Altas temperaturas transformam hábitos dos paraenses dentro e fora de casa
Uso de ar-condicionado, ventiladores e hidratação se intensifica em Belém
Alterações no clima estão provocando mudanças de hábitos entre os paraenses, que, mesmo durante o chamado “inverno amazônico”, reclamam de altas temperaturas. Um dos principais cuidados é com a hidratação, que passou a ser reforçada, com o uso de leques e o investimento em refrigeração em casa. A pesquisadora socioambiental Flávia Vieira explica que adotou todas essas medidas e ainda planeja instalar um novo equipamento de refrigeração, dessa vez na sala, para que toda a família consiga ficar junto em um ambiente mais confortável.
Segundo ela, é comum na sua família que, à medida que os membros adquirem condições financeiras suficientes, optem pela instalação de um sistema de refrigeração residencial. Essa é a principal estratégia para suportar os dias dentro de casa, ambiente em que passam boa parte do tempo, sobretudo nos momentos de interação da família.
“A gente tenta beber mais água, mas também temos uma preocupação de conseguir ter ar-condicionado em todos os ambientes da casa, de ter vários ventiladores, porque fica cada vez mais difícil estar com a família ou conseguir trabalhar com esse calor extremo”, explica a pesquisadora.
Vieira também tenta manter o hábito da caminhada ao ar livre, o que tem sido afetado pelo calor intenso, eventualmente limitando sua disposição para a prática. Isso se soma às mudanças no clima típico dessa época de fim de ano, em Belém, quando se esperava por dias de chuvas intensas.
“Acredito que, mesmo com as chuvas fortes, temos vivenciado períodos, às vezes, sem chuva. Houve alguns dias até sem chuva, o que tem se tornado mais frequente em Belém: períodos prolongados sem chuva, mesmo no inverno amazônico. E, embora tenhamos as chuvas, também há dias mais quentes”, avalia a pesquisadora.
Os dados do levantamento feito pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) confirmam a percepção da pesquisadora paraense. Segundo a pesquisa, Belém lidera o ranking das capitais brasileiras com maior número de dias de calor extremo, com 212 dias com temperaturas elevadas em 2024. O volume supera o de outras capitais e revela um cenário preocupante: nesta década, a capital paraense já acumula mais dias com temperaturas acima de 35,5 °C do que nos 60 anos anteriores somados.
Além do desconforto térmico, o calor intenso traz impactos diretos à saúde, especialmente à pele. A dermatologista Heliana Góes, presidente da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), alerta que as altas temperaturas podem agravar doenças dermatológicas.
“O calor intenso provoca a dilatação dos vasos sanguíneos para dissipar a temperatura, o que pode exacerbar doenças da pele como a rosácea e a dermatite atópica. Além disso, pode piorar o fotoenvelhecimento e o melasma, pois a radiação ultravioleta estimula os melanócitos”, explica a especialista.
Segundo Heliana, o ambiente quente e úmido também favorece a proliferação de microrganismos. “O calor e a umidade permitem a proliferação de patógenos, com o surgimento de micoses, como a pitiríase versicolor, e infecções bacterianas”, acrescenta.
Para minimizar os danos, a dermatologista orienta cuidados específicos. “Devemos orientar a hidratação tanto por meio da ingestão de água quanto através do uso de hidratantes. Além do protetor solar, que deve ser reaplicado com mais frequência devido ao suor, a proteção física também é fundamental, com chapéus de aba larga, óculos de sol com proteção UV e roupas com tecnologia de bloqueio solar”, recomenda.
Ela também ressalta a importância dos cuidados durante o banho e com as roupas. “É importante tomar banhos mornos ou frios e realizar uma limpeza suave, com sabonetes syndets ou de bebê, para não agredir a pele já sensibilizada pelo sol. Manter roupas frescas e secas ajuda a evitar problemas como a miliária, conhecida como brotoeja, e o intertrigo, que são micoses comuns em áreas de dobra”, conclui.
O fenômeno do calor extremo está associado principalmente à perda de cobertura vegetal e às mudanças climáticas globais, com impactos mais severos nas áreas periféricas da cidade, onde a infraestrutura é mais limitada. De acordo com o Cemaden, a tendência é que esse cenário se mantenha nos próximos anos, inclusive em 2026, exigindo cada vez mais adaptação da população às novas condições climáticas.