O que está por trás de nossas palavras Patrícia Caetano 08.07.25 17h00 Um episódio, uma bolsa, uma criança e um espelho da nossa sociedade. Nos últimos dias, a internet se inflamou com um episódio aparentemente simples, mas profundamente simbólico: a filha de Roberto Justus, uma criança, apareceu em uma foto com uma bolsa de aproximadamente R$ 14 mil. A imagem viralizou. E com ela, vieram enxurradas de comentários alguns curiosos, outros indignados, muitos inflamados. Palavras como “ostentação”, “absurdo”, “elitismo” e até “guilhotina” foram lançadas com força, como flechas. Mas será mesmo que estamos falando só de uma bolsa? Ou estamos falando, na verdade, de um país em conflito com a própria imagem? A palavra “guilhotina” não surgiu por acaso. Ela carrega o peso de séculos de revolta, de desigualdade, de um desejo coletivo por justiça. A bolsa virou símbolo. Não de moda ou luxo, mas de um abismo social que seguimos tentando ignorar. Não foi a criança o alvo. Foi o que ela, sem culpa ou escolha, passou a representar: privilégio, acesso, conforto e uma realidade que parece inacessível para a maioria. Mas é aqui que precisamos respirar fundo. Estamos falando de uma criança. E muitas das palavras ditas, postadas e viralizadas foram duras, violentas, desproporcionais. Existe uma diferença gigante entre criticar o sistema e atacar pessoas especialmente uma menina que apenas vive a vida que lhe foi dada. Dói, sim. Mas a dor precisa subir para os responsáveis, não descer para os inocentes. Por outro lado, vieram também os defensores: “é só uma bolsa”, “o dinheiro é da família”, “quem pode, pode”. Palavras como “liberdade”, “direito”, “mérito” foram repetidas com orgulho. Mas será que liberdade sem consciência social não se torna espetáculo? Qual é o limite entre o que é privado e o que se torna público, quando tudo vira conteúdo nas redes? A verdade é que não estamos discutindo uma bolsa de R$ 14 mil. Estamos tentando entender o lugar da infância num mundo em exposição extrema, o papel dos adultos diante das câmeras e a responsabilidade coletiva sobre o que escolhemos dizer e como. As palavras que usamos moldam o tom da sociedade que estamos construindo. Elas revelam mais do que pensamentos: revelam valores, feridas, frustrações, esperanças. Elas escancaram quem somos e o que ainda estamos aprendendo a lidar. As palavras são espelhos. Refletem o que sentimos, tememos, desejamos e até o que ainda não conseguimos nomear. Um “está tudo bem” pode esconder um pedido de ajuda. Um “não foi nada” pode significar um esforço enorme. Nossas palavras contam histórias invisíveis. Mas só escuta quem está presente. Por isso, é urgente olhar para o que está por trás do que dizemos. Minhas palavras acolhem ou ferem? Construo pontes ou muros? Falo para conectar ou para reagir? Por isso, nunca foi tão necessário parar e refletir: de onde vêm minhas palavras? Elas estão a serviço de quê? Do controle? Do medo? Do cuidado? Quando não temos consciência do que está por trás do que dizemos, acabamos presos a padrões repetitivos de comunicação que não constroem, só reagem. E reagir sem consciência é como acender um fósforo em um campo seco. A comunicação verdadeira começa dentro. O que você não elaborou, não consegue expressar de forma clara. E o que você não expressa de forma clara, o outro interpreta do seu jeito muitas vezes, de forma distorcida. O que você não elabora, você repete. O que você repete sem consciência, vira ruído. E ruído não transforma. Quando entendemos o que está por trás de nossas palavras, damos um passo para diálogos mais autênticos, relações mais saudáveis e uma sociedade mais empática. Em tempos de excesso de exposição e escassez de escuta, precisamos reaprender a falar e a sentir com mais responsabilidade. Cada vez que escolhemos uma palavra, estamos plantando algo na mente do outro, no ambiente ao nosso redor, dentro de nós mesmos. Algumas sementes florescem em forma de compreensão, cuidado, conexão. Outras, infelizmente, se tornam ervas daninhas de julgamento, ressentimento e separação. Palavras não desaparecem depois que são ditas ou escritas. Elas ecoam. Persistem. Moldam crenças, provocam reações, deixam marcas. Elas constroem ou destroem pontes entre as pessoas. E como todo plantio, elas voltam. Às vezes em forma de diálogo. Às vezes em forma de silêncio. Às vezes como afeto. Outras, como dor. Antes de julgar, postar ou ironizar, respire. Pare e reflita: o que minhas palavras estão construindo? Elas estão curando ou ferindo? Aproximando ou afastando? Servem ao meu ego ou à minha consciência? Porque, no fim, mais do que o que dizemos, é a intenção por trás das palavras que revela quem realmente somos. E a intenção verdadeira, aquela que transforma não nasce do orgulho, da pressa ou da raiva. Ela nasce do coração. Porque nossas palavras são sementes. E cada uma que lançamos ajuda a moldar o mundo à nossa volta. Que mundo você quer plantar hoje? Porque, no fim, mais do que o que dizemos, o que realmente nos define é a intenção que mora por trás. E essa, mora no coração. PATRICIA CAETANO patymops@gmail.com @patyccaetano @soupatriciacaetano Assine O Liberal e confira mais conteúdos e colunistas. 🗞 Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱 Palavras-chave Inteligência Emocional colunas patricia caetano COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA Patrícia Caetano . Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo! Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é. Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos. Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!