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Feminismos: uma luta de todxs!

Busca por respeito, autonomia e libertação impulsionam movimentos feministas e reforçam a sua necessidade para uma sociedade mais justa

Por Jamille Pinheiro

Vira e mexe uma polêmica envolvendo famosos aquece discussões importantes com temas ligados aos feminismos [sim, a expressão é usada atualmente no plural, pois o movimento engloba mulheres diversas, com histórias e condições diferentes, em várias frentes ideológicas]. A separação da cantora Luísa Sonza e o caso envolvendo o jogador Robinho, que foi condenado em primeira instância na Itália por violência sexual, são alguns exemplos. 

A importância de falar sobre estas questões envolve muito mais que a fama: são milhares de casos replicados diariamente, em todos os lugares e em todas as classes sociais. E afinal, o que são feminismos? Por que é preciso falar cada vez mais sobre o tema?

image Para Michele Goulart, apesar de vir ganhando mais visibilidade, o mapa da violência no Brasil é um grande motivo pelo qual o feminismo, em suas diferentes vertentes, precisa existir (Acervo pessoal)

Construído e protagonizado por mulheres, os feminismos têm como base movimentos políticos, sociais e filosóficos que buscam a autonomia da vida, respeito, equidade de gêneros, além do empoderamento e libertação de padrões patriarcais. "É uma luta que é de mulheres, mas que, no final das contas, acaba por beneficiar a sociedade inteira, uma vez que lutamos por mudanças coletivas e, de preferência, que elas se realizem no âmbito público", explica a psicóloga Michele Goulart, que é embaixadora do coletivo Não é Não, no Pará.

Para ela, apesar de o movimento vir ganhando mais visibilidade, o mapa da violência no Brasil - análise de dados que esquadrinha todas as violências, com estatísticas de importunação sexual, feminicídio, violência doméstica, estupro, entre outras -, é um grande motivo pelo qual o feminismo, em suas diferentes vertentes, precisa existir. 

No Brasil, a cada oito minutos um estupro é registrado. Só em 2020, foram realizados 25.469 boletins de ocorrência, com 85,7% das vítimas do sexo feminino. As informações foram divulgadas esta semana no Anuário Brasileiro de Segurança Pública. 

"A sociedade ainda não mudou. Infelizmente mulheres ainda morrem, ainda são estupradas, objetificadas, abusadas sexualmente. E, felizmente, o movimento feminista existe para que a gente lute pelo direito de andar nas ruas, de ocupar espaços públicos, cargos públicos, pelo direito da gente se separar e namorar quem a gente bem entender, como a Luísa Sonza fez", destaca Michele. 

Aos 43 anos, a embaixadora do Não é Não relembra que foram questões privadas que a despertaram a necessidade de luta, porém, ao aprofundar conhecimentos, passou a entender que precisa olhar para o coletivo. 

"Sempre tive atitudes que se aproximavam dos feminismos, mas não tinha o conhecimento. De uns anos para cá, alguns eventos na minha vida acabaram me levando para esse estudo, para a compreensão das violências que as mulheres sofrem, e que eu mesma já sofri", conta a psicóloga. 

"Rompi com a Flávia que eu era e passei a me conectar mais comigo, a questionar várias coisas, como relacionamentos, amizades, trabalho. Ao passar a entender mais sobre os movimentos, vi que estava sofrendo violências que, pra mim, já eram naturalizadas” – Flávia Ribeiro, jornalista.

Divisor de águas

A jornalista Flávia Ribeiro, 42, também passou a se debruçar em questões voltadas ao movimento a partir de uma experiência pessoal. Em 2012, ela precisou brigar pelo seu direito de escolha do parto, pois queria ter seu bebê em um parto natural, totalizando passagem por nove obstetras.

"Comecei a descobrir mais sobre o mundo de violências relacionado ao parto. As pessoas demonizam o parto normal, tiram nosso direito, nossa autonomia. Percebi que alguns médicos mentiam, diziam que era preciso fazer a episiotomia [é uma incisão efetuada na região do períneo para ampliar o canal de parto]", lembra Flávia, que chegou a ouvir que não conseguiria parir por ter mais de 30 anos na época. "Não podemos naturalizar essas violências", completa.  

image "O movimento feminista é para todo mundo, não só para quem luta" (Flávia Ribeiro) (Acervo pessoal)

A partir da experiência, a jornalista passou a se articular e participar do movimento como feminista negra afroamazônida. Hoje, Flávia é militante do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará, da Rede Mulheres Negras do Pará, Rede Fulanas - Negras da Amazônia Brasileira e da Rede Nacional de Ciberativistas Negras. 

