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Pela cidade, arte urbana ensina a viver melhor

Projetos se propõem a mudar estética da cidade aliando à conscientização

Elisa Vaz

A beleza das cidades vai muito além de construções históricas e prédios que retratam a arquitetura moderna. Intervenções artísticas, seja por profissionais renomados ou mesmo a comunidade local, podem dar vida e cor a ambientes antes considerados “apagados” e, ao mesmo tempo, levar mensagens importantes às pessoas que andam pelas ruas. Segundo especialistas, a ideia dessas mobilizações urbanas é tirar a arte de espaços fechados como teatros e museus e levar para o dia a dia, evidenciando a arte cotidiana.

Na capital paraense, há vários projetos que utilizam essa técnica para alcançar a sociedade e levar uma ideia de melhoria e conscientização sobre assuntos importantes para a população como um todo. Um deles é o Street River, liderado pelo artista visual paraense Sebá Tapajós, que surgiu em 2015, para chamar atenção sobre a ausência do poder público para solucionar problemas de saneamento, acesso à água potável e estabilidade de energia elétrica nas ilhas próximas a Belém. O trabalho dele junto às comunidades ribeirinhas começou com o grafite de cinco casas na Ilha do Combu e hoje é permanente.

Sebá conta que, além dele, outros artistas nacionais, com reconhecimento mundial de seus trabalhos, fazem parte do projeto com o mesmo objetivo: chamar atenção para uma Amazônia até então invisível. “Usamos cores vivas e expressões de elementos essenciais e urgentes da vida amazônica e ribeirinha. No meu trabalho, tento retratar a Amazônia nos elementos vivos determinantes desse bioma tão rico, como rios margeados, onças-pintadas, casas de palafitas de ribeirinhos, araras e pássaros nativos, peixes, plantas, seres da floresta e das águas doces. Todos esses elementos compõem não só o imaginário, mas também a realidade pulsante dessa Amazônia que, infelizmente, é cada vez mais desmatada, explorada e queimada. Como sempre, meu objetivo é esse: levar o olhar para dentro da gente, lembrar de cuidar e preservar essa mata que é nosso futuro”, declara o artista visual.

Levar ao mundo a ideia de uma Amazônia profunda, cheia de vida, diversidade e cultura ancestral, provocando emoções e reflexões de todos os tipos em quem aprecia a arte, é a melhor parte, na opinião de Sebá. Em 2017, o Street River se tornou a primeira galeria de arte a céu aberto dentro da Amazônia, quando foi feita uma grande ação utilizando a arte como ferramenta de transformação de forma prática e efetiva. Vários artistas da cena atual se reuniram para retratar, por meio do grafite, a vida das pessoas que vivem às margens dos rios da região amazônica na Ilha do Combu, em Belém. Foram mais de 10 casas grafitadas com um tipo de tinta impermeável, que preserva a madeira das casas de palafitas.

Hoje, Sebá afirma que uma das reivindicações, além do emprego aos barqueiros locais, são os barcos-lixo, para recolhimento dos resíduos sólidos produzidos na Ilha, que se tornou ponto turístico e já recebe milhares de pessoas nos restaurantes montados do outro lado do rio. “Por estarmos falando de Áreas de Proteção Ambiental (APA), essas ilhas deveriam ter um controle de determinada quantidade de pessoas por final de semana e ter um apoio mais focado nos restaurantes dos moradores e não das pessoas de fora que foram ganhar dinheiro sem retribuir ou retornar para a floresta e para o povo o lucro que obtém dela. Estão fazendo até condomínio lá, mas ninguém se importa com o saneamento, construção de banheiros para moradores ou acesso à água potável. Também deveria haver um controle da entrada de lanchas e jet-skis. Isso e outras questões precisam ser vistas com urgência”, diz. Um dos objetivos do Street River, como explica Sebá Tapajós, é conscientizar a população paraense acerca da devastação que a movimentação intensa causa nas ilhas com a exploração turística.

Outro projeto local que usa a arte como mecanismo de conscientização social é o Puxirum, um grupo que se formou em Belém baseado na ideia de contribuir com uma cidade melhor. A arte e a vontade de despertar a consciência ambiental foi o que uniu os integrantes, que se movimentam por meio de ações sociais. A primeira foi realizada no final de 2020, na esquina das travessas Rui Barbosa e 28 de Setembro, no bairro do Reduto. O grupo pintou bueiros em prol da conscientização dos descartes irregulares de lixo nas ruas.

“A beleza da arte e das cores, junto com uma pequena homenagem às nossas riquezas paraenses, hoje chama a atenção para o fato de que o lixo jogado na rua não desaparece em um passe de mágica. Além disso, ele acarreta sérios prejuízos, como alagamentos, entupimento da rede de esgoto e poluição de rios e mares. Vamos repensar aquele papelzinho de bombom jogado no chão da próxima vez?”, convidam os participantes.

Já a segunda ação, no início deste ano, foi para pintar placas e fazer sinalizações de conscientização às pessoas, com frases como “Pequenas atitudes importam”, “Mano, não esculhambe tua rua”, “Preserve, repense e redute-se” e “Égua, cuide do seu bairro”, entre outras intervenções artísticas.

Por meio das redes sociais, os integrantes fazem reflexões sobre a importância de se ter um olhar mais sustentável: “Somos gigantes quando entendemos que a capacidade de transformar o que é nosso está em nós. Basta a gente se unir e partir pra ação. Pequenas atitudes importam. Quando você se dá conta de que pertence a um todo muito maior do que o seu núcleo familiar, começa a entender um pouco mais sobre autorresponsabilidade. Cuidemos de nossas casas, mas também da nossa rua, da nossa cidade, do nosso país e cuidemos uns dos outros. Com um pouco de cor, de informação, de arte e de amor, pois pequenas atitudes importam”, comenta o Puxirum. Em outra postagem, os integrantes dizem que, em sociedade, é preciso desenvolver um senso de contribuição, coletividade e pertencimento. 

Uma das integrantes, Lorena Soares, diz que esse é o principal objetivo do projeto: levar o senso de pertencimento à sociedade por meio da arte. "A nossa visão é diferenciada. A cultura brasileira é muito precária nessa questão da cidadania. Isso gera um profundo senso de desresponsabilização, as pessoas acham que seu lixo é problema da Prefeitura, que a rua é problema dos governantes. Não estou eximindo eles de culpa, mas existe esse comportamento em relação às questões sociais e ambientais", comenta.

Na avaliação de Lorena, o senso de pertencimento da população é muito reduzido, e o grupo se diferencia porque esse senso é maior. "A gente faz parte da cidade, do mundo. Quero cuidar da cidade como cuido do meu quarto, dos meus pertences, do meu carro. A arte faz com que você pense, reflita, saia do modelo de mentalidade de aceitar e fazer tudo como todo mundo faz. A arte gera senso crítico, faz você questionar, te tira do piloto automático, esse é nosso objetivo, levar arte e fazer as pessoas pensarem e terem esse senso de pertencimento", ressalta a integrante do Puxirum. Para o futuro, Lorena conta que a ideia é expandir o projeto para outros bairros e fazer parcerias com coletivos diferentes.

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