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O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

Coronavírus e politização; parábola e fábula

Da negação e da afirmação da liberdade

Océlio de Morais

Autor dos livros “Do Ódio” e “DA sedução”, Gabriel Liicenau, filósofo e ensaísta romano,  também escreveu a obra intitulada “Da Mentira”, uma perspectiva histórico-filosófica desde a Grécia antiga até a década de 1990 sobre  a manipulação dos fatos para interesses políticos de grupos de poder, qualificando-a como “mentira pública” ou “mentira coletiva”, sempre relacionando-as com os valores da  virtude e com os desvalores da corrupção.

 Ele destaca que a “verdade” e a  “mentira”, apesar de totalmente opostas, ambas são ligadas por um elemento cognitivo inter-relacional: “a língua”.   Por isso, ele conclui que “somente o homem pode mentir porque tem parte num algo que pode exprimir e, que, exprimindo-se, pode mover-se em duas direções totalmente opostas: a verdade e o falso” (2006. p. 9-10).

A comunicação verdadeira ou a manipulação dos fatos é, desse modo, inerente à liberdade das pessoas, como seres ontologicamente providos da racionalidade. A liberdade humana fica dividida entre  essa qualidade racional (que domina as emoções) e a paixão (aquele sentimento capaz de alterar a razão). 

Liicenau deixa bem claro que “A mentira não pode ser enunciada senão como momento negativo da liberdade”  (2006, p. 10). 

A assertiva de que somente o ser humano pode mentir é lógica, considerando que é dotado da razão, portanto, tem a liberdade natural para fazer escolhas.

 E quanto à manipulação (deturpação ou ideologização) dos fatos para exclusivos interesses de poder político desvirtuados dos interesses coletivos do país, atesta a conduta consciente (portanto, racional) e  tipifica a politização negativa da liberdade. 

Por isso, a mentira (política) é qualificada como o momento negativo da liberdade e  a verdade (política) é qualificada como momento positivo da liberdade. 

Então,  as narrativas históricas comprovam que a verdade e a mentira sempre estiveram presentes em muitos momentos políticos da história da humanidade.

Como isso pode ser aplicado aos tempos atuais nestes tempos da pandemia do coronavírus? O ambiente politizado que se criou e se alimenta no Brasil  em torno desse grave problema da saúde, pode ser melhor compreendido nessa dicotomia entre “a verdade e o falso”, de que trata Gabriel Liicenau. 

Essa politização nociva (que está no perigoso estágio “A” da massificação ideológica das informações), também me reporta à fábula sobre a “Mentira e a Verdade”.

De autor  desconhecido, mas atribuída à tradição judaica, não se sabe ao certo se a célebre fábula precede ou não à pintura “La Vérité sortant du puits” (A Verdade saindo do poço), pintada em  1896 pelo francês Jean-Léon Gérôme, que, no dia 10 de janeiro de 1904,  foi encontrado morto em frente a um retrato de Rembrandt e perto de sua própria obra,  “A verdade saindo do povo”.. 

  Pode ser que a fábula  tenha inspirado Gérôme, como também é possível que tenha nascido a partir do retrato à óleo “La Vérité sortant du puits”.

  A verdade é que essa fábula sempre será útil, assim como a belo quadro de Gérôme encanta pela  simbologia, para pensarmos um pouco sobre verdades (fatos) e mentiras (fakes) nesses tempos pandêmicos de coronavírus.

Na fábula, a Mentira (sempre dissimulada e com má-fé) ludibria a Verdade (sempre  transparente e de boa-fé), usando os estratagemas tipo “o dia que estava lindo” (lábia para adquirir a confiança) e do convite para beber se banhar na água fresca do poço  (convite para se mostrar afável e confiável).

"Venha, senhora Verdade, a água do poço está fresca, límpida, saudável. Beba um pouco e aproveite para banhar-se, pois o dia está fazendo muito calor", disse a Mentira, dando sequência ao seu plano final que era apropriar-se das vestes (roupas) da Verdade,.  Enquanto ela, despida, se banhava no poço refrescante, aproveitando-se da boa-fé da Verdade, a Mentira pega as roupas, veste-as e saí a caminhar livremente pelas ruas do vilarejo como se a própria Verdade fosse. 

E todos  as pessoas a admiravam e a aplaudiam pela aparência das vestes alvas e reluzentes da Verdade.

Percebendo o golpe da Mentira, a Verdade (com  toda a pureza e inocência) sai inteiramente nua à procura da Mentira para recuperar suas vestes. Mas é escorraçada pelas pessoas, que a acusam de impura, profana, imoral e desavergonhada. 

A lição da desta fábula é que, como regra geral, é mais fácil e comum aceitar a Mentira vestida com as roupas da verdade, do que aceitar a verdade nua e crua.  

