para a sua sucessão. Tem três filhos que, apesar de todos os seus esforços, não se dão bem, vivem numa eterna disputa afetiva e material, e a pior situação possível seria a de eles ficarem condôminos dos bens que a mãe vai deixar. Então, o objetivo de Izaura é outorgar um testamento, deixando seus bens já divididos, destinados a cada um de seus filhos. Assim, quer que dois apartamentos fiquem para Flaviana, que sua loja de confecções, com imóvel próprio e boa clientela, caiba a João Alfredo, que já atua com a mãe na empresa, e, finalmente, que seu terreno de porte médio, aplicado à agricultura e à pecuária, situado em Nova Timboteua seja destinado a seu filho mais novo, Eduardo, que adora a vida no interior e a atividade rural. Izaura mandou avaliar os bens e verificou que cada um deles vale o valor do outro, de maneira que esta divisão atende ao princípio da igualdade das quotas dos herdeiros necessários, além de considerar as aptidões, o gosto de cada filho.

No Código Civil Comentado (Rio de Janeiro: Forense, 2019, pág. 1550), José Fernando Simão diz que este art. 2.014 de nosso Código é um dispositivo de grande importância para fins de planejamento sucessório e desfaz alguns equívocos comuns na concepção da legítima, isso porque pode o testador estabelecer, por meio de um ato unilateral, quais bens comporão o quinhão hereditário de cada herdeiro necessário, evitando-se assim um condomínio muitas vezes indesejado entre todos os herdeiros.

Obviamente, a repartição feita pelo testador no ato de última vontade é obrigatória, não sendo um mero conselho, e tem de ser seguida e obedecida pelos herdeiros. Algum dos filhos, como no exemplo acima dado, só pode se insurgir contra a deliberação da mãe se provar que a divisão foi injusta, privilegiou um dos filhos em detrimento de outros, deixou de atender o princípio da igualdade das legítimas.

Porém, se o valor dos bens atribuídos corresponder às quotas estabelecidas, a vontade do autor da sucessão tem força de lei (como diria o notável Teixeira de Freitas), e a herança será partilhada entre os filhos obedecendo à composição feita pelo falecido.

No Código Civil português, art. 2.163, está estabelecido que o testador não pode designar os bens que devem preencher as legítimas contra a vontade do herdeiro.

Na opinião do grande civilista José de Oliveira Ascensão (Direito Civil - Sucessões, 5ª ed., 2000, Coimbra, pág. 369), o legislador português foi longe demais, exigindo o consentimento do herdeiro, dominando-o a concepção de uma intangibilidade abstrata da legítima que não se alicerça em interesses reais: "Que vantagem há em a quota ficar vazia, em impedir o “de cujus" de a preencher, mesmo contra a vontade do herdeiro, desde que o valor ficasse assegurado? Que maior significado tem uma partilha posterior que a partilha determinada pelo autor da sucessão?"

Devemos tornar mais conhecido o art. 2.014 do Código Civil brasileiro, pois a previsão do mesmo é boa, oportuna, e a faculdade nele conferida pode render bons frutos.

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