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Os carecas se gostam mais!

Lorena Filgueiras

A alopecia androgenética em homens, conhecida como calvície masculina, é um processo determinado geneticamente, ou seja, hereditário e habitualmente impacta fortemente nos indivíduos. Muitos, aliás, depois do susto inicial, passam a aceitar a condição e até consideram um diferencial, quando o assunto é autoimagem. 

Ainda pequenino, o professor de inglês Cezar Souza, 28, sempre teve uma certeza: a de que seria calvo, porque seu pai também era. Quando começou a perder cabelo, na adolescência, ele não percebeu. “Sempre tive cabelo bem curto, quase zero, desde criança. Meu pai sempre cortou assim e eu criei esse hábito também”, conta. Somente aos 20 anos de idade, quando a calvície ficou mais aparente, foi que Cezar decidiu procurar médicos, mas já era tarde. “Cheguei a tomar vários remédios e loções capilares pra diminuir a queda, mas nada muito satisfatório, então parei de usar”, diz. Depois de muito dinheiro e tempo investidos com procedimentos, decidiu assumir a nova aparência. “O cabelo foi ficando ralo, comecei a ter ‘entradinhas’ mais visíveis e fui cortando cada vez mais curto até raspar completamente, agora, durante a quarentena. Tentei trabalhar minha imagem antes de ficar paranoico com isso e acho mesmo que ajudou muito no processo”, revela nosso entrevistado.

image Cezar Souza (Acervo Pessoal)

A decisão de parar de tentar reverter o quadro ocorreu há mais ou menos 5 anos, temendo os efeitos colaterais do uso dos remédios a longo prazo – e não foi nada fácil, mas, mesmo assim, ele decidiu aceitar a nova aparência. “Foi um momento delicado pra mim, sempre fui muito vaidoso e gosto de me cuidar, então parar de tratar a calvície pareceu, na época, um ato de negligência. Mas nada que um tempo me descobrindo, amadurecendo e me aceitando, não mudasse o jogo. O que me ajudou bastante foi assistir séries e filmes com protagonistas negros e carecas e ver como posso continuar bonito, independentemente de ter cabelo ou não. O meu padrão de beleza exigiu muita pesquisa, porque infelizmente não é comum eu ver pessoas como eu por aí em outdoors, filmes e TV. Boris Kodjoe e Damon Wayans foram inspirações pra mim”, complementa.

Quando pergunto se, ao se olhar no espelho, ele gosta do que vê, Cezar é enfático: “hoje sim!”. “Eu me acho muito mais bonito agora do que na época que tinha cabelo, sem comparação. Pra mim beleza vem de dentro e nada como um grande sorriso de alguém que se ama pra verem isso. É isso, inclusive, que deixa uma conversa interessante ou torna alguém atraente: o que vem de dentro delas”.

Uma vez resolvida a questão da aparência, Cezar não abre mãos dos cuidados imprescindíveis à área que, sem fios, fica bem vulnerável. Para tais, bonés são aliados na hora de sair ou fazer uma atividade física ao lar livre. “Botar a cara no sol, só com boné e filtro solar”, finaliza entre risos.

Relação também iniciada na infância

Assim o funcionário público e bacharel em Direito Caio Alexandre Sousa, 24 anos, define a convivência com a calvície, que começou a dar o ar da graça quando ele tinha apenas 12 anos. Embora o cabelo fosse farto e volumoso, as entradas na testa e uma falha no centro da cabeça, já acusavam que a calvície seria sua companheira em breve. “Os fatores genéticos também foram determinantes. Acabei herdando do meu avô paterno e do materno. Mas sinto que o que mais agravou e acelerou esse processo foram os fatores stress e ansiedade; a transição da adolescência para a vida adulta, a faculdade e as responsabilidades da vida, que vêm de uma forma muito forte”, mas ele admite que os hábitos de consumo também podem ter influenciado a aceleração do quadro. “Vale falar também das noites de rolê, o consumo de álcool, má alimentação, sedentarismo... um combo de agravantes”. A queda, que até então era gradual, foi ficando mais rápida. 

Os abalos emocionais vieram também na infância, em função dos comentários maldosos dos coleguinhas. “Continuo ouvindo. A diferença é que hoje procuro lidar de outras formas”.

Se ele cogitou tratamentos especializados ou medicamentos? Não. “Em 2017, com os últimos semestres do curso e a necessidade de fechar ciclos emocionais, acabei precisando fazer mudanças internas e senti que eu tinha mudar externamente também. O meu cabelo ainda dava pra se manter grande, com o topete que eu usava, mas eu decidi cortar no nº 3 da máquina. Foi uma mudança bem drástica, mas necessária naquele momento. A mesma necessidade, de mudança externa, para acompanhar mudanças internas ressurgiu este ano. Mais uma vez precisei fechar ciclos e, desta vez, eu precisava realmente mudar e sentir isso de todas as formas. Foi muito intuitivo e não pensei muito: peguei a máquina de aparar pelos, que eu já tinha em casa, fui pra frente do espelho e só fiz o que eu teria que fazer em questão pouco tempo”.

