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Lena Cristina Barros Mouzinho

Trabalho como psicóloga, com pessoas, famílias, casais e grupos. Sou apaixonada por Educação Relacional e fiz disto meu sentido de vida. Todo meu exercício profissional é na busca de conexão humana, por meio do diálogo.

E esse medo de lidar com conflitos?

Lena Mouzinho

"Mas afinal, o que é uma estrela?
Estes pontos bonitos brilhando no céu, para os quais levantamos nossos olhos sonhadores, são antes de mais nada...conflito.
Conflito em estado puro.
Nas estrelas existe uma forte energia interna – uma fornalha incandescente – que clama por expansão.
Ao mesmo tempo a força gravitacional de sua massa, exerce um movimento contrário trabalhando em contenção.
Nessa luta de opostos, a estrela se equilibra, gera calor e brilha.
Algo assim:
Um fogo atômico incontrolável clama dentro dela: expandir, explodir!
Uma força incrível das bordas contém tudo sob controle e em equilíbrio dinâmico.
Esse equilíbrio entre os opostos é o que gera sua luz.
A realidade das estrelas é a metáfora de nossas existências.
Vidas permeadas por conflitos: caminhar e retroceder, expandir e retrair.
Desse equilíbrio dinâmico nasce nosso brilho."

Ana Augusta Rocha – Somos Terra – 2011 – Auana Editora

Conflito então é a tensão entre forças contrárias que pode acender luz, brilho e consciência.

Brota do convívio entre pessoas, sempre únicas que, mesmo que semelhantes, trazem em sua constituição culturas diversas e até contrárias e/ou, que metabolizaram uma mesma cultura de forma peculiar.  

Quando percepções diferentes encaram-se, colocando em risco a estratégia eleita por alguém para sua satisfação, o contato tende a tornar-se tenso.  Neste momento, comumente, pessoas tornam-se movidas por emoções mais intensas - medo, raiva, sofrimento, angústia , ansiedade, desamparo e impotência - que nada mais são do que clamores internos pela satisfação de suas necessidades (“aquilo-que-não-cessa”). 

É comum pessoas evitarem aproximar-se de outras para pouparem-se do enfrentamento entre suas percepções. Aprenderam a temer conflitos. Não sabem muito bem o que fazer quando surgem. 

Pena! Pois não há como evitá-los. Conflitos surgem naturalmente, já que fazem parte do ciclo vital que se desenvolve na relação entre polaridades. 

Tentativas de embotá-los são sempre infrutíferas: eles surpreendem, vindo à tona de outras formas. E é justo a repressão e conseqüente não superação, que vem promovendo escaladas para a violência. A agressividade, energia propulsora de realização humana ante desafios, em função da contenção, sem elaboração, explode em ações destrutivas. 

Assim, conflitos acumulados promovem lesões em nossas relações conosco, com os outros, com o mundo e com a vida.

É possível que tenhamos chegado a essa inabilidade em compor um novo colorido com diferentes visões, por termos rigidamente conotado conflito como algo negativo, destrutivo, que deve ser evitado, pois relacionamos diretamente com violência e com emoções com as quais não aprendemos a lidar. 

Já observaram como os dicionários se referem a conflito?  Luta, combate; guerra; desavença, discórdia; controvérsia; opor-se a outra pessoa ou grupo... Esta concepção prevê que conflitos resultam sempre em perdedores ou vitoriosos. E, nós também não aprendemos a lidar com perdas.

Desta forma temos nos desconectado de dimensões humanas importantes, desenvolvendo medo de nossa agressividade e da agressividade do outro, no lugar de aprender esta força à serviço da vida. E nos sentenciamos a nos distanciar dos belos tesouros que podemos obter na superação do desafio. 

Podemos nos dispor a aprender com esta força da natureza em nós e em Nós?

A auto-observação pode nos trazer informações importantes para que possamos avaliar qual tem sido nossa escolha pessoal mais comum quando em situações conflituosas. Comecemos então...

Escondendo sob o tapete?

Imaginamos que aqueles que nos parecem fazer das guerras cotidianas seu sentido de vida, são os principais responsáveis pelas tensões relacionais, não é? Será que é isso mesmo? Vejamos:  

Há pessoas que negam os conflitos, os ignoram e evitam reconhecer sua existência. Até se auto-elogiam: “eu sou da paz”. E veja, não estou me referindo aqui, a aquelas pessoas que sabiamente não se deixam desafiar por “pequenas brigas” desnecessárias.  Estou me referindo a quem faz comumente “vista grossa”, “cara de paisagem”, “se finge de morto” e segue, como se nada estivesse acontecendo, enquanto situações lesivas pulsam, muito vivas.

