O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

Amendoim e espinafre contra ervas daninhas da corrupção

Océlio de Morais

As revistas das historinhas de quadrinhos, a rigor, eram as que chegavam por lá, embora o Cine São Luiz, na Cidade Baixa, e o Salão Paroquial, na Cidade Alta, exibissem sempre aos domingos (depois da missa das 20:00 horas)  aqueles velhos filmes de faroeste com John Wayne ou Giuliano Gemma, cujas fitas QUASE sempre quebravam na hora da cena mais emocionante entre o “mocinho” e o “bandido”.

Como apenas em 1975 a televisão (e ainda como repetidora) chegou na minha cidade natal, Monte Alegre - ali no baixo-amazonas da Amazônia Oriental brasileira - a cidade mais parecia uma ilha em si mesma, salvo quando a monotonia das coisas corriqueiras eram quebradas pelas notícias que chegavam da capital (com muito chiado e oscilações) levadas pelas Ondas Tropicais da Rádio Clube do Pará, a PRc-5.

Na infância, como não sabia ler e escrever, sentia a sensação de estar aprisionado dentro de um eterno eclipse solar, aquele fenômeno astronômico que ocorre quando a Lua se posiciona entre a Terra e o Sol. 

Aos meus olhos (como portal da minha alma), os primeiros raios de luz vieram com a alfabetização entre os 10 e 11 anos de idade. Foi como se novos olhos abrissem janelas no horizonte, semeando um sonho de liberdade.  

Ah, isso pode ser mera coincidência com a possível sensação de Edgar Allan Poe, o escritor e poeta norte-americano, ao comparar  “janelas  aos olhos” e  “casa a alma comum”, no conto “A queda da Casa de Usher”.

As crianças de minha geração, e que lá viveram, não tínhamos ideia das coisas que a indústria cultural já oferecia ao mundo desenvolvido, tampouco sentiam-se os efeitos de Woodstock Music & Art Fair, daquele agosto de 1969 - o festival que marcou a denominada contracultura dos anos 60 - e talvez nem souberam imediatamente da chegada à da Eagle em 20 de julho de 1969 à Lua.

De barco, as revistas chegavam à cidade, enviadas de Santarém, que as recebia de Belém,  vindas de São Paulo ou Rio de Janeiro. Chegavam sempre com três a cinco meses depois do lançamento.  

Sem dinheiro, eu não as comprava. Entrava na fila daqueles que as pediam emprestadas dos bons amigos de infância,  cujos pais trabalhavam no único banco da cidade na época ou eram comerciantes. 

Aquelas historinhas das revistas de quadrinhos povoaram minha adolescência, tal como provavelmente ocorria com  aqueles que gostavam do gênero: os heróis com seus incríveis superpoderes.

“O Fantasma”, dentre os imbatíveis, era o meu preferido, porque era o homem  que não podia morrer, assim, tornando-se no mito “o espírito que anda", especialmente quando tomava aquele copo de leite, que parecia ser mágico. E para  falar dos magos, o “Mandrake” - com aquela “varinha mágica” e com repetidos gestos de mãos que  resolviam os problemas através da hipnose - era o que mais me fascinava.

As histórias passavam a sensação de que o simples mortal - ainda que fosse um tonto como o Peninha, um atabalhoado como o Pateta ou um atrapalhado  Popeye - poderia ter lá seus superpoderes. 

O pessoal da geração 70 lembra disso: o Peninha, o pato jornalista, se transformava no Morcego Vermelho  para desvendar crimes insolúveis; o  todo atrapalhado Pateta virava o Super-Pateta quando engolia um amendoim e o marinheiro  Popeye ganha força imbatível quando come espinafre para defender a amada Olívia  dos olhos gordos do Brutus ou para se livrar da bruxa do mar e do abutre.

Na atualidade, fenômeno que inicia a partir da segunda metade da década de 1990, a indústria cultural está globalizada. A internet deu voz a quem não tinha voz, proporciona acesso instantâneo ao bom e ao ruim, e passa a sensação de que todos têm superpoderes nas redes sociais, à medida que se acham “super-heróis” apresentam soluções mágicas aos mais complexos problemas da sociedade. Mas esquecem ou ignoram uma coisa: são mortais e falíveis tanto quanto aqueles que falhamos e precisamos de verdadeiros homens probos para vencer a luta do bem contra o mal.

Isso me faz refletir que, como nas historinhas de quadrinhos, todos super-heróis são criados para dizer ao distinto público que os simples mortais não conseguem resolver os complexos  e concretos problemas coletivos: saúde, educação, moradia, trabalho, saneamento etc. E nem têm força para resolver os repugnantes problemas éticos decorrentes dos desvios de conduta, que levam à corrupção do dinheiro público. Problema difícil é coisa mesmo para super-herói.  

Mas os super-heróis têm lá seus “calcanhares de aquiles”. Lembrem-se do Super-Homem,  que do tímido fotógrafo Clark Kent do Planeta Diário, torna-se  o herói de todos os poderes para salvar o mundo de todos os perigos em qualquer lugar e em fração de segundos, desde que não se aproxime da kryptonita. 

Ah, e o Aquiles, aquele herói da mitologia grega, era invulnerável em quase todo o corpo, por vontade dos pais, o  rei Peleu e da deusa Tétis. Mas até na lenda, o mito tem seus pontos vulneráveis e Aquiles morreu exatamente por uma flechada em seu calcanhar, o seu único ponto fraco,  porque Tétis não o  banhou com a água  da imortalidade. 

Mas confesso que, às vezes, eu gostaria de ter uma varinha mágica e virar super-herói para ter superpoderes. Por alguns segundos, queria ser o Mandrake para, com o toque mágico, transplantar mentes cidadãs em substituição às mentes corruptas.  Queria ser Super-Homem para, apenas com um super sopro, mandar para os confins do mundo - sem caminho de volta - os anti-heróis que se passam por super-heróis, enganando a boa fé das pessoas para fins não confessáveis. Queria ter uma plantação de amendoim e uma fazenda de espinafre para dar “superpoderes” ao povo e, assim, coletivamente, erradicar para sempre as ervas daninhas que destroem os direitos da cidadania.  

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ATENÇÃO: Em  observância à Lei  9.610/98, todas as crônicas, artigos e ensaios desta coluna podem ser utilizados para fins estritamente acadêmicos, desde que citado o autor, na seguinte forma (Océlio de Jesus Carneiro Morais (CARNEIRO M, Océlio de Jesus) e respectiva fonte de publicação.

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