Belém está entre as 9 capitais do país que oferecem gratuidade no transporte público, aponta NTU
A gratuidade das passagens aos domingos e feriados é fruto de uma iniciativa da Setransbel e da Prefeitura de Belém, em vigor desde abril deste ano
Belém está entre as nove capitais brasileiras que já adotaram a tarifa zero no transporte público, segundo dados da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU). A gratuidade das passagens aos domingos e feriados é uma iniciativa do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belém (Setransbel) e da Prefeitura de Belém, em vigor desde abril deste ano. A medida já beneficia milhares de usuários do transporte público da Região Metropolitana de Belém e também impulsiona o comércio local - devido ao aumento da circulação de pessoas nos espaços públicos. Em meio a isso, atualmente, o Ministério da Fazenda avalia a viabilidade da expansão da tarifa zero, com base em estudos solicitados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Já demonstrando um maior fluxo de pessoas nas ruas aos domingos e feriados, na capital paraense, o benefício contempla ainda a linha urbana Mosqueiro/São Brás, incluindo os municípios de Ananindeua, Marituba e Santa Bárbara do Pará. Em nível regional, ao implantar o sistema, Belém também se destaca por estar à frente de outras cidades da região Norte - além de Palmas (TO) na adoção dessa política.
O diretor executivo do NTU, Francisco Christovam, considera que a tarifa zero é uma política pública adotada por algumas cidades para garantir o deslocamento da população sem a necessidade de pagamento. Com isso, o município oferece subsídio às empresas operadoras de transporte público e a população usufrui do serviço gratuitamente. Para ele, essa é uma medida de natureza social e inclusiva. Ele destaca que essa medida assegura o acesso irrestrito a um serviço público que é tanto fundamental quanto estratégico.
“No Brasil, temos 415 municípios que estão subsidiando os seus sistemas de transporte. Há uma complementação do valor para cobrir o custo da prestação do serviço. Por exemplo, se a prestação do serviço custa R$ 10 para o passageiro, a prefeitura estabelece uma tarifa pública de cinco reais, aportando a diferença para completar aquilo que nós denominamos tarifa técnica, que é o valor que remunera as empresas pela prestação do serviço. Das 415 cidades que estão subsidiando os seus sistemas de transporte, 170 operam com tarifa zero. E em 132 cidades a tarifa zero é plena, funciona todos os dias em todas as regiões. E, em 32 cidades, a tarifa zero é parcial”, aponta Francisco Christovam
Christovam explica que a tarifa zero pode ser plena, funcionando todos os dias em todas as regiões, ou parcial, existindo em dias específicos, em alguns bairros ou para atender a segmentos específicos da população. Entre as capitais, algumas cidades já adotam a medida, com algumas especificidades: Belém (PA) e Brasília (DF) oferecem gratuidades apenas aos domingos e feriados; Belo Horizonte (MG) aplica a medida apenas nas linhas que atendem vilas e favelas; Cuiabá (MT) também restringe aos domingos e feriados; Curitiba (PR) concede o benefício apenas para desempregados cadastrados no programa "Tarifa Zero Para Quem Precisa"; Florianópolis (SC) oferece tarifa zero somente no último domingo de cada mês; São Paulo (SP), Maceió (AL) e Palmas (TO) disponibilizam o serviço gratuito aos domingos, sendo que Palmas também inclui os feriados.
Acessibilidade
A implantação da tarifa zero, de acordo com as experiências e acompanhamento da NTU, gera um crescimento do comércio, especialmente nas áreas centrais das cidades. Isso ocorre, na avaliação do diretor do NTU, porque o dinheiro que a população antes gastava em transporte é agora direcionado para a compra de produtos e serviços. Christovam cita como exemplo que, na cidade de São Caetano do Sul, na região metropolitana de São Paulo, a atividade comercial durante os dias de tarifa zero cresceu 30%, demonstrando os benefícios dessa medida.
“Socialmente, a tarifa zero garante acessibilidade total ao serviço. A implementação da tarifa zero em alguns municípios demonstra um crescimento significativo na demanda. Não vemos a tarifa pública como um modismo. A implementação de um sistema de tarifa zero é uma decisão que depende das particularidades de cada município. Alguns municípios, por exemplo, possuem uma arrecadação que permite à prefeitura contratar empresas operadoras e oferecer o serviço de transporte público gratuitamente à população”, considera o diretor do NTU.
Menos poluição
Outro fator importante, conforme lembra Francisco, é que o aumento do uso do transporte coletivo público, impulsionado pela tarifa zero, traz diversos benefícios significativos para além do fator socioeconômico. Isso porque menos pessoas utilizando o transporte individual privado - automóveis e motos - significa menos poluição nas cidades e redução do congestionamento. Na avaliação do diretor do NTU, as motos, mesmo sendo transporte individual, também contribuem para a poluição, por vezes mais do que os carros.
Portanto, a tarifa zero também traz benefícios do ponto de vista climático e ambiental, trazendo menos impactos aos meios de transporte convencionais. “Oferecer condições para que as pessoas possam se deslocar da origem ao destino, seja para trabalhar, ir à escola, ao hospital, a uma consulta médica, fazer compras ou desfrutar do lazer nos fins de semana. Tudo isso significa deixar o carro e a moto em casa e usar o transporte coletivo, que é muito mais democrático, ecologicamente sustentável, polui muito menos a cidade, ajuda a organizar o trânsito e assim por diante”, destaca o diretor.
E ao passo em que se prioriza o transporte coletivo nas cidades, Francisco lembra de se fazer isso de maneiras ambientalmente corretas. “Com a COP se aproximando, Belém tem recebido muitos investimentos, incluindo a mudança do perfil da frota, com a substituição de ônibus a diesel por ônibus elétricos. Tudo isso é muito bem-vindo e contribui para a melhoria da qualidade de vida da cidade e da população. No entanto, não podemos esquecer de um fato preliminar que antecede tudo isso: a prioridade deve ser dada ao transporte coletivo”.
