Terapias coletivas gratuitas fortalecem redes de cuidado e saúde mental em Belém
Serviços em universidades públicas, unidades da prefeitura e ONGs oferecem escuta qualificada e apoio psicológico a diferentes públicos
A Terapia Comunitária Integrativa (TCI) é um exemplo de abordagem que aposta na escuta, no grupo e na solidariedade para promover saúde emocional de forma acessível. É uma realidade cada vez mais presente em Belém, onde o serviço público oferece, gratuitamente, apoio psicológico e espaços de acolhimento coletivo.
Na TCI, as sessões são realizadas em grupo, reunindo pessoas com vivências diversas, mas que compartilham dores e desafios semelhantes. Os encontros são conduzidos por profissionais capacitados, mas o protagonismo está na escuta ativa entre os participantes. O objetivo é criar um espaço seguro onde o sofrimento possa ser verbalizado sem julgamentos e, assim, transformado em força, pertencimento e resiliência.
Na capital paraense, iniciativas voltadas à saúde emocional vêm ganhando força ao oferecer alternativas acessíveis e acolhedoras à população. Instituições públicas locais, como universidades e órgãos municipais, desempenham papel fundamental nessa rede de apoio, ampliando o acesso a terapias integrativas, escuta qualificada e cuidado coletivo, tanto para suas comunidades acadêmicas quanto para o público em geral.
CAPS oferece grupos terapêuticos em diferentes formatos
A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) oferece uma série de atividades voltadas à saúde mental por meio de terapias coletivas. Os grupos são realizados de forma gratuita e buscam acolher demandas de diferentes públicos, promovendo inclusão, escuta qualificada e reabilitação psicossocial.
No Centro de Atenção Psicossocial (CAPS III Marisa Santos) também conhecido como Casa Mental Adulto, localizado no bairro Nazaré, vinculado à Prefeitura de Belém, estão ativos diversos grupos terapêuticos semanais e quinzenais, com capacidade de até 15 pessoas por sessão. O encaminhamento é feito pelos técnicos de referência da unidade, após acolhimento inicial, no qual se traça um Plano Terapêutico Singular (PTS), com orientações específicas para o cuidado individual e coletivo.
Os acolhimentos no CAPS III são realizados de segunda a quinta-feira, nos turnos da manhã e da tarde. Após a primeira triagem, o usuário já sai com o agendamento da consulta e o prontuário aberto. Para acessar os serviços, é necessário ser morador dos bairros Guamá, Terra Firme, Canudos, São Brás, Fátima ou Nazaré; ter mais de 18 anos; apresentar RG, CPF, cartão SUS, comprovante de residência e estar acompanhado.
As sessões são realizadas na Casa Mental Adulto, localizada na Travessa Dom Romualdo de Seixas, nº 1954. Atualmente, estão ativos:
- Grupo Ansiosos – segundas-feiras, às 8h30
- Grupo de Apoio ao Familiar – terças-feiras (quinzenal), às 9h
- Grupo Conectados – quartas-feiras, às 9h
- Grupo Psicoeducação – quintas-feiras (quinzenal), às 8h
- Grupo Roda Terapêutica – quintas-feiras (quinzenal), às 10h
A unidade funciona 24 horas, e os grupos são abertos, permitindo rotatividade entre os participantes, desde que haja avaliação técnica favorável à inclusão.
De acordo com dados do primeiro quadrimestre de 2025, a RAPS de Belém realizou 3.991 atendimentos interdisciplinares. Entre os serviços com maior demanda está a Oficina Terapêutica II – Saúde Mental, com 344 registros (13,71% do total). As atividades incluem atendimentos individuais e em grupo, oficinas, visitas domiciliares e articulações com outros setores da saúde.
Uepa oferta grupos em diferentes bairros de Belém
Além dos atendimentos municipais, a Universidade do Estado do Pará (Uepa), por meio do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS), também atua com grupos terapêuticos gratuitos, vinculados a projetos de extensão e estágios em Terapia Ocupacional. As atividades são executadas em equipamentos públicos como a Usina da Paz do Jurunas/Condor e do Bengui, além dos campi da instituição.
Os atendimentos da Uepa, no que se refere aos projetos de extensão, são realizados por demanda espontânea. Já nas Usinas da Paz, onde são feitos os estágios supervisionados, as vagas para os grupos terapêuticos são limitadas e divulgadas previamente nas redes sociais de cada unidade. Por isso, é importante que os interessados fiquem atentos aos canais oficiais para garantir participação nas atividades.
Usina da Paz – Jurunas/Condor
- Grupo com adolescentes: segunda-feira, 15h às 16h30
- Grupo com jovens (18 a 25 anos): terça-feira, 15h às 16h30
- Grupo com adolescentes com deficiência: quarta-feira, 15h às 16h30 (sem vagas)
- Grupo com idosos: quinta-feira, 15h às 16h30
Usina da Paz – Bengui
- Grupo de geração de renda: terça-feira, das 8h às 9h e das 9h às 10h
- Grupo Jovens Titãs (adultos e idosos): quinta-feira, das 8h às 9h e das 9h às 10h
- Projeto de reabilitação para pessoas com hanseníase
O Projeto de reabilitação para pessoas com hanseníase é realizado na Oficina Ortopédica da Uepa/CER III (Campus CCBS), às segundas, quartas e sextas, das 14h às 17h. A ação oferece atividades e exercícios específicos para pacientes com incapacidades decorrentes da hanseníase, incluindo o uso de tecnologias assistivas.
