O que os bebês reborn carregam Patrícia Caetano 29.05.25 17h00 Temos acompanhado o dilema da “adoção” dos bebês reborn por famosos e também muitos fora da mídia, mas às vezes, o que eles carregam no colo é mais do que um objeto. É uma história que ninguém vê. Os bebês reborn, com suas expressões serenas e detalhes quase reais, muitas vezes despertam curiosidade e até estranhamento em quem observa de fora. Mas eles também são um espelho sensível de algo mais profundo: a forma como canalizamos sentimentos que não conseguimos nomear, dores que não sabemos como elaborar, afetos que ficaram presos no tempo. Nem sempre é sobre o boneco. Muitas vezes, é sobre o que ele representa. Vivemos numa cultura que nos ensina desde cedo a "ser forte", a "seguir em frente", a "não chorar à toa". Mas o que fazemos com aquilo que não passa? Onde colocamos a saudade, a ausência, o amor que não encontrou destino? Em muitos casos, colocamos nos objetos. Não porque somos infantis ou iludidos. Mas porque precisamos de algo concreto para segurar, para cuidar, para simbolizar o que ficou invisível. O bebê reborn, assim como outros objetos afetivos, pode se tornar uma espécie de abrigo emocional. Um ponto de apoio simbólico onde o amor, o luto, a saudade ou a carência podem finalmente ter forma. Cuidar de um reborn pode ser o modo silencioso de uma mulher lidar com uma perda gestacional da qual ninguém mais fala. Pode ser o modo de uma senhora viúva resgatar memórias dos tempos em que o colo dela era ocupado por filhos e netos. Pode ser também o jeito que uma pessoa encontrou de experimentar o afeto sem o risco da rejeição. Não é loucura. É humanidade. E, talvez, seja uma das formas mais delicadas de continuar sentindo quando tudo ao redor nos ensina a endurecer. Em muitos momentos da vida, o que não conseguimos verbalizar nos adoece por dentro, o peso do não dito. As emoções reprimidas não desaparecem. Elas apenas se transformam em silêncios prolongados, em inquietações inexplicáveis, em tentativas de preencher vazios com qualquer coisa que ofereça sentido. Nem sempre estamos prontos para falar sobre o que nos falta. Mas os objetos, por mais inanimados que sejam, às vezes se tornam nossos tradutores silenciosos. O travesseiro da infância, a camiseta de quem partiu, a caixa guardada com papéis antigos, o bebê reborn no berço de um quarto solitário... Tudo isso fala. Mesmo quando a voz falha. Em vez de julgar quem carrega um reborn com cuidado e afeto, talvez devêssemos perguntar: o que há por trás desse gesto? Que dor está sendo acolhida ali? Que necessidade está encontrando um espaço possível para existir? O mundo precisa de mais escuta e menos pressa. De mais empatia e menos rótulos. Nem sempre o sofrimento se apresenta em palavras. Às vezes, ele se manifesta em formas que a lógica não entende, mas que o coração reconhece. E quem somos nós para dizer como o outro deve viver o próprio luto, o amor, a solidão ou o desejo de cuidado? Claro, o objetivo não é viver eternamente refugiado em um símbolo. Mas é preciso respeitar o tempo de cada um. Às vezes, o objeto é apenas uma ponte entre a dor e a cura. Um modo de passar pela travessia com um pouco mais de leveza. Algumas pessoas largarão o reborn quando se sentirem prontas para seguir. Outras continuarão cuidando dele como um ritual de afeto. E está tudo bem. Porque o mais importante não é o que se segura nas mãos, mas o que se reconhece no coração. Se há amor, há caminho. Se há cuidado, há esperança. Mesmo que venha em forma de um boneco, de uma lembrança, de uma memória que se recusa a ser esquecida. Às vezes, é nos detalhes mais silenciosos que encontramos as verdades mais profundas. E talvez o que julgamos ser "excesso de apego" seja, na verdade, uma tentativa bonita de continuar sentindo em um mundo que insiste em anestesiar. No fundo, o que está por trás da adoção de um bebê reborn é humano demais para ser simplificado. Trata-se de uma tentativa de dar forma ao afeto, ao desejo de cuidado, ao enfrentamento da dor e, em muitos casos, à busca por reconexão com um lado sensível que o mundo moderno insiste em sufocar. Em vez de perguntar “por que alguém adotaria um boneco?”, talvez devêssemos perguntar: “o que isso nos revela sobre as formas de amar, sofrer e cuidar que ainda tentamos compreender?” PATRICIA CAETANO patymops@gmail.com @patyccaetano @soupatriciacaetano Assine O Liberal e confira mais conteúdos e colunistas. 🗞 Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱 Palavras-chave colunas Inteligência emocional patrícia caetano COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA Patrícia Caetano . Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo! Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é. Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos. Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!