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Desenvolvimento da Amazônia passa pela inovação tecnológica

Com força do empreendedorismo, startups buscam soluções para problemas da região

Elisa Vaz

Liberal Amazon

Abrigo da maior biodiversidade do planeta, a região amazônica possui um ecossistema rico em plantas, animais e microrganismos – e cerca de 60% de seu território fica localizado no Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dentro deste extenso território, na maior floresta tropical do planeta, são encontradas matérias-primas suficientes para desenvolver tecnologias únicas, capazes de tornar a região uma porta de entrada para investimentos inovadores.

 

As startups, empresas de base tecnológica que buscam soluções para produtos e serviços, têm ganhado cada vez mais espaço na região, e especialmente no território paraense. Uma delas, a Biomimética Biotecnologia, desenvolve uma película comestível. Imperceptível ao olho humano, e feita a partir de cascas de frutas, ela prolonga o tempo de prateleira dos alimentos. Com três sócios, o negócio foi criado em 2019, em uma competição de empreendedorismo organizada pela Universidade Federal do Pará (UFPA), a Inove+. E desde então, tem sido aprimorado - e agora entra nas etapas finais de desenvolvimento para ingressar no mercado.

Aumentar o tempo de prateleira das bananas, tomates e maçãs é o maior foco da empresa, resume o sócio e diretor executivo Jonas Cunha da Silva, que é engenheiro de bioprocessos: “Já conseguimos cerca de quatro dias a mais, em temperatura ambiente. Tudo isso graças aos nossos componentes bioativos. Além das cascas de frutas, utilizamos diversos ingredientes naturais da Amazônia brasileira”. O principal cliente a testar o avanço é o distribuidor de produtos hortifrúti, que leva o alimento para toda a cadeia. “Temos cerca de nove pessoas integrantes, a maioria engenheiros de bioprocessos atuantes na área de pesquisa, desenvolvimento de produto e produção”.

O crescente aumento de resíduos orgânicos, principalmente por parte do agronegócio, e o grande desperdício de alimentos no mundo todo, foram os fatores que motivaram o time a agir. Um dos fundadores teve a ideia de fazer a película depois de estudar sobre biomateriais. Apresentando a teoria a outros dois amigos, que estudavam sobre extração de componentes de casca de frutas, o projeto nasceu, com o foco inicial em participar da competição universitária, na qual ficou em primeiro lugar. Os outros sócios da Biomimética Biotecnologia são os engenheiros de bioprocessos André da Luz de Freitas, que é diretor de pesquisa, e Patrícia Oliveira Santos, diretora de produção.

(Reprodução)

“Para garantirmos um futuro mais sustentável para o nosso país, precisamos investir em produtos com alto valor agregado, como essa película. Eu vejo muito potencial no que fazemos, pois a nossa equipe é bem engajada e já desenvolveu outros produtos inovadores com propostas semelhantes. Nós temos bastante conhecimento sobre o assunto e sabemos da relevância desse tipo de produto para o país e o mundo. Eu acredito muito no nosso Brasil e vejo que somos um dos países que alimentam o resto do mundo. Mas, para continuarmos dessa maneira, precisamos garantir alimentos seguros e de qualidade para todos”, opina o engenheiro de bioprocessos Jonas Cunha.

Segundo Jonas, uma vantagem de desenvolver a película dentro da Amazônia é a enorme diversidade, o que permite que o produto incorpore ingredientes naturais, com propriedades bioativas que podem proteger os alimentos de forma totalmente funcional e segura, sem a necessidade de sintetizarmos produtos químicos danosos ao meio ambiente.

Além disso, também há uma oportunidade na atenção à diversidade do setor de fruticultura, com alimentos que só existem em estados próximos da Amazônia - conhecidos no exterior como superfrutas. Jonas explica que muitos desses frutos ainda não são conhecidos pelo curto tempo de prateleira que possuem: eles estragam antes mesmo de chegar a outros estados ou países. O produto criado pela Biomimética pode ajudar a mudar este cenário e aumentar a renda das comunidades que dependem desse tipo de comércio.

Criar ideias sustentáveis é o que vai garantir vida longa a negócios e projetos, avalia o diretor executivo da startup: “O mercado está ficando cada vez mais competitivo e, hoje em dia, não é só sobre fazer dinheiro, mas se manter lucrativo ou em pé financeiramente pelas próximas décadas, sem agredir o ambiente ou causar instabilidades sociais. Uma ideia sustentável deve partir de três pilares: social, financeiro e ambiental. Com ideias assim, teremos um planeta menos desigual para todos, mais ambientalmente agradável de se viver, com menos desastres e menos tragédias e instabilidades econômicas”, avalia Jonas Cunha.

