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Para jamais esquecer

Lorena Filgueiras
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O Alzheimer é um mal extremamente cruel, porque além de roubar lembranças, debilita e incapacita idosos. Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer, há 36 milhões de casos no mundo. No Brasil, o diagnóstico ainda não chega a todos que apresentam os sintomas – por essa razão, é muito importante observar mudanças de comportamento e procurar um especialista.

Há alguns anos, quando a cantora Vanusa, em uma apresentação na Assembleia Legislativa de São Paulo, errou a letra do hino nacional, a internet não perdoou e a cantora virou meme quase que instantaneamente. À época, ela declarou, em entrevistas, que o motivo para o esquecimento havia sido um remédio para labirintite – cujo efeito provocou confusão mental. Um tempo depois, ela confessou que a repercussão do episódio causou-lhe depressão e que teve de ser clinicamente tratada.

Que o tribunal da internet é implacável, muitos sabem. O que poucos talvez tenham percebido, então, é que Vanusa poderia estar já apresentando os primeiros sinais de um mal irreversível: o Alzheimer. A confirmação, entretanto, chegou há pouco tempo, quando sua filha, Aretha, declarou que, após 3 anos de internação em uma clínica especializada, a cantora havia voltado para casa. Embora seja uma doença degenerativa e, até o momento, sem cura, Aretha a tirou de lá por medida preventiva ao coronavírus. “Ela permanece sob cuidados médicos”, declarou em entrevista a um veículo de TV há alguns dias.

Vanusa é um nome notório em meio aos milhares de casos diagnosticados que o Brasil registra anualmente. Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz), estima-se que existam no mundo cerca de 35,6 milhões de pessoas com a Doença de Alzheimer. No Brasil, há cerca de 1,2 milhão de casos, a maior parte deles ainda sem diagnóstico. A ABRAz é uma entidade envolvida com a doença de Alzheimer (DA) e tem como missão oferecer apoio aos familiares dos portadores, bem como produzir e difundir conteúdos e conhecimento sobre DA e outras demências.

Vontade de viver

A orientadora educacional Maria Sylvia Braga, 88, começou a apresentar uma discreta perda da memória recente no começo de 2014. “Nesse mesmo período, foi iniciada a medicação e cursos de memorização”, conta sua filha, a médica Thereza Christina Frade, 65, que é tutora da mãe.

O diagnóstico definitivo chegou seis meses depois do começo e a notícia abalou a família, em especial, Thereza Christina, que sabia exatamente o que a doença significa. Maria Sylvia tem 4 filhos. “Todos nós ficamos muito abalados no início, porém uns se emocionam mais intensamente que os outros. Tivemos momentos difíceis, de divergências entre nós, no sentido de definir o que seria o melhor para ela. Eu, em particular, pelo fato de ser médica e a curadora dela, me sinto às vezes angustiada, triste e deprimida diante da impossibilidade em dar solução a este problema”, desabafa Thereza Christina.

A rede de apoio da ABRAz foi fundamental a uma melhor compreensão da doença, afinal, ela não afeta somente o idoso. “As reuniões me fizeram ver que não estou só, que tenho com quem dividir meus medos e tristezas. Sou outra pessoa depois que passei a frequentar as reuniões. Tenho aceitado melhor as dificuldades”, afirma. 

Embora o estado de saúde de Maria Sylvia seja o melhor, há desafios, especialmente no que diz respeito a aceitar outras pessoas ajudando, delegar poderes para que os filhos possam tratar dos assuntos pessoais dela ou aceitar que precisa morar em Belém, de modo a intensificar o convívio com a família e amigos – a aposentada mora em um sítio (embora vá para a casa da filha aos domingos, retornando para o sítio às terças-feiras), onde também mora um filho. Lá, duas cuidadoras se revezam nos seus cuidados. 

“No momento, ela está bem da saúde física, porém perdendo gradativamente a memória recente, a noção do tempo e do espaço. Tem confundido também o nome dos netos e bisnetos, principalmente os que moram fora de Belém e [que] convivem pouco com ela”, relata. “É uma pessoa feliz, adora viver e, por isso, acho que ela está muito bem. Dorme bem, come e se veste sozinha, apenas com a nossa supervisão”, complementa. E tem mais: Maria Sylvia conversa bem com todos, adora contar histórias de sua infância, cantar, jogar baralho e dominó.

“A vida mudou completamente”

É como a pedagoga Elayne Wanzeler Garcia, 42, define o momento em que recebeu o diagnóstico sobre a condição pai, o militar da reserva Orlando Garcia, 72, após um ano de investigação. 

“Os primeiros sintomas que conseguimos perceber foi por volta de julho de 2016. Ele apresentava irritabilidade, sinais de agressividade, dificuldades de raciocínio, falta de iniciativa, motivação, alteração no apetite, falta de interesse por atividades e hobbies, além da perda significativa de memória, especialmente a memória recente”, enumera Elayne.

