Pequenos negócios conquistam espaço entre exportadores do Pará

Eles já representam quase 44% das empresas do estado com atuação global, mas seguem com menos de 1% da receita e esbarram em gargalos logísticos e tarifários

George Miranda | Especial para O Liberal
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A cada contêiner que deixa o Pará rumo a outros países e continentes, uma parte da biodiversidade amazônica também cruza fronteiras. Produtos do estado estão cada vez mais presentes no comércio internacional, acompanhando uma tendência que se fortaleceu no Brasil: o número de pequenos negócios exportadores mais que dobrou em dez anos, passando de 5,4 mil em 2014 para 11,4 mil em 2024, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), ligada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).

De acordo com levantamento do Sebrae/PA, 177 pequenos empreendimentos paraenses — entre microempreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte — realizaram exportações em 2024, representando 43,6% do total de negócios do estado que vendem para o exterior (406). Em valores, a participação ainda é tímida, alcançando apenas 0,88% dos recursos gerados nessas transações, mas o protagonismo desses negócios vem crescendo à medida que produtos como açaí, cacau, óleos essenciais e castanha-do-pará conquistam espaço em mercados cada vez mais exigentes.

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O analista técnico do Sebrae/PA Roberto Bellucci destaca que os destinos das exportações paraenses seguem alinhados ao cenário nacional. “Os Estados Unidos e a Europa são os principais compradores, mas a Ásia tem demonstrado crescente interesse nos produtos amazônicos. A demanda global por alimentos saudáveis, sustentáveis e orgânicos é uma oportunidade para pequenos negócios da região amazônica”, garante.

 

Desafios

Mas nem tudo são flores nesse processo. Entre os principais gargalos enfrentados pelos empreendedores estão os custos logísticos, a burocracia aduaneira e a necessidade de certificações internacionais. Outro peso atualmente para os exportadores é o tarifaço de 50% imposto pelo presidente americano Donald Trump às exportações brasileiras. A medida afeta diretamente alguns produtos da bioeconomia amazônica, como castanha-do-pará sem casca, açaí congelado, cacau em grão, pó ou derivados e guaraná em pó ou extrato. 

Já itens como a castanha com casca, polpa de laranja e minério de ferro ficaram isentos da taxação extra. “O impacto existe, mas produtos amazônicos de maior valor agregado devem manter espaço no mercado norte-americano graças ao apelo sustentável e às certificações diferenciadas”, aposta Roberto Bellucci.

 

De geração para geração

Especializada no beneficiamento e comercialização de castanhas-do-pará, a trajetória de uma empresa fundada na década de 1960 mostra como tradição e inovação podem caminhar lado a lado na bioeconomia.

“Meu avô começou beneficiando castanhas em Marabá. Por quase 40 anos, vivemos praticamente da exportação. Nos anos 2000, o mercado externo foi tomado por concorrentes bolivianos, e focamos nos clientes nacionais. Mas, em 2018, decidimos retomar as exportações e reconectar antigos clientes”, relembra Victoria Mutran, doutora em Engenharia de Produção e diretora de vendas internacionais do negócio.

Com investimentos em uma nova usina de processamento e participação em feiras internacionais, a marca paraense reconquistou espaço no comércio exterior. Hoje, cerca de metade da produção segue para outros países. “Exportar demanda estar sempre atualizado em certificações, qualidade e exigências sociais e ambientais. É um mercado desafiador, mas que fortalece toda a cadeia de extrativistas que dependem da castanha para sobreviver”, explica Victoria.

Sediada em Belém, a empresa gera cerca de 200 empregos diretos durante a safra da castanha e movimenta a renda de milhares de famílias de coletores espalhados pela Amazônia. “Apesar da queda de quase 70% na safra de 2024, devido às secas extremas na região, seguimos investindo para melhorar o aproveitamento e ampliar o alcance internacional da castanha brasileira”, completa a empreendedora.

 

Cachaça que atravessa fronteiras

Se a tradição da castanha abre caminho para mercados consolidados, bebidas artesanais como a cachaça também buscam espaço além das fronteiras. Um exemplo vem de Altamira, no sudoeste do Pará, onde um empreendimento familiar retomou a produção em 2018 com foco na exportação. “Exportar é o mercado mais exigente, mas também onde mais valorizam os produtos da Amazônia”, enfatiza o empreendedor Renato Frossard.

O nome da bebida homenageia o Rio Xingu e reforça a ligação com a riqueza natural da região. Para alcançar o mercado internacional, o produtor buscou apoio do Sebrae, onde conseguiu preparar a empresa para atender às exigências de certificações. “Quem quer exportar tem que fazer qualidade. Sem qualidade, ninguém se interessa pelo seu produto”, reforça.

Na avaliação de Frossard, reduzir custos logísticos e tornar a mercadoria competitiva são desafios constantes. Por isso, ele recomenda formar parcerias com outros empreendimentos para dividir despesas com frete e participação em feiras internacionais. Além disso, pontua que aumentar o volume de produção ajuda a baratear o custo por container, tornando a cachaça mais acessível e rentável no mercado externo.

“O boca a boca é fundamental. Primeiro, a pessoa precisa experimentar para valorizar o produto. É assim que conquistamos clientes no exterior”, acrescenta o empresário.

 

Apoio à internacionalização

Atenta às oportunidades fora do Brasil, a Federação das Indústrias do Pará (Fiepa) criou o Centro Internacional de Negócios (CIN), que funciona como um braço estratégico para apoiar empresas no processo de internacionalização. A iniciativa oferece assessoria especializada para negócios que já exportam e também para aqueles que desejam ingressar no comércio exterior. 

Segundo a gerente do CIN, Cassandra Lobato, o Pará vive um momento favorável para ampliar sua inserção no comércio global, apesar dos desafios logísticos, econômicos e políticos que se apresentam. “As perspectivas são muito positivas. Temos empresas cada vez mais preparadas para atuar globalmente, apoiadas por capacitação, inteligência de mercado e participação em rodadas de negócios internacionais. A diversidade da nossa pauta exportadora, que inclui alimentos, bioeconomia, madeira e mineração, fortalece a competitividade e abre novas oportunidades”, avalia.

 

Oportunidades

Roberto Bellucci reforça que a internacionalização é estratégica para os pequenos negócios da região. “É uma oportunidade de agregar valor, fortalecer a floresta em pé e diversificar mercados. Projetos como o Programa de Qualificação para Exportação, o PEIEX, em parceria com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos, a ApexBrasil, estão preparando 150 pequenos empreendimentos para acessar o mercado internacional nos próximos anos”, afirma.

Para quem deseja internacionalizar o negócio, Cassandra Lobato lembra que há suporte disponível no Sistema Fiepa. “O CIN oferece capacitação, inteligência de mercado e mentoria para empresas que querem dar esse passo. Não é um processo simples, mas há caminhos estruturados para reduzir riscos e ampliar as chances de sucesso”, orienta.

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