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Filhos do futuro

Lorena Filgueiras

Eles nasceram (e nascerão) num mundo completamente diferente daquele vivido e imaginado por seus pais: sem comemorações coletivas, sem visitas, sem poder passar muito tempo com as mães e tendo seus primeiros dias acompanhados a distância. Em função das restritivas medidas e protocolos sanitários impostos pela pandemia, todo cuidado é pouco quando se trata de proteger os bebês. Para as mães, o alívio e a felicidade por sabê-los bem e saudáveis... ah, esses permanecem os mesmos. 

Giovana, filha da assistente social Juliana Dias da Silva, 34, deve nascer nesta segunda-feira (se não decidir antecipar para este domingo, de modo a fazer coincidir sua chegada com a circulação da matéria que fala sobre ela e sua mãe). Mãe de dois meninos gêmeos, de pouco mais de 3 anos, Juliana conta que foi uma surpresa saber-se grávida novamente. “Tivemos muita dificuldade pra engravidar na primeira vez e não imaginávamos ter outro bebê. A princípio, ficamos preocupados pelos cuidados com os gêmeos, se daríamos conta de mais um bebê e das despesas. Com certeza não foi planejado, mas foi bem recebido!”. 

image Juliana Dias da Silva (Acervo Pessoal)

Quando estava entrando no último trimestre da gravidez, surgiu a Covid-19, doença que colocou o mundo em estado de alerta – até porque a última vez em que a humanidade testemunhou uma pandemia foi há cem anos. Neste estado, que inspira mais atenção, a preocupação de assistente social foi com a saúde dos seus. O nascimento da criança, habitualmente cercado de expectativas, trouxe também uma certa frustração pela impossibilidade de dividir a felicidade, ao vivo, com todos. “Quando foi decretada a pandemia, ficamos muito tristes pela falta de contato com a família, que é a nossa maior rede de apoio e quem nos ajudará com a chegada da Giovana. Nossa médica tem sido maravilhosa, mas a cada consulta ficamos apreensivos em ter que sair de casa e de ter contato com outras pessoas. Estamos tomando todos os cuidados necessários”, desabafa.

Inicialmente, há quase dois meses, as grávidas não eram consideradas pacientes do grupo de risco, em função dos dados epidemiológicos. “No entanto, a gente precisa observar as mudanças que ocorrem no corpo de uma grávida: a fisiologia, a forma como o corpo funciona, nesta condição, é diferente. Há um consumo maior de oxigênio e essa doença afeta o pulmão, interferindo nas trocas de oxigênio no corpo”, conforme explica a médica Marília Gabriela da Luz, ginecologista obstetra e gerente da maternidade da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará, para a explicar a alteração dos protocolos relacionados à segurança das gestantes neste período tão delicado.

O cuidado foi percebido por Juliana. “Assim que a pandemia foi decretada, seguimos o pré-natal normalmente, mas logo fui afastada do trabalho, já que trabalho na área da saúde, mas estou acompanhando tudo pelos grupos de WhatsApp, reportagens e conversando com colegas que estão na linha de frente”. 

Se ter um bebê não estava nos planos, avaliem viver a chegada de uma nova integrante da casa, em meio a uma crise mundial de saúde. “Estamos felizes. A bebê está bem, sadia, estamos todos bem e juntos. Entre tantas notícias ruins, de conhecidos que perderam parentes, estar vivo e com saúde é motivo de muita gratidão. Neste momento vamos contar com ajuda das avós Joana e Lúcia, pessoas incríveis e nossos braços direitos. O restante da família (tios e primos) e amigos vão conhecer a bebê somente por fotos até tudo isso passar”, planeja.

Sobre o futuro, Juliana não esconde um pouco da preocupação, mas encontra forças no amor. “Gostaria, do fundo do coração, que as pessoas fossem mais humanas e preocupadas com o bem estar e a vida umas das outras. É o que procuramos ensinar aos nossos filhos! Nos aproximamos mais de Deus e, com essa situação da pandemia, passamos a dar mais valor ainda a todos que amamos. Se pudesse dizer algo pra minha filha, diria que tudo ficará bem, que vamos protegê-la e que a amamos mais que tudo”.

A fisioterapeuta Ana Paula Costa, 29 anos, está com 23 semanas de gestação. Maria Júlia deve chegar no final de agosto. “Foi uma surpresa [descobrir a gravidez], porém recebemos a notícia com muita alegria! Não foi planejado, mas já pensávamos em ter outro filho”, conta.

Com esse susto no meio do caminho, o acompanhamento médico fez toda a diferença. “Faço acompanhamento mensal, procuro realizar todos os exames solicitados pela minha médica no período certo. Já é a segunda gestação minha que ela acompanha. Agora, num momento diferente, a atenção e cuidados estão sendo dobrados. Ela me orientou, caso no meu ambiente de trabalho eu ficasse em exposição, que o ideal era que eu me afastasse. Se fosse exposição mínima, me orientou em relação ao uso constante dos equipamentos de proteção individual (máscara, luva etc) e higienização das mãos”.

A rotina foi alterada – tudo com maior atenção. “As consequências desse vírus para o bebê ainda são desconhecidas, até mesmo para as gestantes, então evito todo tipo de aglomeração, visitas e saídas de casa. Quando necessário, utilizo máscara, levo meu álcool em gel na bolsa, mas ainda prefiro lavar as mãos com água e sabão. Tomo banho quando chego em casa, troco de roupa. É uma situação bem complicada, mas necessária. Quando a gente já sabe mais ou menos o que esperar é diferente, mas esse momento que estamos vivendo, ninguém sabe de nada e isso é muito angustiante, sem dúvidas. Temos que viver um dia de cada vez. Moro com meu marido, meu filho de 5 anos, minha irmã, um sobrinho de 4 anos, minha mãe e meu avô. Quando a bebê nascer, somente eles a conhecerão de primeira. O restante vai ter que esperar um pouquinho, porque como disse, não sei o que esperar daqui para frente, mas as precauções serão muitas, com certeza”.

