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Na pandemia, pulmão virou destaque nas promessas de Círio com objetos de cera

Mesmo com as medidas contra a covid-19, fiéis seguem agradecendo graças alcançadas

Dilson Pimentel

Apesar da pandemia, que mudou o formato do Círio deste ano, os fiéis continuam honrando as promessas feitas à Nossa Senhora de Nazaré. É o que diz Pedro Manoel Barbosa, gerente da tradicional Casa Círio, no bairro da Cidade Velha, e que fabrica objetos em cera usados pelos promesseiros. Os trabalhadores produzem 120 mil artigos, em um total de 90 itens, todos relacionados ao Círio de Nazaré, que, este ano, e por causa do novo coronavírus, não contará com as procissões pelas ruas da capital.

Neste mês de setembro, não é grande a procura pelos objetos em cera. A demanda aumenta, mesmo, no início de outubro. Atuando no ramo de confecção de peças de cera e outros artigos religiosos há mais de três décadas, ele disse que a produção dos objetos em cera não parou na Casa Círio. Só “deu um tempo” por causa das medidas sanitárias. Esse tempo ocorreu entre o final de abril e um pouco de maio. “Mas, depois, retornamos com a produção das promessas”, disse.

O fato de não haver procissões este ano não afetará a produção desses artigos. “O compromisso dos romeiros é comprar as promessas e deixá-las no carro dos milagres ou nos postos de coleta”, observou.

Ele garante que, apesar da pandemia, continuou trabalhando com otimismo. E sempre antenado ao que ocorre na sociedade, pois isso poderá repercutir na produção de certos artigos. Pedro observou que o novo coronavírus afeta bastante o pulmão das pessoas que têm a covid-19. Por isso, deu uma “reforçada” na produção de pulmão.

Eles fabricam todos os órgãos e membros do corpo humano, entre os quais cabeça, perna, braço. Há, também, animais de estimação e bens materiais - carro, casa e moto. Muitos promesseiros pedem objetos diferenciados e que estão na linha de produção. Há uma senhora que pede galho de maniva. Já um morador de uma cidade do interior, e cujo filho terminou um complexo e delicado tratamento oncológico, pediu para ser produzido um boneco de mais de um metro de altura. “A gente nunca deixa de materializar esse desejo do romeiro, para que ele possa pagar sua promessa à Nossa Senhora de Nazaré”, contou.

Cabeça e casa são os mais procurados


Os itens de cera mais procurados são cabeça e casa. Em respeito às pessoas, Pedro e seus funcionários preferem não perguntar para os promesseiros as graças alcançadas. “As pessoas nunca entram nessa particularidade e não querem falar sobre o problema que tiveram”, explica.

Mas, com base na experiência diária, um dos problemas pode, por exemplo, estar relacionado à superação de uma depressão ou de algo que afetou psicologicamente muito a pessoa. “Mas é o que a gente imagina”, disse.

Já houve ano, por exemplo, em que os promesseiros pediram seios de cera. Em outra época, celular. Tudo para usar esses objetos na hora de pagar suas promessas.  No ano passado, por exemplo, um item que os promesseiros pediram para confeccionar foi a carteira de trabalho.

“Cresceu bastante a produção desse item”, disse Pedro. Sobre o perfil social e econômico de quem encomenda as peças, Pedro disse que os promesseiros são pessoas pobres e humildes, as que têm mais dificuldades para acessar os serviços básicos de saúde, por exemplo. “E que só podem se apoiar na fé”, afirmou.

Pedro disse que os riscos têm, sim, problemas de saúde. Mas que, como dispõem de recursos financeiros, são atendidos em hospital particular ou, dependendo da situação, viajar para outros grandes centros urbanos em busca de um melhor atendimento. “A promessa, em si, é feita pela classe humilde e o pobre”, afirmou.

Pedro disse que os preços levam em consideração a realidade desse promesseiro. Tem item que custa R$ 10, R$ 15. Há pessoas que comentam que Pedro poderia aproveitar esse período para aumentar os preços e faturar mais.