Fábula é uma estória com a intenção de passar uma mensagem ou lição moral. A  mentira é uma ilusão, é uma invencionice, é algo ludibriado, uma falsidade. A verdade é relativa a fato real, é sincera ,  revela pureza e de sentimento.

O que pode ser fato (verdade) ou mentira (fake) nesse ambiente toxicamente politizado do problema do coronavírus no Brasil?

Fakes (com manipulação de informações) e tramas políticas nocivas aos reais interesses da coletividade podem ser comparados à Mentira vestida com as roupas da Verdade.

Nesse ambiente, com confinamentos residenciais - o que significa, em sentido prático, a restrição do direito à liberdade de ir e vir, além da restrição a direitos fundamentais - diariamente estamos sendo “sufocados” por intensa, incisiva e massiva veiculação de fatos e fakes, criando-se um  estado de exceção quanto ao exercício de legítimos direitos sociais fundamentais.

Redes sociais e  meios de comunicações sociais (ressalto que temos boas e saudáveis exceções) têm produzido, veiculado e disseminado um turbilhão de dados (às vezes reais; às vezes falsos) sobre o coronavírus. 

Cada um procura passar a sua “verdade” (a pretexto de manter a sociedade bem informada), sem se importar com o que realmente as pessoas estão sentindo com esse volume incontrolável (e muitos sem crivo ético ou piedade  social) das ditas informações.

A politização desnecessária do problema  do coronavírus procura “criar” suas “verdades” e ignora que o problema que estamos sofrendo deveria servir para unir lideranças (públicas e privadas) em nosso país em benefício do trabalho e da  saúde do povo. Deveria servir para unir o povo em defesa dos direitos ao trabalho e da seguridade social, sem ideologização partidária. 

A politização do problema do coronavírus  passa a péssima ideia de que o país não é civicamente amado e tampouco respeitado.

Entre uma notícia e outra; entre uma mensagem e outra; entre um vídeo e outro e entre uma live e outra tem havido nítidos interesses políticos eleitoreiros ou vinculados a interesses meramente econômicos.  

Um e outro não são nada republicanos; portanto, são  interesses que manipulam e massificam informações, vestindo-as com  uma “capa” ou “roupa” da verdade. 

Quando o problema do coronavírus no Brasil é explorado politicamente para fins distintos das reais necessidades da coletividade, estaria a sociedade preferindo ver a “Mentira vestida com as roupas da verdade” do que aceitar “a verdade nua e crua?”, como dito na fábula.

São interesses que fazem parte de um projeto de poder político-econômico - poder que na história sempre dividiu os homens muitas das vezes ignorando as liberdades e massacrando povos.  Os exemplos históricos mostram que a luta cega pelo poder nunca acaba bem. Depois, entre si, quando vão “fatiar o bolo”, aqueles que se reuniram por uma conveniência política, vão novamente se  digladiar entre si. E começa tudo de novo...

Sêneca (o Moço),  nascido em Córdoba (Espanha), tornou-se senador romano, nos deixou este testemunho no livro “Aprendendo a viver” :  “a vaidade da fortuna e do poder obscurecem a liberdade”. (Pocket, 2019, p. 11).

Somente consegue identificar essa realidade politizada do problema do coronavírus no Brasil  aquele que, com isenção de espírito e senso crítico, sabe separar o “joio do trigo”.

A parábola do “joio e o trigo”  trata da existência do mal no meio do bem e da  definitiva separação entre eles. 

Está descrita no Evangelho segundo São Mateus (13:24-30; 36-43) -  temas que, mais tarde, Santo Tomás de Aquino aborda na questão 20 (”Da bondade e da malícia dos atos humanos exteriores”) na Suma Teológica, explicando-os como decorrentes da razão e da vontade humana: “O livre arbítrio é a faculdade da razão e da vontade, que elege o bem e o mal”, sendo que, nessa perspectiva, “o mal corrompe totalmente o bem”.

A boa política, aquela voltada aos reais interesses republicanos e reais necessidades do povo, é indispensável à democracia, especialmente para o exercício da tolerância.  Por isso, a política cidadã (como afirmação da liberdade) pode ser comparada ao bom trigo (é coisa boa e útil a todos); de outro lado, a politização eleitoreira do coronavírus (negação da liberdade) pode ser tida como o joio (que não é coisa boa para a sociedade).

Para encerrar essas reflexões, recorde-se o Evangelho  São Mateus: “preciso separar o joio do trigo”. Então, deixo uma pergunta à reflexão.. O que deve prevalecer:  a Mentira vestida com as roupas da verdade ou que aceitar a verdade nua e crua?

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Psot Scriptum: Nos termos da Lei 9.610, de 1998, permito a utilização do artigo para fins exclusivamente acadêmicos, desde que sejam citados corretamente o autor e a fonte originária de publicação, sob pena de responsabilização legal.

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