Importante compreender: esta atitude tende a fornecer fartas condições para que se produza um agravamento das tensões latentes. Tensão acumulada, numa hora ou outra, resulta em forte explosão e/ou implosão. 

Lembram da expressão “varrer o lixo para debaixo do tapete”? 

O “mau cheiro” exalado daquilo que está se deteriorando, mesmo que aparentemente oculto, denuncia o desconforto todos os dias e, quando menos se espera, o conteúdo transborda. 

Pessoas com esta tendência precisam se responsabilizar por sua contribuição para que, aqueles que costumam se auto-afirmar privilegiando a competição, percam ainda mais a noção da fronteira - que existe entre tudo o que vive - e tornem-se cada vez mais abusivos.

Acomodando enquanto for conveniente?

Há quem reconheça a existência do conflito mas opte por acomodar-se, “tolerando-o", sem se dar conta - ou se dando conta - da competição ativa em variados jogos camuflados. 

É comum nesses casos, a busca de reduzir a tensão, compartilhando  informações com outras pessoas, à guisa de desabafo. Ou é fofoca estratégica para ferir a imagem do outro?  Ou é busca de alianças contra? Outras armas usadas nestas situações? Sonegação de informações, indiferença (“não existes”), ironia... 

É possível que quem opte por acomodar-se a uma grande tensão como essa, tenha outras motivações mais profundas.  

Mantém-se por não acreditar-se capaz de dar respostas para o conflito? Por imaginar que o outro é incapaz?  Uma escolha que pode ser fruto da falta de percepção de que a superação do impasse é tarefa para ambos; que competências dialógicas se descobrem no exercício, de preferência com o apoio de alguém aliado a relação e não somente a uma das pessoas.  

Mantém-se por sentimento de incapacidade em lidar com as possíveis conseqüências de examinar o conflito? 

Uma das possibilidades de resultado é o rompimento do vínculo que ainda me traz ganhos de várias ordens? 

Há medo de romper com um “desconforto confortável”? “Ruim com ela, pior sem ela”? 

Se o rompimento ocorrer a vida exigirá novos movimentos, responsabilidade, autonomia e a dependência da outra pessoa ainda é aprazível? 

A acomodação também pode ser explicada pela espera ilusória da atenuação das hostilidades pelo distanciamento de quem vive no mesmo espaço: “o tempo e a distância resolvem sem que precisemos fazer nada”. Uma tática mantenedora e não resolutiva: verdadeiras muralhas de gelo se erguem, sendo rompidas eventualmente por explosões incendiárias...  por uma vida toda.

Há quem reconheça a existência do conflito e se esquive, até que “bata em retirada” sem nada dizer. Já escutaram falar em “Nós sequer brigávamos e de repente ele simplesmente virou as costas”?  

Conflito evitado é como um “cupim” invisível: devora a estrutura da casa, silenciosamente, até que a queda surpreenda, sem que ninguém aprenda.

Conflito que conecta

Oposição gera tensão sim, mas não necessariamente hostilidade ou violência.  Podemos escolher transitar juntos nestes momentos para obter mais lucidez e consciência. 

Há um provérbio iraniano que diz mais ou menos assim: a realidade é um infinito espelho que se quebrou e cada um de nós ficou apenas com um estilhaço. Como atribuir a minha percepção o status de “verdade absoluta”? Como acreditar que tenho a “razão”?

Ao reconhecermos a existência de um conflito nosso desafio é aprender a construir sínteses e produzir aprendizagens. 

Transforma-se conflito, cooperativamente, por meio de combinações que propiciem a satisfação das necessidades dos envolvidos. Da co-construção de sentidos comunicacionais  que nos facilitem compreensão, aprendendo com a percepção do outro que complementa a nossa e compondo novas percepções que aprofundam nossa consciência.  E por meio da redefinição de nossas “fronteiras”.  

Quando o conflito aponta e reconhecemos que estamos diante de outro humano, digno de respeito como eu, com quem desejo aprofundar conexão, o convite é para a redução do ritmo e respirar fundo em busca de serenidade.  E rever a tendência de querer ganhar do outro a qualquer custo. E mergulhar numa busca de compreender o que está acontecendo comigo, para me traduzir para o outro quando ele esteja em condições de me escutar. Com mais clareza do que está acontecendo em meu universo interior posso escutar a outra pessoa e aprender sobre ela, com mais serenidade.

Quanto mais atualizadas as conversas que ajudem a esclarecer sentimentos e necessidades mútuas, menos tensão. 

Intimidade é filha da autenticidade gentil e da transparência. E mãe da confiança e da entrega. Intimidade cresce ao se atualizar o enfrentamento dos conflitos no lugar de acumulá-los para viver a ilusão de uma pseudo-paz.       

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