Era um almoço comum de sábado na casa do meu melhor amigo, na Lagoa, bairro da zona sul do Rio de Janeiro. Tínhamos dez anos de idade, éramos colegas desde a alfabetização. Não lembro qual era o cardápio, algo trivial, se não fosse aquele pote grande de vidro sobre a mesa... Dona Juju, avó desse meu amigo, girou a tampa vermelha e me ofereceu a iguaria típica do seu estado, o Pará: farinha d’água. Leve, crocante, nunca esqueci a sensação de explosões na boca. Dona Juju, sempre doce e atenciosa, me ofereceu mais. Aceitei, claro!
Passaram-se trinta anos até que alguém despejasse de novo no meu prato aquela farinha mágica paraense... Eu era apresentador do Esporte Espetacular e estava em Belém para cobrir o GP Internacional de Atletismo, no Mangueirão. Era minha primeira vez na região Amazônica. Na chegada, pela janela do avião, num sobrevoo quase infinito, aquela floresta toda já tinha me chacoalhado estranhamente. A descoberta de um mundo gigante, de como somos pequenos...
Também foi impossível não me emocionar no estádio tomado por torcedores. E não era futebol, o clássico entre Remo e Paysandu, era atletismo! Não me lembro de povo mais apaixonado por esporte, mais vibrante do que o paraense. Por sorte, como jornalista esportivo, estive em Belém mais duas vezes. Convidado pelo Grupo Liberal, fui à cidade entregar o Prêmio Rômulo Maiorana aos melhores esportistas do Pará. E voltei para cobrir o jogo da seleção brasileira contra a Argentina, o Superclássico das Américas. De novo, estádio lotado, e hino brasileiro cantado à capela, levando ao choro um jornalista veterano como eu e o jovem craque Neymar.
Na minha última visita a Belém, recebi dois pedidos de amigos do Rio. Um queria bombons de cupuaçu. O outro, o saudoso DJ Simpson, que fazia sucesso em festas cariocas, queria que eu garimpasse CDs de cantores e grupos musicais do Pará. Consegui com produtores locais um pen drive com cerca de 400 músicas: carimbó, tecnobrega, guitarrada, calypso, cúmbia, merengue... Só um pouquinho da força cultural paraense, que é imensa, que é amazônica.
Agora, eu chego ao Pará pelas páginas de um jornal com 75 anos de história: O Liberal. Criado para dar voz a um grupo político e, portanto, disposto ao debate. Ora, se não é disso que surgem as melhores respostas... O embate de ideias, opiniões contrárias, dúvidas, reflexões... Então, não troque nada disso por ódio, agressividade, desonestidade. Vamos conversar.
Apegado aos fatos, ao mundo real, lhes digo: precisamos de liberdade política, econômica, religiosa e de pensamento, de menos Estado na economia e nas nossas vidas... E tudo será sempre mais fácil, com um bocado de Pará. Precisamos muito do entusiasmo, da alegria, da criatividade, da fé e da esperança das pessoas desse Estado gigante. E, Dona Juju, por favor, não esqueça: muita farinha d’água!
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