'Só quem é contra o Ferrogrão são as ONGs', diz senador Zequinha Marinho

Lobby de empresas interessadas em portos como Santos e Paranaguá prejudica também avanço do Arco Norte, afirma parlamentar paraense

Eva Pires | Especial para O Liberal
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O senador Zequinha Marinho (Podemos-PA) afirma que “só quem é contra o Ferrogrão são as ONGs financiadas por capital externo para impedir o avanço da infraestrutura no Brasil”. Em entrevista exclusiva ao O Liberal, o parlamentar destacou a importância da Ferrogrão, ferrovia que promete transformar a logística do escoamento da produção agrícola no Arco Norte, cujo julgamento foi marcado pelo STF para 1º de outubro, sinalizando um possível avanço decisivo para o projeto.

Pré-candidato à reeleição em 2026 e único parlamentar paraense na lista dos 100 mais influentes do Congresso, elaborada pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Zequinha Marinho também reforça que o Pará precisa de soluções concretas para sair do atraso estrutural. Ele aposta em temas estratégicos — da exploração da Margem Equatorial e regularização fundiária ao equilíbrio entre desenvolvimento e preservação ambiental — como bandeiras para o novo mandato.

O Senado Federal instalou, no final de agosto, a Frente Parlamentar Mista das Ferrovias Autorizadas (Frenfer), na busca de fortalecer o setor ferroviário nacional. Desde que foi aprovado em 2021, a Lei das Ferrovias – que prevê o novo regime de prestação de serviços públicos – possibilitou a autorização de 42 projetos de ferrovias privadas. No entanto, o senhor afirma que a falta de priorização por parte do governo federal tem travado os investimentos e, até o momento, nenhum desses projetos conseguiu sair do papel. Quais serão as prioridades do grupo para tentar destravar os investimentos no setor?

Senador Zequinha Marinho (Podemos-PA): Desde a época da República, as ferrovias no Brasil foram deixadas de lado para dar prioridade ao transporte rodoviário. Isso encarece o produto final, porque é o transporte mais caro, e favorece o acontecimento de acidentes de trânsito. Em cada acidente, além de ameaçar a vida e, às vezes, ceifar a vida do motorista, você também perde uma grande quantidade de toneladas, principalmente de alimentos. Então, criamos essa frente parlamentar para ajudar no processo de articulação junto a todo mundo.

O Marco Legal das Ferrovias (Lei nº 14.273/2021) estabelece regras para a exploração do setor ferroviário através de autorizações e concessões mais flexíveis, com a proposta de reduzir a burocracia, dar mais previsibilidade aos contratos e diminuir custos. Quais os principais desafios que permanecem neste setor?

No governo, há resistência às ferrovias autorizadas. No Congresso, aprovamos o Marco Legal com dois modelos: concessão — onde o governo aporta recurso — e autorização — onde não há aporte, apenas análise e aprovação pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Esse é o modelo do futuro: simples, legal e moderno. Mas hoje vemos empresários sendo assediados por membros do governo a mudar para o modelo de concessão.

Criamos uma frente parlamentar com parlamentares, organizações e empresários para popularizar o modelo das autorizadas. Já fizemos encontros importantes e há 42 requerimentos. Praticamente, estão todos dentro do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em busca da bendita licença ambiental. O Ibama hoje é muito moroso, tem pouca gente, uma burocracia danada, embora a gente tenha aprovado um novo código de licença ambiental no Brasil.

Também vamos propor ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) linha de crédito em formato de empréstimo, financiamento ou Parcerias Público-Privadas (PPP) mista, para dar segurança aos projetos já autorizados e incentivar novos investimentos.

Como forma de estimular o modelo das autorizadas, o senhor apresentou projeto de decreto legislativo (PDL 203/2025), que derruba um artigo da Portaria nº 689, de 2024, que exige a apresentação de licença ambiental prévia como condição para que projetos ferroviários autorizados possam ser considerados prioritários. Para alguns, a medida enfraquece a proteção ambiental. Como o senhor responde a essas críticas?