"Rompi com a Flávia que eu era e passei a me conectar mais comigo, a questionar várias coisas, como relacionamentos, amizades, trabalho. Ao passar a entender mais sobre os movimentos, vi que estava sofrendo violências que, pra mim, já eram naturalizadas, pareciam mínimas, mas, com um tempo, enxerguei que não precisava passar por isso", conta.

Visibilidade

Para Michele, a ampliação do debate e realização de campanhas que explicam os tipos de violência, resultam em um processo de conscientização muito mais amplo. "Acredito que estamos ganhando mais visibilidade - espaço ainda brigamos na cotovelada para ocupar -, mas as mulheres estão tendo mais consciência e trabalhando duro para que outras mulheres se conscientizem sobre as situações pelas quais elas passam", pondera.

Já Flávia, alerta. "Elas estão entendendo que não precisam, por exemplo, ouvir um homem falar o que pensa na rua, isso é muito absurdo. Mas, ao mesmo tempo, também há resistência, como no caso do Robinho", pontua.

image A advogada Ana Paula Cavalcante reforça que há diversos tipos de violência que a mulher pode e deve denunciar (Acervo pessoal)

Preconceito

Embora a divulgação e debate sejam mais fortes, muitas pessoas, incluindo mulheres, têm preconceitos, ainda que sem qualquer embasamento. Na opinião da embaixadora do Não é Não, as que dizem ter aversão ao feminismo talvez ainda não tenham tido uma compreensão ampla do que o movimento representa, pois mesmo mulheres que não se declaram feministas, se beneficiam das lutas. "E para o movimento é isso mesmo, é para todo mundo, não só para quem luta", afirma Michele. 

"Existe aquela máxima de que feminista é a mulher mal-amada, feia, que não quer se depilar. Eu tenho o direito de que ninguém precisa me dar padrão, de que eu tenho que tá magra ou com cabelo alisado ou depilada. Eu não preciso passar o resto da minha vida me mutilando para alcançar esses padrões hegemônicos. O homem não precisa se depilar todo mês, ser magro", opina Flávia Ribeiro.
 
Já os homens que se incomodam, na opinião da psicóloga, têm a ver com a posição de privilégio em que ocupam e, muitas vezes, o movimento questiona esse privilégio e questiona uma estrutura social que beneficia e favorece o gênero, especialmente homens brancos. "Talvez o incômodo seja porque os feminismos provocam reflexões e uma tomada de consciência da necessidade de mudança do próprio comportamento, que talvez as pessoas não estejam prontas e não tenham vontade de olhar para isso", defende Michele.

O que fazer?

Embora os direitos iguais façam parte da Constituição Federal, na prática, muitas vezes, as coisas são conduzidas de modo diferente. De acordo com a advogada Ana Paula Cavalcante, há diversos tipos de violência que a mulher pode e deve denunciar, que vão desde violência física, emocional, patrimonial, moral, até as violências sexuais. 

"Toda e qualquer violência pode e deve ser denunciada. Infelizmente, sabemos que existem diversos fatores implicam na denúncia, como medo, dependência, falta de acolhimento, onde muitas vezes a palavra da mulher é colocada em xeque, a subordinação, que acontece em casos de assédio no trabalho, por exemplo", destaca a advogada.

Para casos que envolvem violência sexual, como estupro, importunação, entre outros, as dificuldades podem surgir, por conta da subjetividade.

"O limite entre uma paquera e uma importunação sexual é o consentimento. Às vezes o silêncio já é uma forma de se expressar, a mulher não precisa verbalizar que está se sentindo constrangida, até porque determinadas circunstâncias impedem que isso ocorra", explica Ana Paula, que orienta solicitar imagens de câmeras de segurança, quando houver, e buscar testemunhas.

"Quem está passando por uma situação como essa, precisa procurar uma rede de apoio especializada em atendimento à mulher em situação de violência e, se possível, se munir do maior número de provas do crime", alerta.

Para conhecer mais:
@michelegoulartpsi
@negra_amazonida
@naoenao_
@apcavalcantenc

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