Uma ideia sustentável deve partir de três pilares: social, financeiro e ambiental" - Jonas Cunha, engenheiro de bioprocessos.

Na opinião dele, investimentos de atores públicos e privados é o que falta para que ideias sustentáveis tenham sucesso. Jonas defende que o Estado ajude a desenvolver a bioeconomia e, em parceria com empresas já consolidadas, dê apoio para que esses projetos tenham a cara do mercado, e não sejam apenas ideias.

Tecnologia transforma a agricultura familiar

Desenvolver um sistema que pudesse rastrear qualquer produto originado da agricultura familiar é o que motivou o surgimento da Amachains, startup que hoje tem uma plataforma de gestão de rastreabilidade com marketplace. O rastreamento de produtos e serviços é feito utilizando blockchain e compliance para transformar as cadeias produtivas do agronegócio e da bioeconomia em redes de negócios sustentáveis. O time começou a trabalhar em janeiro de 2018, mas apenas em outubro de 2019 constituiu a empresa. Hoje, a atuação se dá nas cadeias produtivas do agronegócio e da bioeconomia, mas a empresa já teve experiência com a cadeia da mineração.

Alexandre Bezerra é engenheiro de produção e técnico em agronegócio (Arquivo pessoal)

“A principal solução é uma plataforma que permite rastrear produtos, serviços e indicadores de impacto ligados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). A proposta da Amachains tem origem na realidade sofrida dos produtores e produtoras da agricultura familiar que, apesar de várias ações de Organizações Não Governamentais (ONGs), empresas e pessoas a seu favor, não conseguem deixar de ser a parte mais fraca do agronegócio”, avalia o engenheiro de produção e técnico em agronegócio Alexandre Bezerra, que é fundador e CEO da startup. “Percebemos que podíamos ajudar e decidimos atacar esse problema com um sistema de rastreabilidade que pudesse ser dado de graça para esse que é um dos mais importantes players do agronegócio e da bioeconomia do Brasil. Somos um projeto social com o objetivo de gerar justiça, prosperidade e dignidade para todos os produtores e produtoras”.

Com um plataforma inovadora e disruptiva, a Amachains pode colocar a região amazônica como destaque nacional em inovação e tecnologia, permitindo que todos os produtores e produtoras do agronegócio e da bioeconomia, extrativistas ou não, possam ter acesso a tecnologia de ponta a preços acessíveis - e de graça para aqueles que tiverem o devido registro de agricultura familiar regularizado.

Sem dúvida nenhuma, a parte de maior satisfação e potencial é poder incluir os pequenos produtores e produtoras da agricultura familiar nessa jornada pelo desenvolvimento sustentável com inovação" - Alexandre Bezerra, engenheiro de produção e técnico em agronegócio.

Na avaliação de Alexandre, estão sendo construídas soluções que entregam muito valor para todos os atores das cadeias produtivas, principalmente para a agricultura familiar, ao mesmo tempo em que se inova em tecnologias de ponta, como a blockchain. “A forma como utilizamos a blockchain e com ela construímos nossa plataforma e nosso negócio é inovadora no Brasil e no mundo. Sem dúvida nenhuma, a parte de maior satisfação e potencial é poder incluir os pequenos produtores e produtoras da agricultura familiar nessa jornada pelo desenvolvimento sustentável com inovação. Nossa plataforma foi desenvolvida para escalar de forma nacional e internacional”.

O time hoje conta hoje com 10 pessoas – cresceu 100% em número de colaboradores em 2021 e deve crescer ainda mais em 2022, segundo o CEO. Alexandre diz que, cada vez mais, é preciso criar startups que resolvam problemas que causam o aquecimento global e promovam mais desenvolvimento sustentável. Para ele, a empresa que não cuidar do planeta, seguindo princípios da boa governança, com atenção real aos fatores ambientais e sociais, assinará uma “sentença de morte”. Por isso, ele defende que todos devem se antecipar e dar atenção especial à Amazônia.

Projeto busca reduzir custos para produtores e compradores

Também empoderando produtores, além de compradores, outra startup, a Directto, tem o propósito de acabar com a necessidade de intermediários na comercialização de produtos da bioeconomia da Amazônia. Por meio de uma plataforma, o time, que atua no território paraense há cerca de um ano, faz com que o processo de compra e venda aconteça de forma direta, eficiente e transparente, sem precisar de terceiros - o que garante uma receita maior e preços mais justos ao vendedor e ao comprador, além de uma fonte de fornecedores confiáveis e de qualidade.

