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Bubalinocultura: Pará é consagrado como o maior produtor de búfalos do Brasil

Estado é pioneiro ao adotar sistema de rastreabilidade que garante qualidade e segurança à produção de búfalos

Ize Sena/Especial para O Liberal

Um gigante original da Ásia encontrou no estado do Pará um terreno ideal para se adaptar e reproduzir a espécie. Os búfalos são animais de grande porte, cuja genética foi favorecida pelas condições climáticas da região amazônica. A água, em abundância no estado, foi fator essencial para o desenvolvimento do animal, e para o consequente sucesso da bubalinocultura na região, consagrando o Pará como o maior produtor de búfalos do Brasil. 

O zootecnista da Federação da Agricultura e Pecuária do Pará (Faepa), Guilherme Minssen, destaca que a perfeita adaptação da espécie ao clima se deve, principalmente, à água. “Quando vieram para cá, encontraram no Arquipélago do Marajó e no Baixo Amazonas, um ambiente perfeito. Clima, temperatura e ambiente pluviométrico. Ou seja, tem água para o búfalo se desenvolver, não só na parte de rios, lagos, mas nós temos o inverno marajoara, onde o búfalo se dá muito bem. Hoje, nós consideramos que o búfalo está muito mais adaptado nas Américas do que na própria origem”, avalia.

Acredita-se que a origem do búfalo no Pará está ligada a duas versões: a importação da raça Mediterrâneo da Itália para a Ilha do Marajó, por um fazendeiro, em 1895, além das teorias sobre a chegada dos búfalos através de um navio que naufragou, o que obrigou os animais a nadarem até a costa da ilha. Seja qual for a verdadeira versão, o fato é que o búfalo se tornou um símbolo da região, sendo parte essencial da economia e da cultura marajoara. 

Uma vez ambientado, segundo o zootecnista da Faepa, o animal se torna mais produtivo. “Ele produz mais leite, carne, couro e trabalho. É muito importante lembrar que o búfalo é um animal de trabalho, tração e montaria na Ilha do Marajó. Algumas vezes, só ele atravessa aquela região. O búfalo era um animal que antigamente, nas décadas de 40 e 50 era exótico. Mas, chegou, se adaptou e se multiplicou devido ao meio ambiente. Hoje ele é uma das nossas referências dentro da zootecnia como produtividade”, destaca Guilherme Minssen.

Além do Mediterrâneo, no Brasil, há três raças predominantes: Murrah, Jafarabadi e Carabao. Destas, Murrah, Mediterrâneo e Jafarabadi são conhecidas pela produção de leite e carne, enquanto Carabao é valorizado pela rusticidade e carne. 

A genética diferenciada desses animais aliada às boas condições ambientais encontradas no Pará os torna mais longevos, férteis e eficientes na conversão de pastagens rústicas em proteínas de alta qualidade. Esse cenário favorece perspectivas de um futuro promissor. “O Pará tem o maior rebanho bubalino brasileiro. Mas a gente calcula que podemos ter de 4 a 5 milhões de búfalos, em áreas que são abertas, antropizadas e tem total condições de produzir. Temos muito para crescer ainda, aumentar esse volume de animais e ter condições do animal ter nutrição para poder evoluir”, acredita o especialista.

Rastreabilidade dos animais garante segurança à produção

image Sistema de rastreabilidade amplia a competitividade do setor no mercado nacional e internacional (Divulgação/Adepará)

De acordo com os últimos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), registrados em 2023, o Brasil possui 1.672.956 cabeças de búfalos e o estado do Pará consolida sua posição como líder na produção no cenário nacional. O Sistema de Gestão Agropecuária (SIGEAGRO 2.0), ferramenta desenvolvida pela Agência de Defesa Agropecuária do Pará (Adepará), registra um rebanho de 712.744 animais concentrados, principalmente, no arquipélago do Marajó e na região do Baixo Amazonas. 

E para garantir segurança, transparência e qualidade para a produção pecuária paraense, o estado instituiu o programa Pecuária Sustentável, por meio do Decreto nº 3.533/23. A iniciativa, executada pela Adepará, é uma política pioneira no país que promove a sustentabilidade da cadeia da pecuária com o objetivo de garantir maior responsabilidade social, ambiental e sanitária para essa atividade econômica. 

Uma das ações do programa é o Sistema de Rastreabilidade Bovídea e Bubalina do Pará (SRBIPA), que já realizou uma identificação piloto em 2 mil búfalos no ano passado. O programa está sendo implementado em fases e atualmente encontra-se na adesão voluntária dos produtores. No último mês de agosto, iniciou-se a terceira etapa. A partir de janeiro de 2026, se inicia a fase obrigatória para todos os animais que irão transitar no estado. E em janeiro de 2027, a expectativa da Adepará é que todo o rebanho paraense  esteja identificado. 