Maria Júlia é aguardada com expectativas e ansiedade. “Tenho conversado muito com meus filhos. O mundo muda a todo momento e nós estaremos sempre aqui para protegê-los e guiá-los. Ela vai poder contar com a gente sempre! Isso é passageiro! É um momento difícil, sim, mas logo vai passar e espero estarmos todos juntos no final, porque o mais importante na vida é a família”.

Novos protocolos e medidas preventivas

“As grávidas devem tomar os mesmos cuidados que a população, em geral. Como não existe uma vacina ainda e os medicamentos que vêm sendo usados ainda não têm uma larga evidência científica de efetividade, a única prevenção mesmo é o isolamento. As grávidas devem ser afastadas do trabalho e permanecer em casa. Devem ser afastadas de pessoas com sintomas da doença. No caso de precisarem sair à rua, devem usar máscaras e manter a higiene das mãos. Há que se ter cuidado também com qualquer produto que chegue em suas casas, vindo de fora, até mesmo as sacolas plásticas de compras. Tudo deve ser higienizado!”, afirma Marília Gabriela da Luz, gerente da maternidade da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará.

A médica ainda orienta que as prevenções devem ser adotadas, sem qualquer flexibilização, com vistas a evitar qualquer contato com gotículas que possam carregar o vírus. Mesmo com tantas recomendações, Marília tranquiliza as grávidas a respeito da hora do parto. “Os hospitais separam as equipes: há a [equipe] que cuida dos pacientes suspeitos e dos assintomáticos para a Covid-19. No pós-parto, se a puérpera for uma paciente sem sintomas ou suspeitas, os cuidados permanecem os mesmos: amamentação ainda na primeira hora, para passar os anticorpos para o bebê; o contato pele a pele. Para a paciente com suspeita de Covid, é recomendada a amamentação e a mãe deve usar máscara durante a alimentação, além de lavar as mãos sempre que for se aproximar da criança. No pós-parto imediato, há cuidados específicos também: a criança é banhada totalmente e de maneira delicada. Em hipótese alguma, mãe e bebê são afastados”, explica detalhadamente.

E sobre os casos de bebês noticiados como infectados no restante do Brasil? A médica explica que, até o momento, dentro da Santa Casa, todos os bebês testados, imediatamente pós-parto, tiveram resultados negativos. “Existem alguns relatos de crianças, que nasceram em outros hospitais, que testaram positivo, contudo, os testes não foram realizados imediatamente após o parto”.

A gerente da Maternidade da Santa Casa ressalta também a importância de seguir o pré-natal corretamente e buscar informações reais. “As fake news, o estresse e a ansiedade são maléficos à saúde. Na maioria dos serviços, o pré-natal não parou. Existe ainda a possibilidade de atendimento remoto também, além de reforçar os cuidados cotidianos. Ah, é preciso manter os sapatos do lado de fora da casa. Sempre que precisar sair, ao voltar, é preciso lavar toda a roupa, tomar um banho imediatamente e, durante o banho, evitar que a água dos cabelos escorra para a face. Incline a cabeça, de modo que a água com a qual os cabelos estão sendo lavados escorra para as costas e não para a face. Há que se ter também higiene com todos os produtos que cheguem da rua, mas, sobretudo, tentar manter a tranquilidade. Um dos maiores desafios que estamos vivendo é o pânico, então manter a calma é necessário, para evitar problemas e complicações”, alerta.

Primeiro dia das mães

Taynara Silva Costa, 24 anos, recepcionista, deu à luz na última segunda feira, 4, a um bebezão: o Mário André. O medo, enfim, cessou. “Senti receio dos 8 meses de gestação até a véspera do parto, quando os números da pandemia começaram a aumentar e passamos a ver pessoas conhecidas perdendo os familiares, além de assistir as restrições aumentando em alguns lugares, como, por exemplo, na própria maternidade”, relembra.

A médica a deixou segura e confortável. “Ela foi super atenciosa. Informou todas as medidas de segurança que seriam necessárias e sempre com disponibilidade para o atendimento, até mesmo por celular, o que me deixou mais tranquila. Sobre a pandemia, ela informou que se tratava mesmo de algo novo. Eram muitas informações novas, mas o principal seria respeitar o isolamento para a segurança do bebê e de todos”, elogia. “Senti muito medo, pois estaria [o Mário André] nascendo em meio a uma pandemia, com visitas e mesários cancelados. Ainda chegamos a fazer os brindes da maternidade e foi algo que doeu saber que não seria como o planejado. A priori não fiquei chateada, por se tratar de uma questão de segurança para a saúde do bebê, mas nada me deixou tão preocupada quanto ver que os planos de saúde, no meio da pandemia, se tornaram precários. Moro com meu marido, mas nossa família infelizmente não vai poder visitar ainda. Entretanto, criamos vários grupos no celular e fazemos vídeo chamada com frequência, para tentar amenizar a saudade”.

O primeiro dia das mães será inesquecível, tanto para eles quanto para nós. Afinal, nunca vimos mulheres mais sobrenaturalmente corajosas que as mães.

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