Nós temos uma forma simples de financiamento dessas obras, que é por debêntures. O que o governo coloca é que a ferrovia no modelo de concessão é priorizada e não exige a licença ambiental prévia. Então, não tem problema, você pode investir, comprar debênture, botar dinheiro e nem precisa sair a licença ambiental. Aí vem o modelo de autorização, onde para poder liberar tem que ter a licença ambiental já nas mãos. Isso é uma forma de atrapalhar.

Sabe qual é a média de tempo que o Ibama leva para dar essa licença ? A licença é dividida em três etapas: a prévia, a de instalação e a de operação. Leva 12 anos. Por isso, meu projeto de lei diz: "Assim como o modelo de concessão não precisa dessa exigência para receber investimento, a de autorização também não vai precisar". Mas não enfraquece absolutamente em nada essa questão da licença ambiental.

Tudo que você vai fazer tem que aplicar o princípio da sustentabilidade. Agora, a gente não pode fazer disso uma ferramenta para atrapalhar, inviabilizar. É o seguinte: se você não tiver um tempo curto para fazer, o investidor diz: "Isso aqui não dá, já vou para outra".

Ferrovia no Brasil acontece ou acontece, ou então o país vai continuar subdesenvolvido. Nós precisamos de logística eficiente, barata e sustentável. Quando eu falo de sustentabilidade, estou falando de meio ambiente. E a ferrovia dá de 40 a 0 no modelo rodoviário, que emite uma penca de gás carbônico, um caminhão atrás do outro queimando combustível fóssil.

Na última terça-feira (23), o presidente eleito Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, marcou o julgamento do processo envolvendo o projeto Ferrogrão, ferrovia que ligará o Pará ao Mato Grosso, para 1º de outubro. O julgamento estava suspenso desde 2023 após determinação do ministro Alexandre de Moraes, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), que envolve o projeto. Como o senhor avalia essa decisão do STF? Na sua opinião, o projeto tem sido tratado com a devida urgência, considerando seu impacto estratégico para o escoamento da produção agrícola do Norte e Centro-Oeste?

O Brasil tem a mesma extensão de ferrovias que possuía em 1922, de 29 mil km de trilhos. Ocorre que, desse total, apenas 7 mil km estão em plena operação. Os outros 13,5 mil km apresentam baixa densidade de tráfego e 8,5 mil km restantes se encontram em estado de subutilização e não possuem operação comercial. Enquanto isso, importantes empreendimentos, como a Ferrogrão estão parados. Desde março de 2021, a Ferrogrão está paralisada no STF em razão da ADI 6553. Isso mostra como estamos perdendo tempo nas decisões pela modernização da matriz de transportes e impacta diretamente na nossa competitividade e na elevação do Custo Brasil.

A construção da Ferrogrão enfrenta resistência por atravessar uma unidade de conservação ambiental. Como o senhor enxerga a possibilidade de conciliar o avanço da infraestrutura logística com a preservação ambiental na região amazônica?

Em agosto de 2025, o Ministério dos Transportes apresentou um novo traçado da Ferrogrão, que evita áreas de proteção ambiental e terras indígenas, como o Parque Nacional do Jamanxim. Isso, por si só, já demonstra o interesse do governo em evitar conflitos e garantir a construção dessa ferrovia que não é importante apenas para o Pará e Mato Grosso, mas para o Brasil. Há pouco mais de um mês da realização da COP 30, em Belém, a confirmação da obra seria um importante indicativo de que nós, brasileiros, estamos buscando uma matriz de transporte mais limpa.

A Ferrogrão diminuirá em até 77% o volume de CO² que hoje é gerado pelo transporte rodoviário. É, portanto, uma obra fundamental para sustentar o discurso da sustentabilidade. Além da questão ambiental, levantamentos feitos pelo setor produtivo apontam um potencial de economia do empreendimento, com a redução dos custos logísticos de transporte, podendo chegar a 35% nos municípios mais próximos aos terminais de embarque e cerca de 20% sobre o frete médio de grãos e farelos. Essa economia representaria, aproximadamente, R$ 8 bilhões para a economia local das regiões atendidas, considerando os valores atuais no processo de escoamento das produções.