Atualmente, mesmo bem resolvido em relação ao look, Caio admite que o bullying mexeu muito com seu emocional. “Espero piamente que essa geração esteja mais responsável e que as próximas sigam progredindo no combate dessa mazela social. Ninguém merece levar uma vida toda se resgatando por conta da opinião irrelevante e irresponsável de terceiros”, desabafa.

Assim tem sido sua trajetória em busca de si, em uma nova “embalagem”: encarar processos, curar traumas e se acolher, como ele define. “Consegui gostar em totalidade do meu reflexo assim que raspei a cabeça. E cada dia tem sido uma nova etapa, de autoaceitação e respeito comigo mesmo, com meu corpo, do jeito que ele é. Não que eu não possa mudar algo com o passar do tempo, mas é que hoje eu me sinto confortável aqui dentro”. Ah, o filtro solar, desde então, tem sido seu companheiro inseparável.

Quedas superiores a cem fios?

A médica dermatologista Mada Regiane Lima de Carvalho Monteiro, 36, vê muitas semelhanças nos relatos de Cezar e Caio, que sabiam, desde a infância, que seriam calvos. “Apesar de se iniciar em indivíduo ainda bem jovem, a calvície geralmente acaba sendo aparente tardiamente, quando a redução da densidade dos fios é significativa”, inicia. Há que se prestar atenção, entretanto e igualmente importante ter em mente que uma queda, entre 30 e 60 fios de cabelo ao dia, é aceitável. Mais que isso, o quadro passa a ser preocupante e é indicado consultar um médico. “Como nesse tipo de alopecia a queda é lenta, apesar de contínua, a queixa de rarefação é mais importante do que a própria queda de cabelo. Nesse caso, percebe-se que os cabelos ficam mais ralos, com o couro cabeludo mais aparente, principalmente na área da coroa e na região frontal, as chamadas ‘entradas’”, explica.

O/A profissional da área médica investigará as causas da queda excessiva, mas Mada Monteiro adianta que não há cura para a calvície. “As diversas opções de tratamento existentes visam retardar o processo de queda e recuperar parte da perda capilar. Para os casos mais extensos, o transplante capilar pode melhorar o aspecto estético”.

O diagnóstico é sugerido clinicamente pelo padrão da queda, tempo de evolução e a presença de história familiar positiva. “Contribuem para o diagnóstico as avaliações, através do teste de tração, dermatoscopia e tricograma. Em casos de dúvida, a biópsia com anatomopatológico pode ser necessária. Exames laboratoriais, apesar de nem sempre serem necessários na calvície masculina, podem contribuir para diferenciar de outras causas. Também contribuem para essa diferenciação a presença de sintomas locais, uso de medicamentos, estresse e maus hábitos alimentares”.

Aos que já se conformaram e/ou gostam/assumiram o look zero fios, a médica alerta que não se deve descuidar dos cuidados e o principal deles é bloquear, ao máximo, a ação do sol. “Sem a proteção realizada através da barreira física que os fios exercem sobre o couro cabeludo, essa área acaba recebendo ação direta da radiação solar, predispondo a danos solares na pele, incluindo o câncer de pele. Por isso, é extremamente importante o emprego de medidas de bloqueio físico, como o uso de chapéus ou bonés durante a exposição solar. Na impossibilidade, recomenda-se o uso de filtro solar”.

A melhor escolha, sem dúvida

É o que pensa o analista de sistema Claudemir Sartori, 28, quando o assunto é assumir a calvície. A perda de cabelo começou na adolescência, por volta dos 16 anos. “Eu gostava muito de usar boné na época, o que contribuiu pra aumentar a queda. Daí em diante, foi ladeira abaixo, até porque era para eu ter iniciado o tratamento logo quando percebi o problema, mas fui adiando e as entradas ficaram bem aparentes, aí quando resolvi aderir ao tratamento, não tinha como reverter o quadro. Meu pai é calvo e alguns tios também”, relata. 

Ao perceber que estava com queda excessiva, Claudemir chegou a consultar médicos e fez uso de loções capilares, vitaminas e até se submeteu ao “famoso tratamento com finasterida” – entretanto, em relação ao último recurso, preferiu abandonar por temer os efeitos colaterais. Há dois meses, ou seja, durante a pandemia, ele decidiu adotar o estilo, por pura praticidade. “Não gosto muito do fato de pensar que, todo o tempo, eu vou ter que preocupar como o tratamento e também porque combinou com o meu rosto”.

Se mexeu com a autoestima dele? Sim, naturalmente, mas ele tentou lidar da melhor maneira possível. “Por mais clichê que pareça, a gente tem que aprender a se amar do jeito que somos, não tem receita de bolo para isso: é se cuidar e tentar adequar um estilo compatível com suas capacidades, para não se frustrar. Me amo demais, e adorei o estilo calvo! Acho que foi uma das melhores escolhas que fiz”, admite.

Para conhecer mais:
@jadeuprasemtir

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