Pandemia da corrupção

Quando o "coronavirus" parecia apenas uma ameaça ao mundo, e o governo federal destinava bilhões de reais para ações de combate à iminente possibilidade de massificação da doença, escrevi na edição de O LIBERAL do domingo, 3 de maio de 2020, artigo cujo título "Coronajato", a próxima atração" antecipava a onda de corrupção que se tornou rotina no país, cumprindo a trágica sina nacional e reafirmando o adágio segundo o qual "onde há dinheiro, há ladrão por perto". Em "Reflexões de uma quarentena", livro que escrevi durante o isolamento, abordei novamente essa nódoa moral brasileira, recorrendo à velha sabedoria de que "morre cavalo para bem do urubu".

Valem a pena ler de novo, trechos que publiquei: "Quando comecei a ouvir falar nas cifras bilionárias que estão sendo distribuídas pelo país, para as ações e procedimentos de combate à pandemia, veio logo a má fama dos brasileiros, particularmente os que exercem funções pelas quais os valores estarão transmitindo. Formulo imagem de gente nos municípios, estados e no país todo "lambendo os beiços" e esfregando as mãos, na perspectiva de subtrair algum em proveito próprio. Um dos exemplos dessa tendência à corrupção está na morte da antiga LBA-Legião Brasileira de Assistência, entidade criada pelo ditador Vargas e durante décadas atendeu a gestantes, parturientes e seus bebês".

Em outro texto daqueles tempos, escrevi que "Como a história mostra, que sempre haverá ladrão por perto de onde houver dinheiro, pronto para surrupiar, já existe a expectativa de que uma sucessão de operações análogas à "lava-jato" será a atração, após a superação da pandemia, apesar do governo haver procurado blindar os auxílios a trabalhadores, com créditos na conta de cada um, "carimbado" os valores destinados especificamente aos respectivos objetivos e implodido as intenções de governadores em manipularem livremente o socorro aos Estados. Grupos específicos ampliaram o acompanhamento da aplicação dos recursos liberados, que podem superar um trilhão de reais. É viver p´ra ver".

Vivemos para ver a anunciada pandemia da corrupção. Escrevi então."Relembrando os apóstolos Lucas e Marcos, o vulto das mobilizações humanas e a quantidade de dinheiro envolvido no combate ao coronavirus também remetem ao preceito bíblico de que "não há nada escondido que não venha a ser conhecido e nada oculto que não venha a ser revelado". Mal começaram as liberações dos bilhões para equipamentos, estruturas e auxílios, logo começaram a ressurgir as históricas denúncias de superfaturamentos, alguns casos em percentuais de 200 e 300 por cento, provocando as primeiras ações da Polícia Federal que, pelos antecedentes, serão as próximas atrações da pandemia".

Evidentemente, há muita gente e negócios em todo o mundo, fazendo fortuna honestamente, com a produção de itens destinados a procedimentos contra o vírus. O melhor exemplo dessa ocorrência é o filho de um criador de cavalos, o bilionário indiano Cyrus Poonawalla, fundador do "Instituto Serum", considerando o maior fabricante de vacinas no mundo. Em meio à pandemia que se abate sobre tudo e sobre todos, comprometendo negócios e repercutindo nas economias dos países, teve o seu patrimônio líquido dobrar de 8 para 16 bilhões de dólares somente ao longo deste ano de pandemia, a despeito do incêndio suspeito que sofreu. São, contudo, exceções que somente confirmam a regra.