Ainda sobre a Ferrogrão, a ANTT sinalizou a possibilidade de um leilão em 2026. O senhor acredita que esse projeto realmente sai do papel nesse prazo?

Antes tarde do que nunca. Nós estamos aí há 12 anos falando de Ferrogrão. Enquanto nós estamos falando de Ferrogrão, a ferrovia de 933 km, sabe quantos quilômetros de ferrovia o mundo já construiu? 34.000 km. Só isso. Ninguém consegue andar com um país que pensa desse jeito, não pode ser ser assim tão lento.
A Ferrogrão parou porque o pessoal acionado pelas ONGs entrou com uma ação. Aí o ministro supremo, que a gente pensa que é um cara grande que enxerga o Brasil, enxerga o mundo, tem compreensão que precisamos acelerar, acolhe uma ação. Qual é o ponto negativo do projeto da Ferrogrão? É zero. Lá é todo mundo é unanimidade. Quem é contra? As Ongs que são são pagas pelo capital externo para não deixar a infraestrutura do Brasil avançar. Por exemplo, o Instituto Socioambiental, gastou 11 milhões de reais mobilizando reuniões contra a Ferrogrão. Falo isso pela CPI das ONGs, que eu participei e apoiei. 

Aí vem lobby de outras empresas. O cara por escoar para outra região que não o Norte, como Paraná, Paranaguá ou Santos, é contra o escoamento pelo Arco Norte. Faz lobby, paga não sei o que para emperrar. Lamentavelmente, o Brasil não precisa de adversário, nós mesmo temos um adversário interno que atrapalha o crescimento da nação. E o ministro aceita isso? Eu não quero quero pensar que o ministro seja analfabeto, politicamente falando, ele não pode demonstrar falta de conhecimento do mundo em que ele vive.
Tá parecendo um pessoal do Ministério Público que não sabe nem como é que o dinheiro chega na conta quando vence o mês. Entra com ações, embarga, pá, pá. Para com isso. Brasil é maior do que picuinhas e ponto de vistas.

 

Como atual presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), o senhor destinou mais de R$ 737 milhões em emendas parlamentares, grande parte voltada para a agricultura. Como define os critérios para essa distribuição e quais os resultados mais concretos que já percebeu nos municípios beneficiados?

Naturalmente, somos apenas parlamentares e não temos a estrutura do governo para investir e medir impactos como no caso do do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), mas espero colaborar. Há grande demanda por máquinas agrícolas; enquanto bilhões vão à COP 30, parte disso aplicado em mecanização ajudaria muito mais, evitando queimar terra e permitindo reutilizar solo por décadas. As coisas são simples, mas a resposta não vem, e prefeitos pressionam por máquinas para estradas, escolas e produção.

Há também forte demanda por custeio de saúde, já que nossa saúde é precária e começa pelo saneamento, cada real investido nele economiza nove em saúde. O resultado é claro: Belém tem mais farmácias do que mercearias, refletindo vulnerabilidade. Tentamos aliviar com emendas, mas muitas vezes não dá para planejar, pois prefeitos chegam com situações críticas. O interior precisa de ajuda; em Anajás, no Marajó, vi a dificuldade até para ter água limpa. Nossa contribuição é colocar emendas para melhorar a qualidade de vida desse povo.

O  Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) estuda a criação de novas áreas de proteção ambiental no Pará e no Tocantins, sob críticas de produtores rurais. O senhor tem se posicionado contra a medida. Qual seria, na sua visão, a melhor forma de equilibrar preservação ambiental e desenvolvimento econômico nessas regiões?

Aí é que entra a famosa expressão: sustentabilidade. Quando você faz alguma coisa com sustentabilidade, tem que conciliar o meio ambiente, a questão social e a questão econômica. Quando não consigo conciliar esse tripé, aquilo que estou fazendo, por mais bonito que seja, não é sustentável.