Campus CCBS (Laboratório de Motricidade – Bloco D, Anexo)
- Grupo de apoio para pessoas enlutadas: retorna dia 18 de agosto, às quintas-feiras, das 8h30 às 10h
- Grupo de saúde mental para adultos e idosos: retorna dia 18 de agosto, às terças-feiras, das 8h30 às 10h
Ampics: acolhimento e práticas integrativas com base na escuta ativa
Ainda na Uepa, o Ampics (Ambulatório de Práticas Integrativas e Complementares de Saúde) oferece atendimento gratuito, no campus III, e acolhimento à comunidade. Com sede no campus da universidade, o projeto integra ciência, saberes populares e cuidado humanizado por meio de terapias como auriculoterapia, ventosaterapia, Reiki e meditação.
O ambulatório funciona em três dias da semana:
- Segunda-feira, das 8h30 às 12h
- Quarta-feira, das 14h30 às 20h30
- Quinta-feira, das 14h30 às 17h30
As práticas são realizadas por estagiários supervisionados e voltadas tanto à comunidade universitária quanto ao público externo. Há também atividades em grupo, como rodas de conversa e sessões de meditação guiada, que ocorrem às quartas-feiras, às 17h30, com foco em temas como ansiedade, autocuidado e saúde emocional.
Grupo de idosos na Usina da Paz – Jurunas/Condor
No grupo de idosos que se reúne na Usina da Paz – Jurunas/Condor, os benefícios já fizeram a diferença na vida da participante Maria Oneide Cruz. “Eu era muito esquecida por consequência da covid-19 e uma amiga me chamou para a terapia, então eu comecei a vir e gostei. Eu aprendi a fazer pulseira, colar, prendedor de porta, desenhos e várias outras coisas. Elas têm muita paciência com a gente e a professora é maravilhosa, ensina a gente de tudo, o que a gente quiser aprender. Eu parei de esquecer, eu esquecia de tudo e se eu guardasse um dinheiro eu tinha que memorizar o lugar, eu perdi até o emprego por causa disso, mas agora não esqueço mais. E eu tinha muita vergonha, a gente já não tem muita agora, estou dando até entrevista”, contou.
Para a aposentada Maria do Livramento Santiago, de 65 anos, as sessões vieram no momento ideal, após ela passar por uma complicação de saúde. “Eu fazia ginástica no Viver Bem, nós tivemos um passeio e na volta eu caí do ônibus, depois que ele passou por um buraco. Nisso, quebrei a coluna. Fiquei seis meses de cama e depois vim aqui para a usina fazer fisioterapia. Aí me falaram que tinha terapia ocupacional e eu fui muito bem acolhida mesmo, a minha professora que me inscreveu e foi maravilhoso, tudo de bom na minha vida”, declarou.
“A gente trabalha na perspectiva da terapia ocupacional comunitária, isso significa que a gente busca fortalecer aquele participante, quais são suas raízes na comunidade, para que ele se entenda como um sujeito de direitos para realizar diversas atividades. Na terapia ocupacional, a gente chama de ocupações essas diversas atividades na comunidade, que são desenvolvidas para que ele possa se sentir pertencente”, pontuou Flávia Coelho, professora de terapia ocupacional da Uepa e preceptora do grupo de idosos da Usina da Paz do Jurunas.
Para Flávia, o atendimento voltado ao grupo de idosos é fundamental para a saúde mental. “Muitas vezes, eles chegam nessa idade já achando que não podem fazer muita coisa. A maioria dos idosos que a gente atende foram trabalhadores a vida inteira e não tiveram o direito de se engajar em outras atividades que são significativas para eles. Quando eles chegam na fase de ser idoso, muitas atividades são restritas e isso prejudica a saúde mental, eles podem ficar cada vez mais depressivos e ansiosos, porque o rol de atividades que eles deveriam fazer cotidianamente, eles diminuem. Quando a gente vem com essas atividades, a gente fortalece as pessoas a partir de diversas estratégias”, ressaltou.
"O objetivo da parceria é sempre atender a comunidade, especialmente as mais vulneráveis, que não teriam condições de fazer um atendimento particular, um atendimento de fácil acesso. A gente sempre faz uma rotatividade de atendimentos para que a gente consiga atender esse público de dois bairros populosos de Belém, que é o Jurunas e a Condor. A Usina, por mais que tenha o nome Jurunas-Condor, está de portas abertas para todos os bairros de Belém e de outros municípios também. E temos grupos de WhatsApp com a comunidade, onde nós ofertamos as vagas”, detalhou Lucas Maia, coordenador da Usina da Paz do Jurunas e Condor.
Na UFPA, disciplina aposta no bem-estar coletivo
Iniciativas da Universidade Federal do Pará (UFPA) também oferecem práticas de escuta em grupo como parte da formação estudantil. Uma das experiências mais recentes é a disciplina Felicidade, Saúde e Bem-Estar, promovida pela Pró-Reitoria de Assistência Estudantil (Proaes). A proposta combina atividades reflexivas e terapias coletivas, com foco no autoconhecimento e no cuidado mútuo dentro do ambiente universitário.
Além da disciplina, a UFPA mantém serviços psicossociais com atendimentos individuais e rodas de escuta, voltadas exclusivamente à comunidade acadêmica. Os grupos coletivos funcionam como espaços de apoio emocional, construção de vínculos e promoção da saúde mental.
*Laura Serejo (estagiária de jornalismo, sob supervisão de Fabiana Batista, coordenadora do núcleo de Atualidades)
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA