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Dança é tratamento auxiliar eficaz para doenças crônicas

Pacientes podem sentir melhorias físicas e mentais por meio da atividade física

Elisa Vaz

O tratamento de doenças crônicas, muitas vezes, pode afetar negativamente a rotina e a saúde mental dos pacientes, e as atividades físicas que geram prazer são recomendadas para que essas pessoas tenham mais qualidade de vida. No caso do Mal de Parkinson, um distúrbio do sistema nervoso central que afeta o movimento, a dança tem se mostrado um excelente complemento ao tratamento principal da doença, com melhorias nas funções cognitivas e na saúde mental.

É o caso do cozinheiro aposentado José Luiz, de 65 anos, que foi diagnosticado com o mal anos atrás, mas se trata há apenas um ano. Após iniciar o tratamento, o paciente recebeu a indicação de aulas de dança e conta que foi muito bem recebido. Hoje os encontros para se movimentar, ouvir música, conversar e se divertir fazem parte de sua rotina e José não troca as horas de alegria por nada. “Adorei estar aqui quando cheguei e continuo adorando. Isso é muito legal, você sai leve, dança, o que a gente faz é muito legal”, opina.

O aposentado lembra que, desde jovem, sempre gostou de dançar, e hoje, nas aulas, tem se sentido revigorado. Toda terça e quinta ele vai até o encontro. “Sinto que, a cada semana, meus sintomas estão melhorando, porque saio daqui leve. Participar dessas aulas é uma coisa muito diferente, fico de alguma lavada, com uma energia diferente. Isso com certeza complementa o tratamento. Também senti mudança no humor, eu era muito estressado e agora o estresse afastou. A gente dança tudo: carimbó, xote, forró, brega”, diz José, e logo em seguida destacou que é bom dançarino em todas as modalidades.

Mal de Parkinson

A doença é degenerativa do sistema nervoso central, o que, de acordo com o neurologista Bruno Lopes, significa que é progressiva e está associada a uma alteração, uma perda de células do sistema nervoso, e vai piorando ao longo do tempo. Portanto, é uma doença crônica que não tem tendência de melhorar ou estabilizar – além disso, atualmente, não tem tratamento curativo, mas há alguns específicos para melhorar os sintomas. O especialista diz que, no Brasil, a estimativa é de que três a cada 100 idosos tenham o Parkinson, sendo a segunda doença degenerativa mais comum do comum.

Os sintomas se dividem em quatro grupos: a lentidão dos movimentos, que pode ser percebida pelos pacientes que têm uma dificuldade maior de fazer atividades manuais que antes faziam com maior agilidade, e este é o mais importante dos sintomas; o tremor, que, geralmente, é de repouso, ou seja, surge quando o braço ou a perna está parada e tende a ser pior de um lado que do outro; rigidez, percebida pelo paciente com uma espécie de dificuldade de alongar, de fazer alguns movimentos porque o membro está mais rígido; e a instabilidade postural que, ao longo do tempo, a pessoa pode ter dificuldade para andar, tendência a queda, a andar com maior instabilidade, dificuldade de ficar parada em equilíbrio. Caso alguém sinta um desses sintomas e desconfie de algo mais sério precisa ser examinada por um médico neurologista – como o diagnóstico é clínico, não há a necessidade de fazer exames complementares.

Além dos sintomas motores, que são os mais comuns, há também os não motores. “São muito importantes e, às vezes, mais importantes do que os sintomas motores. Existem vários, mas alguns afetam mais o dia a dia do paciente. Um dos mais comuns, por exemplo, é constipação ou prisão de ventre, que pode anteceder os sintomas motores ou podem acompanhar o paciente ao longo da doença e se tornar muito problemáticos, com dificuldade de evacuação progressiva e a pessoa tendo que tomar remédio para evacuar. Existem problemas de sono, como apneia, transtorno comportamental, sono muito agitado; problemas de saúde mental do ponto de vista amplo, principalmente transtornos ansiosos e depressão, que são muito comuns na doença de Parkinson e geralmente antecedem os sintomas motores também. A condição pode atrapalhar também a parte cognitiva e intelectual, já que a pessoa pode evoluir com dificuldade de raciocínio, perda de memória ou coisas do tipo; problemas de queda de pressão repentinos, que é a hipotensão ortostática. Enfim, muitas coisas podem acontecer”, comenta o neurologista.

