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Escritoras falam sobre desafios e superação no mercado literário

Na luta pelo espaço a que têm direito, mulheres apostam em alternativas mais independentes

Ana Carolina Matos

Se a literatura produzida no Pará enfrenta dificuldades pela falta de incentivo financeiro e de formação de leitores, ser mulher e escritora, é um desafio duplo. O preconceito em um mercado comandado por homens - assim como todos os outros segmentos, do comércio à produção cultural - mostra-se ainda forte mesmo em uma época em que as mulheres têm se colocado também como protagonistas na sociedade e lutando, à próprio punho, pelo espaço a que têm direito. 

Um caso emblemático de Joanne Rowling, que usou o pseudônimo J. K. Rowling aconselhada por um editor - para evitar recepções preconceituosos contra sua hoje conhecida mundialmente série de Harry Potter - dá o tom do longo caminho percorrido por escritoras no segmento da literatura e isso em mercados do mundo inteiro.

Apesar de considerar que teve um caminho com apoio de outros profissionais da literatura, Roberta Spindler avalia que o percurso a ser percorrido ainda é extenso. "Sempre tive muita ajuda de pessoas legais, que sempre me incentivaram. Quando comecei, eu não sabia de nada, não sabia sobre o mercado editorial... Então tive várias pessoas que ainda ajudaram a melhorar minha escrita. Temos muitas mulheres publicando atualmente. Tem crescido muito o número de autoras, principalmente de livros juvenis com essa nova safra. A gente tem conseguido cada vez entrar no mercado, mas isso ainda precisa crescer bastante", avalia.

image Autora de 'Hérois de Novigrath', Roberta Spindler ressalta crescimento no número de escritoras (Divulgação)

A autora, que produz majoritariamente literatura fantástica, ingressou no mercado literário em 2011, com a publicação de "Contos de Meigan: a fúria dos Cártagos", em parceria Oriana Comeshana. Depois disso, a autora lançou, em carreira solo, os livros "A Torre Acima do Véu", em 2014, e "Heróis de Novigrath", em 2018.

"Tem crescido muito o número de autoras, principalmente de livros juvenis"

Além disso, a escritora também já publicou diversos contos e antologias ao longo da experiência no campo literário. Para Roberta Spindler, o mercado é muito diferente do cenário em que começou, há nove anos. "Quando eu comecei em 2011, eu não conhecia nenhum autor, não conhecia ninguém e ao longo desses anos fui descobrindo outras pessoas, grupo de autores que escrevem fantasia e terror e acho que a gente tá mais forte e tem mais contato. Agora temos vários autores e autoras que estão publicando, temos mais eventos pra participar e divulgar nosso trabalho, ter contato com o público", comenta.

Até pelos percalços encontrados no percurso, a escritora paraense Monique Malcher ressalta a importância do protagonismo feminino na busca pelos próprios espaços. "No Pará, a literatura produzida por mulheres resiste e tem criado espaços para além dos institucionais, que sim deveriam não ser apenas em um evento aqui ou acolá. Temos poucos editais de incentivo para publicações, mas vejo muitas mulheres publicando zines e plaquetes de forma independente. Também temos mulheres paraenses publicando livros, eventos que acontecem no centro e na periferia e um número bem maior de sarau de poesia. Precisamos falar das coisas que têm sido feitas por quem agarrou a vontade nos dentes e continuar cobrando das instituições, que ainda não nos dão nem o mínimo", avalia.

image A escritora Monique Malcher ressalta que mulheres devem ter persistência na hora de ingressar no mercado literário (Divulgação)

Para a autora, que diz que escreve "desde que a literatura se tornou uma necessidade" para lidar com as questões que a rondavam não só como um ser, mas como mulher, um bom termômetro da força que vem se desenhando no interesse de cada vez mais mulheres pela escrita foi a procura de cerca de 40 autoras pelo seu último curso de auto-publicação. "Isso não é pouco. Estamos escrevendo, e tentando nos organizar", pontua.

A diferença entre escritores e escritoras, para Monique Malcher, é enquanto os homens se inspiram rapidamente em outros homens, as mulheres ainda precisam descobrir umas às outras como referencial. "O homem escritor na maioria tem o medo de não ser igual seus mestres. Nós descobrimos as mulheres como referência um pouco mais tarde, porque a pressão social nos enclausura. Não é nada fácil primeiro reconhecer-se como escritora. Você cresce com um cânone posto, uma prateleira de homens", destaca.

"Nós descobrimos as mulheres como referência um pouco mais tarde, porque a pressão social nos enclausura"

"Uma vez ouvi de uma aluna nas aulas de escrita que ela acreditava quando criança que para escrever precisava ser um homem. Eu também acreditei por um bom tempo. A escrita nos é impedida de várias formas, mas temos muita água nas palavras e isso arrebenta qualquer barreira se nos unimos (...). Na maior parte do tempo é uma luta para entender seu espaço e não deixar que ninguém pise ou usurpe o que você conquistou. A autoestima sempre foi a sombra que me massacrava", relembra.

A profissional, que em abril deste ano lança o livro "Flor de Gume" pelo selo Ferina, aconselha que mulheres que querem lançar-se na escrita devem persistir e, antes de tudo, parar de ver seu trabalho como "insuficiente" ou "péssimo".

"Não foque tanto no que ainda não consegue, mas no que você já caminhou até aqui"

"Ninguém começa sabendo todos os caminhos, é preciso de mapas, bússolas e outras mulheres para dividir o peso. Esteja aberta para comentários de pessoas que estejam conectadas com o que você acredita, mas saiba defender também suas ideias com bons argumentos. Escreva todos os dias. Leia mulheres próximas de você. Faço cursos, se puder, com mulheres. Valorize o seu trabalho. Antes de criar suas personagens, estude mais. Seja gentil com você. Nenhum texto nasce pronto, edite, releia, quantas vezes for necessário. Não espere por inspiração. Não foque tanto no que ainda não consegue, mas no que você já caminhou até aqui", pontua.

Confira dez livros de autoras que vale a pena conhecer:

  1. "Guardiões do Império" - Giuliana Murakami
  2. "Onde é que eu estou?" - Heloisa Buarque de Hollanda
  3. "O ponto cego" - Lya Luft
  4. "Os Testamentos" - Margaret Atwood
  5. "Heróis de Novigrath" - Roberta Spindler
  6. "Hibisco Roxo" - Chimamanda Ngozi Adichie  
  7. "Carta a minha filha" - Maya Angelou
  8. "Os livros de Ventura" - Bruna Guerreiro
  9. "Tudo nela brilha e queima", de Ryane Leão
  10. "Mulheres e caça às bruxas" - Silvia Federici
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