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O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

O jornalismo e a magistratura

(Crônicas judiciárias de quase um quarto de século na magistratura)

Océlio de Morais
Ingressei na magistratura trabalhista em 13 de dezembro de 1996, dia da posse e investidura oficial, depois de ser aprovado em 1º lugar no concurso público de provas e títulos. 
 
A investidura significa, por outras palavras,  que o magistrado recebe poderes constitucionais  e legais para o legítimo exercício da jurisdição para, em nome do Estado, resolver conflitos juslaborais.  A balança, é a sua medida de equilíbrio e a venda nos olhos o  adverte que o direito (a quem o pertença) é a sua métrica de justiça.
 
O presidente do Tribunal invoca os poderes constitucionais para a outorga da jurisdição: é  a consagração (ou investidura) para o exercício da magistratura. 
 
O empossado deixa de ser um cidadão comum e passa a incorporar as funções do Estado-Juiz, com poderes de polícia para fazer valer suas decisões condenatórias ou não, de procedência ou de improcedência, 
 
É mais ou menos como ocorre com a ordenação sacerdotal, quando o concluinte dos cursos de teologia e filosofia é ordenado em solenidade com rito especial  e necessário para receber o sacramento da ordenação  presbiteral.
 
O bispo ordenante faz  a imposição das mãos  e a prece de ordenação, conforme o Pontifical Romano, que é composto dos seguintes ritos: a eleição do candidato, a homilia, o propósito do eleito, a ladainha, a imposição das mãos e prece de ordenação, a unção das mãos e a entrega da patena e do cálice.
 
O juiz é o Estado. O sacerdote é a Igreja, como apóstolo de Jesus Cristo. 
 
A Constituição e as leis do país são a garantia de que o magistrado, que faz o juramento público de defendê-las, não vai  cometer ilegalidades e nem vai  abusar do poder.  
 
 A patena e o cálice são instrumentos essenciais à consagração do pão e do vinho na Santa Missa, momento soleníssimo do mistério da transubstanciação.
 
Na perspectiva teleológica, a magistratura e o sacerdócio têm um ponto em comum: a ética. A decisão judicial sempre deve ser ética. O pastoril, pela essência religiosa, também é ético-moral.
 
Adotei esses dois parâmetros para essa crônica  dos meus quase um quarto de século na magistratura  trabalhista brasileira para mostrar algumas identidades entre a arte de investigar um fato jornalístico  e a arte de investigar fatos no processo judicial..
 
Eu vinha do jornalismo, onde o feeling quanto ao fato que poderia render boa notícia era fundamental. 
 
No jornalismo,  a arte de bem investigar (além das fontes confiáveis) fazia parte da arte do bem perguntar.  E a boa notícia, aquela que não era “barriga” - na  minha época assim era  qualificada notícia falsa e sem fundamento -  deveria ser bem redigida. 
 
A notícia bem redigida não guardava espaço ao sensacionalismo e nem ao tendenciosismo, mas aquela que, além do estilo, tinha precisão cirúrgica, era  objetiva na narrativa. 
 
Acho que desempenhei um bom jornalismo, à medida que conquistei o prêmio nacional de jornalismo impresso, no ano de 1993, promovido pela Federação Nacional de Jornalismo, além de ter exercido  chefia de reportagem de jornal e televisão.
 
Então ingressei na magistratura com aquele espírito investigativo veia jornalística e com a correspondente técnica redacional. Do jornalismo, trouxe à magistratura o princípio de que, sobre um fato, todas partes envolvidas devem ser ouvidas.   
 
É a espécie do contraditório como se diz na linguagem jurídica na magistratura. Então não tive dificuldades quanto a isso, porque o devido processo legal  exige sempre o respeito à ampla defesa e ao contraditório, quanto o fato está sendo investigado judicialmente , objetivando-se o julgamento.
 
No jornalismo aprendi que o fato, em si,  pode ser apenas um, mas as versões sobre o fato investigado são múltiplas, conforme a conveniência do entrevistado.  
 
Independentemente das versões, o fato sempre deve ser submetido ao crivo da investigação para se evitar as deturpações  - princípio do jornalismo que também incorporei no meu modo de ser magistrado. 
 
Mas encontrei resistência de um  e outro advogado que, por o império das suas razões subjetivas, considerava que apenas a sua versão dos fatos era a verdadeira, ignorando por completo o outro lado da história.  
 
Um deles  protocolou uma reclamação correicional parcial contra mim. Foi a primeira  na minha vida de magistrado. Estava há mais ou menos uns três anos na magistratura. 
 
Confesso que fiquei assustado porque, técnica e legalmente, eu sabia a correicional “é cabível para corrigir erros, abusos e atos contrários à boa ordem processual e que importem em atentado a fórmulas legais de processo, quando para o caso não haja recurso ou outro meio processual específico.”
 
Meu espanto adveio do objeto da correcional: o advogado reclamava que o reclamante foi submetido a cerca de 60 perguntas pelo juiz que presidiu a audiência.  E considerava aquilo um  absurdo e um massacre.
 
 Por óbvio, sem pé e nem cabeça, a correicional não foi provida. Depois, por curiosidade, fui conferir quantas perguntas haviam feito naquela instrução processual. Não foram 60. Foram mais ou menos 40 perguntas.  
 
Curiosamente, noutro processo, o mesmo advogado fez mais de 100 perguntas a um preposto, demorando mais de duas horas inquirindo e inquirindo. Recordo-me que aquela audiência começou às  14:00 horas e terminou entre 19:00 e 20:00 horas. 
 
Naquele episódio  da correicional, percebi que  mexer em casa de marimbondos, ainda que a reação não venha de imediato, raramente se perde a oportunidade de um ataque. 
 
No episódio do processo subsequente, percebi que era preciso observar e  entender os interesses [às vezes nem sempre expostos às claras] que cada processo significa às partes e aos seus respectivos patronos: muitos interesses estão em jogo. E  o tempo vai  ensinando que o magistrado, como um imã, a cada decisão vai sendo diagnosticado por partes e advogados, que passam a admirá-lo ou não.
 
Mas nada disso deve impedir a busca da verdade real nas causas judiciais, através da boa arte de investigar. 
 
A arte de investigar o fato jornalístico adota, nos termos do código de ética dos jornalistas, os princípios da isenção e da ética, para noticiar o fato conforme a verdade. 
 
Isso significa que sempre as partes envolvidas no fato devem ser ouvidas, como igual oportunidade e idêntica isenção. 
 
Com isso, evita-se a manipulação do fato e a execração pública de quem estiver envolvido no fato. 
 
A arte de investigar o fato ou fatos no âmbito do processo judicial é dirigida pelo contraditório e ampla defesa, com os parâmetros da boa-fé e da lealdade processuais, como deveres-princípios das partes.
 
Com isso, procura-se prevenir decisões  judiciais superficiais, tendenciosas, injustas e desconectadas das provas reais relativas à realidade fática.
 
Confesso que minha alma de magistrado também é alimentada pelo feeling jornalístico que é parte de minha história. 
 
 
ATENÇÃO: Em  observância à Lei  9.610/98, todas as crônicas, artigos e ensaios desta coluna podem ser utilizados para fins estritamente acadêmicos, desde que citado o autor, na seguinte forma (Océlio de Jesus Carneiro Morais (CARNEIRO M, Océlio de Jesus) e respectiva fonte de publicação.=
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