Por ser uma doença crônica e sem cura, são utilizados tratamentos que diminuem os sintomas, principalmente os motores: tratamentos com remédios ou cirurgias que vão diminuir tremor, lentidão, rigidez e alguns outros sintomas não motores que a pessoa eventualmente possa evoluir – à medida que eles ficam mais estáveis ou somem a medicação é reduzida, mas, em geral, os remédios são usados para o resto da vida, podendo mudar a dose ou trocar de remédio, de acordo com a modificação dos sintomas da doença, explica Bruno.

Junto a isso, o tratamento não medicamentoso e não cirúrgico é muito útil e eficaz, na avaliação do especialista. “Temos evidências muito boas e robustas mostrando que a atividade física, principalmente no início da doença, é tão boa quanto o uso de medicação. Quando se usa em conjunto o remédio e a atividade física, o paciente tem uma evolução mais favorável, evitando complicações. Sugerimos as atividades que sejam possíveis e, de preferência, supervisionada, para que a pessoa também não se machuque. Percebemos que quanto mais o paciente gosta daquela atividade física, mais ele se engaja e se interessa por fazer e não parar. A dança é uma delas, há estudos de doença de Parkinson mostrando um efeito positivo dela e também pode ser bem útil para os pacientes”.

Projeto cria metodologia de dança

A Universidade Federal do Pará (UFPA) tem um projeto que propõe aulas terapêuticas de dança para quem tem Mal de Parkinson: o Grupo Parkinson de Pesquisa e Extensão. Semanalmente, às terças e quintas-feiras, os alunos interessados se reúnem para momentos de descontração por meio da dança, brincadeiras, jogos e conversas. Para se inscrever basta entrar no site www.grupoparkinson.org e preencher o cadastro a qualquer momento – após isso a equipe faz uma avaliação e inclui o paciente no grupo. Os pacientes que ingressam podem participar por tempo indeterminado.

Coordenadora da iniciativa e professora da instituição, Lane Krejcova explica que, na área da pesquisa, os estudiosos tentam encontrar respostas para questões pontuais, a exemplo de saber até que ponto é possível retardar alguns dos sintomas da doença durante a progressão. Enquanto isso, na extensão, há uma troca com a comunidade: o atendimento clínico no âmbito nutricional, psicológico, neuropsiquiátrico, fisioterapêutico e outros, e por meio da própria terapia em dança, desenvolvida justamente para os sintomas da pessoa com Parkinson, já que várias alterações no corpo são características da doença.

“Nós já temos alguns resultados experimentais. Trabalhamos desde 2015, temos até trabalhos publicados que demonstram que temos uma redução muito significativa da apresentação de quadros de depressão, apatia e até a manutenção do nível cognitivo das pessoas, já que a dança tem um estímulo cognitivo em relação às questões motoras, como a postura, o equilíbrio, a marcha, que são muito características da doença. Conseguimos retardar um pouco e amenizar esses sintomas por meio dessa prática”, afirma.

Um dos sintomas do Mal de Parkinson, segundo Lane, é que aos poucos o paciente vai diminuindo as possibilidades de socialização, algo importante tanto para o físico como para o mental. Na dança, além de uma terapia, os participantes também têm uma oportunidade de socialização, de fazer amigos, de estarem presentes junto com pessoas que compartilham das mesmas histórias, dos mesmos problemas e isso se torna algo positivo para a saúde mental. Este, inclusive, é sempre um dos primeiros resultados percebidos pelo grupo nos pacientes.

A professora de dança Savana dos Santos ressalta que a metodologia terapêutica usada no grupo trabalha vários pontos importantes para o tratamento, como a parte cognitiva e também a socialização, que são muito atingidas pelo Mal de Parkinson. “Usamos essa metodologia como uma terapia para tirar eles dessa ida e vinda de hospital. Aqui é um momento para eles melhorarem a condição, mas, ao mesmo tempo, se divertirem e esquecerem um pouco de que se trata de uma doença. Eles se divertem e se sentem gratificados, assim como nós, professores”, relata.

Os únicos requisitos para participar são: ter o diagnóstico de Parkinson; e estar em tratamento farmacológico. “Nós não substituímos o tratamento do neurologista, então o paciente tem que estar em tratamento e tem que ser acompanhado pelo médico. Oferecemos uma terapia adjuvante, ou seja, ela vai permanecer com seu tratamento farmacológico, com o seu acompanhamento neurológico e nós vamos auxiliar nesse processo terapêutico”, conta a coordenadora do projeto.

Uma vez ao ano, ao menos, uma equipe multidisciplinar, formada por professores, educadores físicos, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos e terapeutas ocupacionais, faz um acompanhamento clínico por meio de avaliações para saber como os pacientes estão progredindo em cada um desses sintomas.

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