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HTLV: diagnóstico de vírus incurável poderá ser realizado em gestantes durante o pré-natal

Especialista explica a importância do diagnóstico precoce para a qualidade de vida do paciente

Maiza Santos

Após determinação do Ministério da Saúde (MS), gestantes durante o pré-natal poderão fazer o teste para verificar se estão infectadas pelo HTLV (vírus Linfotrópico de Células T Humanas), via SUS. O HTLV é um retrovírus, da mesma família do HIV, transmitido por relação sexual, compartilhamento de seringas e agulhas, transfusão de sangue, no parto ou no aleitamento materno, e pode causar uma doença degenerativa que leva o paciente a ficar paraplégico ou mesmo ter leucemia. O biomédico Antônio Carlos Vallinoto, membro da comissão técnica de HTLV do Ministério da Saúde do Brasil e professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), explicou que o vírus ainda não tem cura, mas o diagnóstico precoce auxilia na qualidade de vida do paciente.

Os testes PCR e Western Blot (WB), para confirmação e definição do tipo do vírus, já estavam disponíveis no Sistema Único de Saúde, porém para outras indicações. As áreas técnicas do MS terão o prazo máximo de 180 dias para efetivar a oferta no SUS para o novo público. No Pará, a Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa) informou que já está se organizando para iniciar as novas diretrizes nacionais para o agravo em pauta:

“O fluxo será construído pelo Estado e pactuado junto a Comissão Intergestores Bipartite, que é a instância de negociação e deliberação quanto aos aspectos operacionais do SUS no âmbito do Estado. Porém, é importante registrar que o pré-natal é de competência da esfera municipal, para municípios de gestão plena. Os testes que foram recentemente incorporados ao SUS são de triagem e ainda não possuem definição de como serão fornecidos pelo MS através de aquisição centralizada.”, afirma.

O que é o HTLV

Conforme o biomédico Antônio Vallinoto, o vírus é dividido em dois tipos, o HTLV-I e HTLV-II. O primeiro está relacionado a doenças neurológicas graves e degenerativas, como paraparesia espástica tropical, e também hematológicas, como a leucemia e o linfoma de células T humana do adulto (ATL). Já o segundo tipo, ainda não foi plenamente esclarecida sua ligação com alguma patologia determinada, pois pode permanecer no organismo de maneira assintomática.

“O HTLV, embora tenha sido descoberto em 1980 e foi o primeiro retrovírus achado, ainda hoje é uma doença negligenciada no mundo todo, principalmente após a descoberta do HIV. Isso porque teve todo o impacto da pandemia de AIDS, social, econômica e saúde pública. O que fez com que as pessoas e a própria ciência esquecessem o HTLV. Houve grandes evoluções do ponto de vista de diagnóstico, de tratamento, até de possíveis vacinas para o HIV, mas para o HTLV não”, comenta o professor.

image Biomédico Antônio Carlos Vallinoto, membro da comissão técnica de HTLV do Ministério da Saúde do Brasil e professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), falando sobre o vírus. (Foto: Ivan Duarte / O Liberal)

O Ministério da Saúde ampliou o uso de testes para diagnóstico do HTLV na rede pública. A inserção do exame para gestantes foi recomendada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), como método para reduzir a transmissão vertical (de mãe para filho) do vírus durante a amamentação.

"Alguns estados do Brasil já se adiantaram e estão realizando a testagem em gestantes. No entanto, aqui no Pará, mesmo com a recomendação ao SUS, ainda está em processo de planejamento a questão do inicio dos testes", informa o especialista Vallinoto.

HTLV ou HIV

image Professor Antônio Vallinoto com a equipe que atua no LabVir (Foto: Ivan Duarte / O Liberal)

Apesar de serem retrovírus e terem a capacidade de se multiplicarem dentro das células humanas, persistindo no organismo, HTLV e HIV não são iguais. Os dois tipos de vírus possuem algumas semelhanças, como o poder de infecção; os dois infectam células do sistema imunológico, especificamente as células T, importantes para a defesa do organismo contra infecções; e os vírus podem levar a problemas de saúde mais graves. O professor Antônio Vallinoto destaca as diferenças.