Rodrigo Gomes de Oliveira é cofundador e CEO da Directto (Arquivo pessoal)

O cofundador e CEO da Directto, Rodrigo Gomes de Oliveira, que é empreendedor com expertise em growth hacking, conta que o projeto surgiu por meio de um amigo, que morava em Portugal - e, por não ter um plano de carreira definido, começou a pensar em exportar produtos para o país. Quando decidiu trabalhar com o açaí, entrou em contato com indústrias locais. “Eu vi como funcionava esse processo do intermediário que compra a produção aqui e vende lá fora. E aquilo me pareceu pouco eficiente da forma que era feito. Comecei a estudar e fiz uma reflexão sobre o modelo de marketplace, se não faria sentido aplicar esse conceito no cenário de exportação do açaí ou de outro produto. Entendi que ali havia uma oportunidade de agregar valor para as duas pontas”.

Embora existam várias cadeias produtivas envolvidas na bioeconomia da Amazônia, todas elas sofrem o mesmo problema, avalia Rodrigo: isso porque, no final das contas, o produtor tem como expertise a produção, e não a venda ou gestão financeira. Este cenário, segundo aponta o CEO, faz com que a comercialização seja um problema, e por isso eles acabam tendo uma desvantagem. A ferramenta de mercado, portanto, tem um potencial gigantesco de agregação de valor para a região. E o modelo de negócio vai funcionar tanto para a exportação como para o mercado interno, adianta o cofundador. Desta forma, os produtores terão mais facilidade em encontrar novos fornecedores, e ainda ganham um processo de compra mais transparente.

Acho que a nossa floresta traz muitos desafios, mas empreendedorismo é isso: as empresas existem para resolver problemas" - Rodrigo Gomes de Oliveira cofundador e CEO da Directto.

“É um diferencial para a Amazônia, porque essa comunidade produtora da bioeconomia da região vai se desenvolver economicamente, e isso vai ser muito bom para que a gente consiga desenvolver não só as cadeias produtivas, mas também manter a floresta em pé, que é o conceito dos produtos da Amazônia. Então, isso tem um impacto social, econômico, social e ecológico muito grande. É fundamental criar ideias sustentáveis que valorizem a cultura amazônica. Acho que a nossa floresta traz muitos desafios, mas empreendedorismo é isso: as empresas existem para resolver problemas”.

Parceria cria ecossistema de aceleração de startups

Todos esses três projetos fazem parte da Associação Paraense de Inovação e Tecnologia (Açaí Valley), que atua desde 2019 no Pará, com o objetivo de reunir ideias empreendedoras. A iniciativa surgiu a partir da necessidade de discutir inovação e empreendedorismo no Estado. Hoje, a entidade possui, aproximadamente, 200 startups mapeadas, com cerca de 420 participantes. Na última semana, o Grupo Liberal e a Açaí Valley firmaram uma parceria para a criação da LibVenture, o primeiro ecossistema de aceleração de startups do Norte ligado a um grupo de comunicação. A meta é fomentar, incentivar e valorizar o ambiente de inovação nas empresas.

A ideia, segundo Aline Viana, diretora de mercado do Grupo Liberal, é que cada vez mais o tema da inovação ganhe visibilidade. E a parceria com o Açaí Valley vai expandir esse espaço. “O objetivo é trazer o máximo possível do ecossistema de inovação para dentro do Grupo. Hoje, você tem um mundo de possibilidades aqui no Pará, várias startups, e não consegue gerar tanta visibilidade. O objetivo é trazer esse conceito e investir em inovação em 2022. O Açaí Valley é a principal associação de startups no Estado e queremos fortalecer essa relação junto com eles”.

Um ecossistema de inovação precisa de atores fortes, atuantes e de muita colaboração e união entre eles, para que as startups possam surgir, se desenvolver e crescer" - Alexandre Bezerra, engenheiro de produção e técnico em agronegócio.

Alguns desses projetos auxiliam a associação com mentorias para startups iniciantes, repassando um pouco da experiência e ajudando o desenvolvimento de novas ideias na nossa região, como é o caso da Amachains. “Um ecossistema de inovação precisa de atores fortes, atuantes e de muita colaboração e união entre eles, para que as startups possam surgir, se desenvolver e crescer. A Açaí Valley é a cola que une todos esses atores. Consideramos que ela foi imprescindível para alcançarmos os resultados que temos hoje”, assevera Alexandre Bezerra.

Por sua vez, Jonas Cunha, da Biomimética, vê o Açaí Valley como um networking de oportunidades. “A associação tem grandes ambições para o futuro, mas hoje tem sido um lugar que funciona como rede de apoio entre empreendedores do Pará e que ajuda na comunicação com diversos atores públicos e privados. Estamos sempre trocando ideias sobre o mercado, pitching para investidores e outras coisas”, comenta.

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