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Onde os monstros se revelam

Os caminhos da internet profunda usada por criminosos para compartilhar conteúdos fora da lei. Tema voltou à tona com massacres em Suzano (SP) e Nova Zelândia

Anna Peres | Conexão AMZ

Muito além das buscas do Google, existe um submundo onde criminosos e pessoas má intencionadas se escondem atrás do anonimato para cometer todo tipo de crimes e propagar discursos de ódio. Mas, será que isso só acontece por causa da Internet ou de seu braço oculto, a deep web, ou ainda de sua parte mais obscura, a dark web?

Para a professora Kalynka Cruz, pesquisadora em cibercultura na Universidade Federal do Pará (UFPA), a resposta é não. “A deep web é só uma ferramenta de agregação para uma doença da sociedade”, opina. Nas últimas semanas, as investigações sobre o massacre de Suzano, na Região Metropolitana de São Paulo, revelaram que os assassinos frequentavam um site conhecido como “Dogolachan”, na dark web.

Guilherme Monteiro e Luiz Castro assinaram oito pessoas e, depois, se mataram na até então pacata cidade paulista. Parte do plano, que eles arquitetavam há mais de um ano, chegou a ser revelada em um chat dessa internet profunda, onde também se encontram pedófilos, traficantes, terroristas, hackers e pessoas que buscam compartilhar conteúdos censurados e ilegais. “Qual a participação da deep web nisso? É a mesma coisa que culpar jogos de vídeo game por massacres. A tecnologia só serve aquilo a que o homem se propõem”, defende Kalynka.

O raciocínio vale também para os discursos de ódio contra minorias, que se propagam com cada vez mais frequência mesmo pela internet, digamos, comum. “As pessoas vão se agregar por semelhança. Então, vão procurar pessoas que acreditem naquilo que elas acreditam”, diz. Nesses casos, o anonimato das redes profundas apenas encoraja discursos ainda mais radicais. “É obvio que se você acha que está nesse nível de proteção, os seus monstros vão vir à tona.”

Internet usada para amplificar os crimes

Titular da Delegacia de Prevenção e Repressão a Crimes Tecnológicos, em Belém, a delegada Vanessa Lee Araújo está acostumada a lidar diariamente com casos em que a Internet vira arma para crimes contra a honra e a dignidade sexual, injúria e difamação. E, nesses casos, nem sempre sob a pseudoproteção do anonimato.

“Algumas pessoas cometem, sim, crimes na internet com esse pensamento de que estão protegidas, de que estão anônimas. Mas, em muitos casos, os crimes são cometidos com a intenção de ter ampla divulgação, uma repercussão muito maior do que teria sem o uso da Internet. Nesses casos, o que o criminoso quer é, justamente, que a publicidade na Internet acabe com a vida da vítima, que ela não consiga mais viver em sociedade”, diz a delegada.

A publicidade da internet era também o que queria o atirador da Nova Zelândia, que transmitiu, ao vivo pelo Facebook, o momento do ataque que deixou 50 pessoas mortas em duas mesquitas. “A Internet  tem mais lados positivos do que negativos. Ela veio para democratizar o conhecimento, para possibilitar a participação e o pluralismo político das pessoas. Mas, como qualquer novo fato social, e é isso que a internet é, ela vai, sim, ter seu lado negativo”, defende a delegada. Para Vanessa, a tecnologia pode até ser usada para a prática de crimes, mas, também, auxilia o trabalho da polícia, inclusive para prender criminosos que agem na própria Internet, como os pedófilos.

Uso desvirtuado

Para a professora da UFPA, o mesmo se pode dizer da deep web. “A proposta da deep web era trabalhar com informações que não deveriam ou que não se queria compartilhar com todo mundo. Ela não era necessariamente ruim”, explica. Originalmente, por exemplo, as redes anônimas eram destinadas ao uso de ativistas políticos e jornalistas sob censura.

O anonimato, no entanto, acabou por atrair pessoas interessadas em compartilhar todo tipo de conteúdo obscuro, macabro e ilegal. “Com todo esse potencial para livre distribuição de qualquer tipo de conteúdo sem que se seja facilmente rastreado, é claro que uma parte da deep web acabou virando antro para todo tipo de aberrações que você possa imaginar”, destaca.

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