Mas o gerente explicou que esse não é o objetivo. “Produzir esses itens também é uma devoção nossa”, destacando a fé verdadeira dos fiéis que têm, sim, suas graças alcançadas graças à Nossa Senhora de Nazaré.

“É algo que não vejo como ganho econômico. Eu digo que é um ‘triangulo amoroso’: a gente que produz, o romeiro e Nossa Senhora. É mais uma questão de devoção”, afirmou. “Tanto que a Casa Círio existe desde 1890 (mais de 100 anos, portanto) e não estamos ricos”, brincou.

'Promessa é só idoso que faz', diz gerente


Pedro destacou uma particularidade que considera “muito interessante”. “Promessa é só idoso que faz. O jovem vai à missa, mas não acende vela, por exemplo. Os idosos vão e compram para o neto que passou no vestibular ou conseguiu emprego. Ou para a nora que quebrou o pé. São sempre os idosos. Quando não é o idoso, é o filho ou o neto mais próximo dele. Ele chega aqui no balcão e liga: ‘vó’, é a mão direita ou esquerda? Essa cabeça é de homem ou de mulher?”, contou.

Aproximadamente 90% dos clientes da casa são paróquias, que não vivem de lucro, mas, sim, de caridade. “Nossa margem de lucro é pouquinha”, disse João do Socorro Santana Pereira, 60, trabalha na Casa Círio há 17 anos.

"Gosto de produzir todas as peças. Fico feliz de atender todo o povo paraense fabricando as peças do Círio de Nazaré”, disse. “A perna é o dá mais trabalho porque é mais pesada”, contou.  Ele leva 10 minutos para produzir essa peça, e confecciona 25 desses artigos por dia. João disse se emociona em fazer essas peças, sabendo que as pessoas vão usá-las para pagar promessas feitas à Nossa Senhora de Nazaré.

“A margem de lucro é pouquinha”, diz João do Socorro Santana Pereira, que trabalha na Casa Círio há 17 anos. "A perna é o que dá mais trabalho, porque é mais pesada”, conta ele, que leva 10 minutos para produzir essa peça. "Gosto. Fico feliz de atender o povo com as peças do Círio”

Na loja Guedes artesanato, na travessa 3 de Maio, também em Belém, o carro chefe é a restauração de peças. A pandemia afetou a encomenda de imagens. “A pandemia quebrou muito as vendas. A gente vendia muita coisa do Círio”, disse Luiz Paulo Guedes, sobrinho do dono da loja, Luiz Guedes. A loja tem mais de 30 anos de existência.

Ele informou que muitas pessoas estão procurando o ateliê para restaurar imagens de Nossa Senhora. “É para deixar a imagem bonita e as pessoas fazerem as orações em suas casas”, explicou. Dependendo do estado de conservação da imagem, a restauração varia entre R$ 30 e R$ 50. Apesar do aumento no valor de vários materiais, esses preços são os mesmos do ano passado, disse. A aposentada Marileide Couto Barbosa, 77 anos, mandou restaurar uma imagem, mas de Santo Expedito.

“Ganhei essa imagem, mas caiu e quebrou o pescoço. Mandei restaurar. Ficou linda”, disse. Mas a imagem de nossa Senhora de Nazaré está na sala de sua casa, cercada de rosas. Ela contou que seu irmão estava hospitalizado, com um sério problema de saúde. “Eu assinei no manto de Nossa Senhora e, no dia seguinte, ele estava bem”, contou ela, agradecendo a mais essa graça alcançada graças à padroeira dos paraenses.

A aposentada Marileide Couto Barbosa, 77 anos, mandou restaurar uma imagem, de Santo Expedito. Ela também tem uma imagem de nossa Senhora de Nazaré na sala de sua casa, cercada de rosas. Ela contou que seu irmão estava hospitalizado, com um sério problema de saúde. “Eu assinei no manto de Nossa Senhora e, no dia seguinte, ele estava bem”

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