Ditaduras sociais

Nestes tempos, em que o vocábulo "ditadura" assume inquietante frequencia, é de se refletir sobre as formas em que a sociedade é submetida a ações ditatoriais, violando direitos humanos e liberdades individuais, muitas corriqueiras nos contatos interpessoais. Referências a cor e a gênero, mesmo sem propósito ofensivo ou discriminatório, passaram a constituir riscos constrangedores, afetando costumes convencionais e hábitos verbais, espécie de "ditaduras sociais", deturpando os conceitos da "Declaração Universal dos Direitos Humanos", proclamada pela ONU em 1948 e incorporada aos textos constitucionais de países, como o Brasil.

Expressões e comentários antes normais, muitos até carinhosos e lisonjeiros, sem intenção de ofender, passaram ser julgados preconceituosos e criminais. Algumas pessoas e canais se viram acusadps e transformados em vítimas de diatribes de toda ordem, por destacarem detalhes de penteados e episódios diferenciados e de ocorrência incomum, naturalmente chamando a atenção, sem que isso pudesse ter a conotação de desrespeito e menosprezo. São situações inerentes a quaisquer práticas e modismos rotineiras do comportamento opções humanos, sem que se descarte, contudo, o  evidente oportunismo de que se revestem certas ocorrências.

Esse corpo estranho no contexto das relações humanas pela demagogia de uns e conveniências de outros, estabeleceu uma forma de ditadura carente de um "freio de arrumação", à moda da antiga república romana, quando alguém era designado para restabelecer a normalidade. A generalidade que o preconceito e o racismo adquiriram, está provocando agressividade de conseqüências imprevisíveis em certas ocorrências, repercutindo na indesejável divisão e discriminação entre os povos, com as características da mesma tirania política e social de que trataram Aristóteles, Platão e Maquiavel, ao analisarem os pesos e contra-freios de um convívio racional. 

Como em todos os regimes ditatoriais, o radicalismo nas questões consideradas raciais e preconceituosas, também assume conotação antidemocrática, desprovida da necessária participação popular na formulação das políticas e nos critérios a serem observados. Há, ainda, o acirramento dos ânimos, protagonizado pela exposição e análise dos fatos e de seus personagens de forma açodada, desprovida de avaliação adequada.  A exemplo do que ocorreu com profissionais da comunicação e veículos da mídia, há que serem sopesadas as razões e as emoções envolvidos nos fatos, para que referências inofensivas sejam recebidas e tratadas como deverão ser.

Todo cuidado deverá ser pouco, para que, sem pretender ofender nem infringir dispositivos legais, não se estimulem paranóias divisionistas, nem sofra acusações de preconceito de alguma natureza ou injuria racial. Assim, se evitará ser vítima de uma dessas "ditaduras sociais", mesmo quando em inocentes pedidos daquele doce que atende pelo nome de uma de nossas raças, ou cantando músicas famosas, com as quais David Nasser e Lamartine Babo reverenciaram a brejeirice das sinuosas porta-bandeiras e passos dos mestres-salas que brilham em nossos carnavais.