A Primeira consulta com o geriatra ocorreu somente dois anos depois de notarem as primeiras mudanças, em abril do ano 2018, após muita resistência de Orlando. “Levou um ano de investigação, entre exames laboratoriais, ressonância do crânio, e principalmente o relato da família. O laudo com o diagnóstico da doença de Alzheimer foi entregue à família após um ano de investigações. Ficamos muito tristes, confusas, nervosas e desmotivadas. Precisávamos conhecer a doença e saber lidar com tudo o que estávamos recebendo com aquela notícia. A partir daquela data, nossa vida mudou completamente”, afirma.

Sendo a caçula de 3 irmãos, sendo que dois não moram em Belém, coube à Elayne e à mãe – também idosa – os cuidados com Seu Orlando. “Nós duas ficamos muito sobrecarregadas. Realizamos todas as demandas da casa, consultas, hospitais, atividades que ele precisa realizar para que a doença não avance tão rapidamente”. Em função de todas as limitações, ainda não foi possível implementar as adaptações na casa em que o pai e mãe moram. “Meu pai não consegue fazer atividades mais complexas e aquelas realizadas fora do cotidiano do lar, como ir ao banco, supermercado, andar na vizinhança. Ter que resolver todas as tarefas externas e internas da residência e da vida, tanto nossa quanto as dele, pois ele já não consegue administrar a própria vida. Estamos sobrecarregadas, mas fazendo tudo o que podemos para que meu pai tenha qualidade de vida e possa viver por mais anos conosco, com dignidade. Sabemos que essa doença é neurodegenerativa, irreversível e, até o momento, incurável. Apesar do tratamento, haverá progressão da doença”. Ainda assim, ressalta, o pai consegue lidar com tarefas básicas da vida diária, como higiene pessoal e autocuidado. “Hoje me sinto incapaz, pois sabemos que tudo o que fizermos não vai trazer a saúde e memória do meu pai de volta”.

Quando procurar ajuda?

Talvez essa seja a pergunta que a geriatra Marina Borges, 36, mais ouviu ao longo de uma década de prática médica. “Na realidade, não há uma regra. A partir dos 60 anos, é importante ter uma avaliação geriátrica, mas nós estamos falando da especialidade que trata do envelhecimento humano, então, se você já se preocupa em ter um envelhecimento bem-sucedido, pode procurar um geriatra a partir dos 40-50 anos”.

Para a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, o geriatra é o médico da complexidade, então quanto maior o número de doenças, a quantidade de medicações que toma, maior também é a necessidade de ter um geriatra para orquestrar tal situação, continua a médica. “Envelhecer bem não é envelhecer sem doença, mas envelhecer tendo as nossas doenças bem controladas, lúcido, autônomo e independente. Um dos nossos maiores medos é envelhecer dependente dos outros”, continua.

“O esquecimento é uma das principais queixas em um consultório de geriatria”, revela. Muitos já procuram um geriatra precocemente para orientações de prevenção. A idade é um dos principais fatores de risco para demência e com o envelhecimento da população, nós estamos vivendo um aumento da prevalência da doença de Alzheimer. Mas não é qualquer esquecimento que deve trazer preocupação. “Esquecer e depois lembrar pode ser somente um lapso de memória, que é, inclusive, um marcador de envelhecimento. Na doença de Alzheimer, observamos, principalmente, alteração de memória recente com prejuízo de funcionalidade. É o idoso que lembra de situações de 20-30 anos atrás, mas não lembra da visita que recebeu ontem, o que comeu no almoço, se já tomou o remédio. Coisas que antes fazia sozinho, como cuidar das contas, tomar medicação, cozinhar, já não consegue fazer por alteração cognitiva. Está mais repetitivo, pergunta várias vezes a mesma coisa e não se percebe esquecido – mas quem convive próximo a ele, percebe”.

Alterações de memória recente, que trazem prejuízo no dia a dia do paciente, devem ser investigadas. “Deve ser encaminhado ao especialista que pode ser o geriatra, o neurologista ou psiquiatra. Devemos fazer avaliação cognitiva, laboratorial e de imagem para investigação desse quadro e não simplesmente considerar ‘normal da idade’”, finaliza.

Para conhecer mais:

O Alzheimer é um mal extremamente cruel, porque além de roubar lembranças, debilita e incapacita idosos. Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer, há 36 milhões de casos no mundo. No Brasil, o diagnóstico ainda não chega a todos que apresentam os sintomas – por essa razão, é muito importante observar mudanças de comportamento e procurar um especialista.

Para conhecer mais:

www.abraz.org.br

@abrazalzheimer

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