Nós temos no Pará 46 novas reservas ou pretensões de reservas indígenas. Não temos mais floresta; agora é tudo sobre áreas produtivas: fazendas, agricultura familiar, assentamentos. Está cheio de gente trabalhando, comendo, vendendo o excedente, criando gado. Aí vem um treco desse, e o tripé da sustentabilidade se perde. Posso até prestigiar o meio ambiente, mas esqueço do social e do econômico. Vou arrancar o povo da área, empurrar para a periferia, mexer com a renda. O impacto social é grave: meninas podem cair no "mercado job”, meninos nas drogas. Uma fazenda não regenera, vira capoeirão. Multiplicando 400 famílias por 46 áreas, são mais de 20 mil famílias que teriam que ir para a rua. É uma loucura.

Esse é o impacto que estamos enfrentando, ensinando prefeituras, câmaras e sindicatos a se posicionar. Na criação de uma unidade dessas existe a etapa da contestação, mas quem avalia é a própria Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), que dificilmente aceita os argumentos. Por isso precisamos estar com a carta na manga: uma ação judicial. Quando termina o diálogo e não há solução, é Justiça. Isso gera uma insegurança jurídica enorme: o banco não financia, não se pode vender gado. É um inferno sem necessidade.

A Petrobras e o Ibama estão em fase de testes para exploração do petróleo na Margem Equatorial. Na última quarta (24), o Ibama aprovou os resultados da Avaliação Pré-Operacional (APO) conduzida pela Petrobras na Bacia da Foz do Amazonas. A autorização é a última etapa para que a estatal consiga a liberação para explorar petróleo na Margem Equatorial. O órgão já negou o pedido uma vez, mas a estatal pediu a reconsideração comprometendo-se com mais salvaguardas. Como conciliar o discurso de transição energética com a aposta em uma nova fronteira petrolífera?

A transição energética no Brasil não é novidade, somos pioneiros no etanol, produzido de cana-de-açúcar, milho e até batata-doce. O desafio é que reduzir emissões de gás carbônico é caro, e enquanto o petróleo fóssil tiver valor, ele pode gerar retorno financeiro para financiar essa mudança. Você é industrial e seu parque de máquinas foi comprado há algum tempo e são altamente emissoras de CO2. Do que você precisa? Financiamento a custo baratíssimo para substituir esse maquinário.

A agricultura familiar e de escala já estão altamente tecnificadas. O cara vai no banco, financia, vai lá fora do Brasil, aprende, ele quer ele quer se aperfeiçoar. Então quem é que não avança no Brasil e causa impacto negativo no meio ambiente? A agricultura familiar que é pobre, que produz pouco, ela precisa se tecnificar. E do que é que ela precisa? Financiamento.

Levei várias propostas ao ministro da Agricultura Familiar, que abraçou quase todas. Expliquei: "um carro de luxo é mais barato que um trator agrícola". A solução é clara: tirar a carga tributária de máquinas agrícolas. O ministro informou que levará um projeto de lei para a Casa Civil visando essa isenção para a agricultura familiar. Já é um gesto interessante, porque assim a gente consegue ver alguma demonstração prática rumo a uma transição energética real.

O senhor é pré-candidato na disputa para se reeleger no Senado Federal nas eleições de 2026, e manter o cargo que assume desde 2019. Que balanço faz do seu mandato até agora e quais pautas pretende priorizar em um novo período?

Estamos no mandato aprendendo e fortalecendo nossa atuação. Quero seguir focando no agro, que é futuro de emprego, renda e qualidade de vida. O Pará não precisa derrubar árvores para produzir, mas a regularização fundiária é um entrave, e como presidente da Comissão de Agricultura vamos votar emendas para avançar nisso. Vejo o Pará real e não maquiado, com falta de saúde, saneamento e estradas, especialmente no interior. Minha expectativa é ajudar o estado com um plano sério e governador parceiro, fazendo um mandato melhor. Para 2026, espero uma disputa com bons candidatos e sigo me preparando com intensidade.

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