Na prática, as ações desenvolvidas pelo Sistema acompanham a vida do animal desde o seu nascimento até o abate. Mas isso só é possível com o auxílio de elementos oficiais de identificação, compostos por um conjunto duplo: um brinco de identificação visual, na cor amarela, e um botão eletrônico, na cor azul, fabricado com tecnologia para radiofrequência, acompanhados de seus respectivos pinos fixadores. 

Rebanho identificado

Tanto o brinco quanto o botão eletrônico devem conter a mesma numeração, de quinze dígitos, iniciando com os números 076 que identificam o animal como oriundo do Brasil, além de apresentar características específicas, como o símbolo do mapa do Pará e a sigla SRBIPA. 

“Cada animal recebe um número, como se fosse um CPF, o qual trata informações como, sexo, faixa etárias e vacinações obrigatórias”, explica a gerente de Rastreabilidade da Adepará, a médica veterinária, Barbara Lopes, ao reforçar que produtores que têm até 100 cabeças de bovinos ou bubalinos recebem sem custo os elementos de identificação individual e a aplicação dos brincos do programa. 

A Adepará alerta que a aplicação dos dispositivos deve ser feita individualmente, um em cada orelha do animal, e que tanto o brinco visual quanto o botão eletrônico devem ser fabricados conforme as normas do Comitê Internacional para Registros de Animais (ICAR).

Barbara Lopes destaca os impactos positivos na segurança sanitária e na sustentabilidade, ao garantir maior transparência ao longo da cadeia produtiva, desde a fazenda até o frigorífico. “Muitos países importadores exigem carne bovina rastreável, com comprovação de origem. Além disso, o produtor pode realizar a gestão mais eficiente da produção, com controle mais ágil do rebanho (pesagem, alimentação, reprodução e sanidade). Essa gestão da propriedade já é feita pelos grandes produtores rurais e agora, através do SRBIPA os pequenos produtores também têm a oportunidade de realizarem a gestão eficiente de suas propriedades”, garante.

A gerente de Rastreabilidade também afirma que o Sistema representa um avanço significativo em relação ao modelo anterior de rastreabilidade por lote, realizado através da Guia de Trânsito Animal. “A rastreabilidade individual facilita a identificação precisa de focos de doenças, permitindo intervenções rápidas, redução de perdas e controle mais eficiente de enfermidades pela Adepará. Em relação a questões ambientais, a associação direta de cada animal à propriedade de origem permite verificar se a produção está ocorrendo em áreas regulares do ponto de vista ambiental, contribuindo para a pecuária sustentável e livre de desmatamento ilegal”, afirma Barbara Lopes.

Sabores que enchem os olhos e a mesa

A bubalinocultura no Pará também é representada quando o assunto é a gastronomia da região amazônica. De acordo com o zootecnista da Faepa, Guilherme Minssen, a carne de búfalo é um dos produtos com grande potencial, destacando-se por ser mais magra e ter menos colesterol que a carne bovina. 

“É uma carne que tem muito mais irrigação sanguínea, então ela tem proteína de alta qualidade e isso nós conseguimos transmitir para a população com um preço menor, ou seja, é mais competitiva que carne bovina”, avalia Guilherme.

Outro produto de destaque na mesa marajoara é o queijo de búfala, que possui Indicação Geográfica, um instrumento de propriedade industrial usado para identificar a origem de um determinado produto ou serviço, concedido pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI). 

A iguaria é o único produto lácteo genuinamente paraense. Guilherme Minssen explica que a maior concentração de gordura e proteína no leite de búfala faz com que a produção de queijo seja mais eficiente: “são necessários apenas oito litros de leite de búfala para produzir 1 kg de queijo, enquanto 12 litros de leite de vaca são necessários para a mesma quantidade”.

Quem entende bem sobre a qualidade do queijo produzido no Marajó é a presidente da Associação dos Produtores de Leite e Queijo do Marajó (APLQMARAJO), Gabriela Gouveia. Ela também é gestora da Fazenda Mironga, um lugar que une sabor e tradição na Ilha. O negócio, que hoje conta com 80 animais, sendo destes 40 búfalas em lactação, traz a atividade da cadeia produtiva do búfalo no DNA. “Com carga histórica e cultural latente, a pecuária faz parte da atividade familiar há quatro gerações”, conta Gabriela.

A produtora destaca a importância da rastreabilidade para a segurança do rebanho no Marajó. “A rastreabilidade está sendo implantada recentemente. Isso é legal para controle do rebanho e também controle sanitário, o que garante a origem e procedência do rebanho”. E ela faz um alerta: “é impossível produzir um bom queijo do Marajó, por exemplo, sem sanidade do rebanho. Então, estamos esperançosos com esse controle”, complementa.

Para Gabriela, o valor do búfalo vai muito além do financeiro. “Como repetimos sempre, o búfalo é de fundamental importância para o nosso território. Fixa o homem no campo, é propulsor da economia local, mas além disso, ele é troca! Quem convive com os búfalos percebe essa relação, interage com diversos ecossistemas de maneira harmoniosa, permite manejo e determina suas preferências”, finaliza.