“HTLV e HIV fazem parte de uma grande família de vírus chamada retrovírus. Mas eles são vírus diferentes. O HIV, se não tratado com antirretrovirais, vai evoluir para a imunodeficiência grave e fatal, que é a Aids. Já o paciente com HTLV, não terá essa imunodeficiência. Ele consegue modular a resposta imune do hospedeiro dele, mas não leva a uma AIDS. Então, enquanto o HIV pode levar a AIDS, o HTLV não”, explica o professor.

image Voluntários do projeto realizando o processo de triagem para identificar o HTLV (Foto: Ivan Duarte / O Liberal)

Contaminação e diagnóstico

Segundo o especialista, um levantamento realizado pelo grupo que estuda o HTLV aponta que aproximadamente 0,06% de pessoas testaram positivo para o vírus. “A frequência de HTLV é muito variada conforme a população que a gente investiga. No Pará, Belém, por exemplo, ficou com uma prevalência em torno de 0,6% de infecção. Mas isso em um universo de 1.500 pessoas testadas, onde nós tivemos um número X de indivíduos infectados, que corresponde aproximadamente a esse percentual. Marituba, por exemplo, já nos chamou um pouco mais de atenção, pois ela já foi acima de 2%, bem maior do que Belém”, comunica Antônio Vallinoto.

Atualmente, para uma pessoa verificar se está infectada com o HTLV é necessário realizar exames médicos. Os principais métodos incluem testes que analisam o sangue. Após a realização dessa primeira etapa de ‘triagem’, caso o resultado seja positivo para o vírus, é necessária a confirmação do diagnóstico. A segunda fase do teste é feita para saber com qual HTLV está lidando.

"Hoje nós temos uma corrida mundial de tentar diminuir essa negligência que foi criada relacionada ao HTLV. Então, existe uma tentativa de tornar esse vírus mais conhecido, saber melhor qual a prevalência, qual a frequência de infecção no mundo como um todo, em diferentes populações. E para isso, nós precisamos fazer o diagnóstico. O Brasil é o país com o maior número absoluto de casos de infecção pelo HTLV. E o Brasil é um país que tem trabalhado durante muitos anos na tentativa de minimizar essa negligência", diz Vallinoto.

Ainda segundo o biomédico, mulheres indígenas estão entre as mais infectadas na região Norte. “Por uma característica, as nossas populações indígenas da Amazônia são infectadas pelo HLV2 em alta prevalência. Aqui na nossa região, chega a ter 30% de infecção em algumas populações indígenas. Na população urbana, o HLV1 é o mais prevalente, mas nós temos o HLV2 também. O caso se deve ao vírus ter se propagado inicialmente nos povos originários da África, que também são os primeiros a colonizar grande parte do mundo. Entre os indígenas, a cultura de se relacionar com pessoas da mesma comunidade e, entre as mulheres, a questão da amamentação de várias crianças são motivos para a prevalência do vírus entre eles”, explica Antônio Vallinoto.

image Volúntários do projeto no processo de triagem para identificar o HTLV (Foto: Ivan Duarte / O Liberal)

Tratamento

O Ministério da Saúde orienta que os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) acompanhem os indivíduos de acordo com a doença associada ao vírus HTLV para direcionar o tratamento por meio de uma equipe multidisciplinar adequada. “A maior parte do tratamento é para os sintomas, não é um tratamento que elimine o vírus, que cure a doença, então o indivíduo infectado vai ser infectado para a vida toda”, aponta Antônio Vallinoto.

Lab Vir

O Laboratório de Virologia (LABVIR), vinculado ao Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará (ICB/UFPA), realiza o serviço de atendimento à pessoa vivendo com HTLV. No local, o público encontra os serviços de triagem e confirmação do vírus, além de acompanhamento especializado por uma equipe multiprofissional formada por professores e voluntários da própria Universidade. Em 2022 e 2023, mais de mil pessoas passaram pelo local para realizar o teste de maneira gratuita.

“Para fazer o exame, a pessoa deve apresentar uma guia onde o médico solicita a realização do teste de HTLV. Quem quiser, pode pedir para o médico esse documento e ir até o laboratório. O indivíduo vai passar por um clínico geral, vai ser avaliado por um neurologista, dermatologista, reumatologista, pneumologista e demais profissionais. A ideia desse serviço de extensão não é apenas diagnosticar, nós queremos ajudar a tratar, inclusive, com acompanhamento e aconselhamento com enfermeiros. E, após esse momento, ele começa a fazer as avaliações clínicas com esses especialistas. Tudo é gratuito”, destaca Antônio Vallinoto.

image Professor Antônio Vallinoto comentando sobre o trabalho realizado no Lab Vir (Foto: Ivan Duarte / O Liberal)

Serviço:

Laboratório de Virologia

Rua Augusto Corrêa, 01, Campus Universitário do Guamá, Setor Básico, Instituto de Ciências Biológicas - Bairro Guamá, Belém - Pará.

Funcionamento: Segunda a sexta-feira, de 8h às 17h.

 

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