Ao falar dos benefícios, o presidente do Setransbel, Paulo Fernandes Gomes destaca que a tarifa zero representa um avanço importante para garantir o direito à mobilidade e ampliar o acesso da população ao transporte público: “Trata-se de uma política de inclusão social, que permite que todos os cidadãos possam se deslocar com dignidade e igualdade de oportunidades, fortalecendo o transporte coletivo como serviço essencial”.
Alinhado à visão técnica da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), o presidente ressalta que a adoção da tarifa zero exige planejamento e fontes permanentes de custeio. “Sem financiamento sustentável e gestão eficiente, o sistema corre o risco de perder qualidade ou até de se tornar inviável. É preciso responsabilidade e equilíbrio para que o benefício se mantenha sem comprometer a operação”, afirma.
O gestor ainda reitera que apoia toda iniciativa que fortaleça o transporte coletivo e melhore a vida dos usuários. “Nosso compromisso é com um transporte público moderno, acessível e sustentável, capaz de integrar a cidade e a sua região metropolitana, garantindo mobilidade para todos”, analisa.
População
No dia a dia da população, a medida tem sido bem recebida pelos usuários do transporte público, como a estudante Ana Beatriz Barbosa. Ela comenta que a medida trouxe mais acessibilidade para poder sair sem se preocupar com um gasto a mais. “Facilitou muito o deslocamento. Eu dificilmente saía aos domingos. A gratuidade nesse dia foi uma salvação, porque, às vezes, saímos no sábado à noite e, quando vemos, só conseguimos voltar no domingo de manhã”, afirma.
Para o estudante Ilson Neto, a gratuidade do transporte público aos domingos também tem sido muito útil. Ele, que também é ator, explicou que utiliza o serviço tanto para lazer, como sair com amigos, quanto para compromissos profissionais, como ensaios. Segundo Wilson, a medida aliviou o impacto financeiro, já que os gastos se concentravam nos dias úteis.
“Facilitou muito a gratuidade. Normalmente, uso ônibus para sair também. Às vezes uso quando tenho um ensaio ou algum projeto para ir de um lugar para o outro. É muito útil para mim. Mas, quando vou sair, gosto muito de ir para a praça da República. Pesava bastante no bolso [durante o fim de semana], principalmente porque a gente já gasta durante a semana toda. Gastar com o sábado e o domingo, agora que está de graça, facilitou bastante”, pontua o jovem.
Comerciantes
Em meio ao aumento de fluxo de mais pessoas circulando, comerciantes também comemoram o aumento das vendas e elogiam a medida de gratuidade, que aquece as vendas. Um dos pontos é no entorno da praça da República, no centro de Belém. O comerciante Antônio Pinheiro, 64 anos, pontua que a situação melhorou com a gratuidade dos ônibus, o que tem atraído mais pessoas às ruas, inclusive turistas.
Segundo ele, o transporte gratuito aumentou o movimento aos domingos e contribuiu para a melhora das vendas. Vendedor de castanha-do-Pará nas proximidades da praça, ele comemora o aumento do fluxo de pessoas: “Melhora, porque tem ônibus e é de graça, então dá mais gente na rua”.
Quem também comemora é a comerciante Roseane Pompeu Mendes, que trabalha há alguns meses vendendo coco na praça da República e já percebeu as vendas aquecer. “No domingo, é excelente. Para quem trabalha desde domingo, as vendas são ótimas. Muitas famílias vêm passear, trazem seus cachorros, e sempre dão uma volta para pegar um vento, tomar uma água de coco. Graças a Deus, as vendas aos domingos são muito boas, realmente excelentes”, ressalta.
Análise técnica
Já com relação à implementação da tarifa zero, o diretor da NTU frisa que isso requer uma análise técnica detalhada, incluindo uma previsão de aumento da demanda, e que não se trata de uma proporcionalidade direta onde dobrar a demanda significa dobrar a frota. “Isso porque há um aproveitamento da ociosidade da frota, especialmente nos horários de entre-picos, quando os veículos circulam com lugares vazios. Com a tarifa zero, esse aproveitamento da frota e dos lugares oferecidos é muito maior. No entanto, é fundamental realizar uma análise aprofundada para prever o momento certo e verificar se os recursos estão disponíveis para garantir a implantação dessa política pública com seriedade.
Custos
Segundo Christovam, a responsabilidade pelo planejamento, programação, contratação, realização e fiscalização do serviço de transporte coletivo urbano de passageiros cabe aos municípios, de acordo com o artigo 30 da Constituição Federal, sendo, portanto, a prefeitura a responsável por arcar com os custos. Para cobrir esses custos, alguns municípios aumentam sua arrecadação criando receitas extraordinárias. Ao mesmo tempo em que a população é beneficiada, as empresas também são subsidiadas pela gestão municipal. O serviço é especificado pela prefeitura, que define suas características, como o veículo que vai operar, o itinerário, o intervalo e a lotação dos ônibus.
A empresa operadora, pública ou privada, aloca e afronta seus veículos conforme a ordem de serviço operacional, que é remunerada por esse custo. “Essa conta é paga pelo orçamento público, ou seja, não é o usuário quem paga, mas sim os beneficiários. As empresas e o comércio, que se beneficiam do transporte, pagam por esse serviço por meio da arrecadação municipal. Quando pagam o IPTU, o ISS, o IDTI e outros tributos e taxas municipais, todo esse valor vai para uma conta pública que garante o pagamento pela prestação do serviço”, observa o diretor do NTU.
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