Fazenda da Esperança: comunidade terapêutica ajuda paraenses a abandonarem vícios

Método aposta no trabalho, na convivência e na espiritualidade para recuperação de dependentes químicos

Eduardo Laviano

Quando um amigo foi para a Venezuela trocar um carro por meio quilo de cocaína em dezembro de 2006, o engenheiro elétrico Luciano de Figueiredo pensou em tirar a própria vida por meio de uma overdose. "Decidi cheirar e comer tudo até morrer. Eu não tinha coragem de colocar uma corda no pescoço", conta. De família de classe média, ele conta que viveu a ilusão do mundo das drogas ao longo de 11 anos. Os estudos foram interrompidos, os problemas familiares se avolumaram e ele perdeu a vontade de trabalhar. Quando a tentativa de suicídio falhou, ele se sentiu completamente derrotado pelos vícios e decidiu mudar de vida.

Luciano de Figueiredo se tornou membro da Fazenda da Esperança em 2007 (Foto: Igor Mota)

"Comecei a usar por curiosidade no condomínio onde morava. Cheguei ao fundo do poço. Pedi a Deus que se ele realmente existisse me tirasse daquela situação, pois eu não queria morrer", lembra. Em janeiro de 2007, ele se tornou membro da Fazenda da Esperança, uma comunidade terapêutica que atua desde 1983 no processo de recuperação de pessoas que buscam a libertação de vícios, como o álcool e as drogas. Luciano aprendeu a importância de ter horários e disciplina, se reconectou com a espiritualidade e buscou se livrar de pensamentos negativos. Hoje, ele coordena a seção do projeto na capital paraense. 

Idealizada pelo frei alemão, Hans Stapel, franciscano da Ordem dos Frades Menores, a Fazenda opera desde 1983 e está presente em mais de 20 países. Em Belém, ela fica localizada na estrada para a ilha de Mosqueiro e acolhe 70 pessoas que acordam todos os dias às 6h e realizam diversos trabalhos, desde marcenaria até panificação. "Voltei a sonhar, comecei a estudar dentro da Fazenda", afirma.

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Após voltar ao mercado de trabalho, Luciano propôs para a esposa que se mudassem para a Fazenda. Eles arrumaram as malas e foram junto com as duas filhas para a Fazenda, que é inteiramente conduzida por voluntários e se sustenta por meio de doações. "Foi um chamado de Deus. Mergulhei nessa experiência de cabeça. A nossa vida é missionária. O que eu encontrei aqui, nenhum lugar nunca me ofereceu, que é a riqueza verdadeira da alma. Antes eu olhava para os lados e só via o vazio. Hoje vejo luz. Vejo minha família unida e restaurada. Hoje, sou um homem livre", afirma.

Mas nem tudo são rosas. Luciano conta que fechar as contas todos os meses não é fácil e que os problemas os fazem chorar sozinho. "Não é fácil. Vai desde problemas financeiros até problemas com os meninos, que podem muito bem bater o pé e irem embora e deixar a Fazenda à deriva", diz ele, ao recordar que a meta é chegar a 120 pessoas atendidas. Os trabalhos realizados na Fazenda ajudam a manter o projeto de pé. Eles plantam e vendem alface, fabricam pães e doces e também criam galinhas e porcos. As doações de madeiras apreendidas viram móveis e ajudaram a erguer, inclusive, uma capela com um jardim e todos os itens sacros de dentro dela.

"É motivo de orgulho ver que o estilo de vida que a gente prega aqui produz resultados tão significativos. Mostra que eles são capazes de tudo, de ter uma vida boa e saudável longe das drogas. Cada um aqui tem um dom", avalia. Hoje, a Fazenda possui seis casas onde os moradores vivem e também passam por formações e capacitações com o apoio de órgãos como o Ministério Público do Trabalho, Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial e Arquidiocese de Belém. 

Muitas dores invisíveis levam pessoas, ainda muito jovens, ao mundo das drogas. Antes de chegar na Fazenda, há três meses, Clauber Duarte já somava 12 anos ininterruptos como usuário de drogas - e ele tem apenas 20 anos. Aos oito anos de idade, ele voltou da escola e se deparou com o pai morto no chão de casa por conta de uma overdose. Hoje, ele sonha em estudar e formar uma família. Foi o estopim de tudo. 

image (Foto: Igor Mota)

"Quando cheguei, o mundo pareceu novo. Fui muito bem acolhido por todos. A minha vida já estava desandando bastante, com problemas familiares e com a minha mãe, até que um dia me toquei do sofrimento que causava para ela. Decidi tomar um rumo na minha vida, ser alguém. Fazer minha mãe sorrir e não chorar mais. Cada dia que passa, me sinto mais e mais um homem novo. Deus vai me renovando e me inspirando. Aprendi a amar cada irmão que chega, ser carinhoso, atencioso. Aprendi a perdoar e tirar a maldade do meu coração", conta ele, enquanto varre a área de marcenaria da Fazenda em uma manhã ensolarada de sábado, dia reservado para organização, limpeza e harmonia dos espaços.

Enquanto Clauber sonha em construir uma família, Valdirlei Sousa sonha em recuperar a dele. Ele sempre gostou de futebol e chegou a ser selecionado em uma peneira do Paysandu quando era jovem, na posição de lateral. Aos 15 anos, foi apresentado para a maconha e nunca mais deixou de usar drogas de todos os tipos. Ele completará 50 anos no dia 11 de outubro, mas, hoje, nesta quinta-feira (26), completa 10 dias da nova vida que escolheu seguir desde que deu entrada na Fazenda.

"Fiz muita coisa errada. Meu pai me deixou dentro de casa uma vez e eu vendi tudo. Me desesperei e tomei a decisão de vir para cá depois de 35 anos como usuário. Comecei fumando para jogar uma bola. Cada dia que passa é uma vitória. Aqui a gente aprende muito com as pessoas, que são acolhedoras mesmo. É surreal. Aqui somos tratados como o ser humano deve ser tratado. Tenho três filhos e perdi o contato totalmente com eles há quatro anos, nem por celular a gente se fala. Todo dia bate a saudade. Eu queria a visita deles. A droga faz a pessoa se afastar de todo mundo, principalmente das pessoas que mais gostam de ti. Minha filha pergunta para a minha mãe sobre como eu estou", conta.

Sentado enquanto descansa do trabalho, ele pede para dar um conselho para a juventude: "não vale a pena a pessoa dar o primeiro trago e nem se deixar ser teleguiado por ninguém. Nunca façam isso", pede.

Saiba como ajudar a Fazenda da Esperança:

As doações em dinheiro podem ser feitas tanto por transferência bancária quanto via Pix:

  • Obra Social Nossa Senhora da Glória 
  • Fazenda da Esperança 
  • Banco do Brasil 
  • Conta Corrente: 24060-5
  • Agência: 4451-2 

PIX

  • CNPJ 48.555.775/0097-00
  • Para compras os produtos da Fazenda, como alimentos e móveis, basta entrar em conta via Whats App:
  • (91) 99311-2006
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