CONTINUE EM OLIBERAL.COM
X

Clubes de cinema e arte em geral tornam periferias visíveis, em Belém

Cine Club da Terra Firme possibilita manifestações culturais e artísticas em comunidades invisibilizadas

Natália Mello
fonte

“Juventude preta periférica: do extermínio ao protagonismo” é o nome dado ao projeto criado pela professora Lília Melo, de 46 anos, e, enquanto proposta, figura como uma frase homônima a um projeto futuro de realidade das comunidades periféricas de Belém. Desenvolvido na Escola Brigadeiro Fontenelle, na Terra Firme, em 2014, além da produção audiovisual, teatro e cinema, trazia a prática de dança inspirada no movimento hip-hop. Quatro anos depois, em 2018, como um desdobramento, fundou o coletivo Cine Club TF, onde atua enquanto coordenadora geral.

Sob a batuta do princípio do projeto criado em 2014, o Cine Club vem para potencializar a arte da juventude das periferias, e ainda reconhecer e valorizar os saberes ancestrais. Não restrito ao bairro da Terra Firme, a iniciativa hoje conta com o apoio das usinas da Paz, através de apoio da Secretaria de Cultura do Estado do Pará (Secult-PA) e Secretaria de Estado de Educação ( Seduc-Pa) em parceria com Fundação Cultural do Pará (FCP) e outras entidades, como o Ministério Público e empresas privadas. Lília afirma que o coletivo tem alcançado um público significativo nas periferias da região metropolitana, com ações híbridas (presenciais e virtuais), o que possibilita atuação mais ampla de jovens dentro e fora do Estado.

“Temos uma rede afetiva em diferentes estados do Brasil. Os produtos e processos de criatividade e construção de saraus/intervenções culturais são veicularas nas nossas plataformas virtuais. Logo, o fomento à arte e cultura é de constantes trocas de experiências. Nossos encontros são realizados por sete grupos de trabalho que atuam em expressões artísticas específicas. Não atuamos somente com as produções audiovisuais, embora ela seja o nosso grande carro chefe. O cinema nas periferias existe, é forte e resiste. Precisamos valorizar as produções cinematográficas das quebradas!”, reforça.

Lília foi mentora e coordenadora-geral, durante quatro anos, do Grupo de Ouro Nacional (GON), um coletivo criado em 2013 que dava suporte a pessoas que lutam contra o câncer. O trabalho envolvia a contação de histórias no hospital oncológico infantil em Belém, visitação em domicílio para idosos e encaminhamentos de consultas e remédios para pessoas de outras regiões do estado, além de doar perucas de cabelos naturais que eram confeccionadas em parceria com apoiados. Ela explica porquê atuar tão fortemente com a comunidade periférica.

“Infelizmente, historicamente, nossa história, a do nosso povo e de nossos territórios sempre nos foram contadas por terceiros, a partir de um olhar estrangeiro. Um olhar que nos invisibiliza, nos aprisiona e tenta nos tornar pequenos diante da grandiosidade de nossa diversidade. Quando nos apropriamos do que é nosso de direito e de fato, nos tornamos protagonista de nossa própria história. Quem aprende são os de fora. Tem que ser assim: uma troca constante. É necessário haver diálogo franco”, destaca.

A professora acredita nas relações humanas como horizontais e não mais verticais: de cima pra baixo ou de fora pra dentro. “Quando ocupamos os espaços de decisão e de poder, nossa autoestima cresce porque sabemos do valor da diversidade, dos saberes ancestrais e da potencialidade que tem nossa comunidade periférica. A pluralidade, a polifonia é nossa grande riqueza”, conclui.

Tela Firme

Diversas iniciativas alavancaram esse ocupar de espaços nos últimos anos de história da capital paraense. Morador da Terra Firme desde o nascimento, Francisco Batista, de 44 anos, conta que viveu na pele o “ser morador da periferia”. Em meio a um cenário de inquietação, por não aceitar a forma com que o bairro era tratado nos grandes meios de comunicação, em especial nos programas que ele classifica como "policialescos". “Esse lugar como terra que só tem ‘vagabundo’”, afirma.

Mas foi durante uma experiência vivenciada na África no período de 2010 a 2011 que pensou em criar uma iniciativa que estivesse em sintonia com o momento da era da informação. “E o yotube foi o meio que utilizamos para criar uma espécie de TV comunitária para divulgar as boas iniciativas que temos na Terra Firme. Assim surgiu a ideia de criar um coletivo de mídia comunitária que pudesse se contrapor às mídias comerciais, o Tela Firme”, lembra.

Envolvido desde a adolescência com movimentos locais, em especial na Terra Firme, Francisco fundou o projeto, que conta com uma estrutura horizontal, ou seja, quatro pessoas que compõem uma executiva, além de outras pessoas que contribuem com assessorias. Apesar de não existir vínculo com a iniciativa privada ou governamental, ele considera pontual a atividade da cartografia do programa estadual TerPaz, que consiste na articulação de políticas públicas de inclusão social que secretarias, fundações e órgãos da administração direta e indireta desenvolvem através de programas e projetos organizados em sete Eixos Temáticos.

“Não temos uma fonte de recurso, mas já fomos beneficiados com uma emenda parlamentar para executar o projeto “Nós Na Tela”. Esse projeto que produziu material audiovisual e a segunda cartografia social da TF, e coordenamos o projeto da Cartografia do TerPaz, realizando levantamento de diversas iniciativas existentes nos territórios onde  o TerPaz atua”, diz.

Para Francisco, os maiores feitos do Tela Firme foram as produções audiovisuais, em especial os vídeos das comemorações dos calouros e calouras aprovadas no vestibular de universidades públicas, e o minidocodrama "Poderia Ter Sido Você", que retratou diversas chacinas ocorridas na Grande Belém.

Sobre o protagonismo da periferia, o ativista considera que as formas de comunicação acontecem a partir da vivência da cada grupo, por isso tão necessário ter voz. “Nós tentamos estabelecer um diálogo com a comunidade a partir do que chamamos de espaço vivido, do dia a dia das pessoas. Temos a liberdade de não reproduzir uma linguagem que nos prenda, mas expressões usadas em nossas quebradas respeitando a identidade local”, finaliza.

Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Belém Pra Ver e Sentir
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!