Os dias 31 de março de 01 de abril de 1964 são marcos históricos do golpe de Estado, liderado por forças militares, que depuseram o presidente constitucional João Goulart, que havia assumido o cargo após à renúncia de Jânio Quadros, ocorrida em agosto de 1961. Durante 21 anos, o Brasil viveu um período autoritário sob a égide dos militares, com generais-presidentes não eleitos pela população, supressão de alguns direitos civis individuais e repressão a várias manifestações populares.
Dois dos fatores motivadores do golpe de Estado, com a retirada de João Goulart do poder, foram as Reformas de Base, propostas por ele, e o discurso de enfrentamento ao “perigo comunista”. O mundo vivia o período da Guerra Fria, conflito político-ideológico envolvendo as duas superpotências de então – os Estados Unidos, que lideravam o bloco dos países alinhados ao capitalismo, com destaque para os países da Europa Ocidental e boa parte da América Latina; e a União Soviética, que influenciavam várias nações
alinhadas à ideologia socialista e ao modo de produção comunista, como países do Leste Europeu – e Cuba, na América Latina, por exemplo.
Todas as vezes em que se discute o período autoritário militar no Brasil – entre 1964 e 1985 –, em especial no ambiente acadêmico, sempre emerge a necessidade de se olhar para o passado e resgatar a memória dessas pouco mais de duas décadas, exatamente para que nunca mais haja no Brasil o rompimento das instituições democráticas e todas as consequências derivadas dele.
O Ato Institucional número 5 (AI-5), emitido em 13 de dezembro, pelo então general-presidente Artur da Costa e Silva, foi um símbolo principal do autoritarismo, com a autonomia para o governo fechar o Congresso Nacional e as Assembleias Legislativas estaduais, a intervenção em estados e municípios e a possibilidade de impor a censura prévia, entre outras questões.
Também muito se questiona, no contexto da transição para a volta da democracia, no início dos anos 1980, a respeito das punições para os que praticaram tortura e outros tipos de delitos durante o período ditatorial. Houve uma opção por uma “anistia ampla, geral e irrestrita” – até como um lema presente nos dois últimos governos militares (Ernesto Geisel, entre 1974 e 1979 e João Figueiredo, entre 1979 e 1985).
No Brasil, um movimento importante foi a criação da Comissão Nacional da Verdade, que foi um grupo instituído pelo governo brasileiro (Dilma Rousseff) para a investigação das graves violações de direitos humanos não somente durante os 21 anos sob os governos autoritários militares, mas em um espaço compreendido entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988. A Comissão Nacional da Verdade foi criada pela Lei 12528/2011 e colocada em vigor em 16 de maio de 2012.
No marco cronológico dos 60 anos dessa triste página da história brasileira, o presidente Lula optou em não entrar em conflito com as lideranças militares, ainda tensionadas em virtude das questões que emergiram durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), entre 2019 e 2022, dos acampamentos golpistas instalados em frente a quartéis do país após o pleito presidencial de 2022 e dos atos de vandalização à Praça dos Três Poderes ocorrida em 08 de janeiro de 2023. Assim, o governo decidiu não realizar eventos oficiais em memória aos 60 anos do golpe – e sofreu crítica de vários setores, principalmente da militância à esquerda.
Embora tenham passado por processos bem distintos sob governos autoritários militares, em vários níveis, Argentina (1976-1983) e Chile (1973-1990), após retornarem à democracia, conseguiram conduzir de maneira mais assertiva a sua reconciliação com o passado, com punição de torturadores, prisões, fortalecimento de movimentos sociais e construção de memoriais – como o existente em Santiago, capital chileno.
Olhar para o passado e buscar que não mais se repitam períodos de suspensão de direitos civis e de repressão a quem pensa diferente, é sempre um exercício importante para a consolidação de um modelo democrática. Espera-se que o Brasil consiga avançar nessa pauta constante, tão necessária quanto desafiadora.