Imagem de mucuras à venda em feira de Cametá revela crime ambiental, diz Polícia Civil

O Ministério Público notificou a prefeitura do município para que realize fiscalização para coibir a venda de carne de animais silvestres

Fernando Assunção (Especial para O Liberal) e Saul Anjos
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Uma imagem registrada na Feira Municipal de Cametá, no nordeste do Pará, tem causado grande repercussão nas redes sociais. A foto, publicada por um internauta paraense, mostra mucuras sendo vendidas ao lado de peixes e outros alimentos. Segundo a Polícia Civil, a comercialização de animais silvestres sem autorização dos órgãos competentes configura crime ambiental.

Na postagem feita na rede social X (antigo Twitter), o autor brincou com a diferença cultural local. “O pessoal fala muito dos alimentos exóticos da China e países asiáticos, mas mal sabem o nível da feira de Cametá-PA”, escreveu, acompanhado da foto que mostra carcaças do animal expostas em uma barraca.

Embora tenha causado estranhamento na internet, o consumo de mucuras — também conhecidas como saruês ou gambás — não é novidade na região. “Aqui, principalmente nas comunidades ribeirinhas, esse consumo faz parte da cultura local. Por isso, é comum ver essas cenas nas feiras municipais”, explicou o internauta.

A Redação Integrada de O Liberal confirmou que o registro foi feito na feira de Cametá. Uma moradora da cidade, que preferiu não se identificar, afirmou que a comercialização e o consumo de mucura e outras “carnes de caça” são comuns, e até culturais, em feiras e restaurantes locais.

Procurada pela reportagem, a Prefeitura de Cametá também confirmou que o registro foi feito na cidade. Em nota, a Secretaria de Meio Ambiente e da Vigilância Sanitária afirmou que repudia a prática ilegal da venda de animais silvestres e que os responsáveis serão notificados, autuados e terão os animais apreendidos, quando for o caso.

“A Prefeitura reforça que não compactua com essa prática ilegal e desrespeitosa ao meio ambiente e à saúde pública, e continuará fiscalizando os infratores, acarretando na perca da licença e acusação de crime ambiental”, concluiu o comunicado.

A Polícia Civil informou que ainda não há registro oficial do caso na delegacia da região, mas reforça que a venda de animais silvestres sem autorização é crime ambiental, com pena prevista de seis meses a um ano de detenção, além de multa.

Ministério Público apura comércio de animais silvestres em Cametá

Nesta segunda-feira (7), o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) instaurou um procedimento para apurar as denúncias de comercialização de carne de animais silvestres na feira e no mercado municipal de Cametá. O órgão reforçou que a prática é ilegal e crime ambiental.

O objetivo do procedimento é acompanhar e fiscalizar as ações da prefeitura de Cametá de proteção do meio ambiente e da saúde pública. A 1ª Promotoria de Justiça de Cametá notificou a Vigilância Sanitária Municipal, a Secretaria Municipal de Saúde e a Procuradoria-Geral do Município para que realizem fiscalização nos espaços para coibir a venda de carne de animais silvestres.

O MPPA também requisitou, no prazo de 30 dias, informações detalhadas sobre ações de fiscalização já realizadas ou programadas envolvendo produtos de origem animal, bem como relatórios circunstanciados de eventuais apreensões, interdições ou sanções aplicadas no último ano.

Riscos à saúde e desinformação

Além do aspecto legal, o consumo da carne da mucura traz riscos à saúde pública, incluindo a transmissão de zoonoses — doenças que podem ser transmitidas entre animais e seres humanos, como a leptospirose.

“Essa carne não tem origem legal, ou seja, não provém de animais criados em cativeiro com controle sanitário, o que aumenta o risco de transmissão de leptospirose e verminoses. A carne comercializada sem os cuidados adequados representa uma ameaça à saúde pública”, alerta a professora e médica veterinária Ana Silvia Ribeiro, coordenadora do Centro de Triagem e Reabilitação de Animais Silvestres (Cetras) da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra).

O animal também sofre com a desinformação. A semelhança da mucura com ratos gera preconceito e ataques. Ana Silvia explica que a mucura, de hábito noturno, pertence à classe dos marsupiais — a mesma do canguru — e não tem relação com os roedores. O animal também desempenha um papel importante no equilíbrio ambiental.

“Não é um animal agressivo nem persegue humanos. Seu comportamento é nômade, buscando alimento e abrigo. Quando ameaçada, a mucura pode abrir a boca exibindo seus caninos grandes, o que assusta, mas só morde para se defender se for tocada”, esclarece.

Ribeiro destaca que a mucura é onívora, alimentando-se tanto de plantas quanto de animais, e exerce um papel importante no equilíbrio ambiental, principalmente no controle de espécies venenosas.

“Ela consome insetos, grãos, escorpiões e serpentes peçonhentas, ajudando a controlar essas populações. A ausência da mucura pode causar aumento desses animais perigosos. Além disso, ao dispersar sementes e defecar, contribui para a regeneração da floresta”, reforça a professora.

Para combater os mitos e desinformações sobre a mucura e outras espécies, Ana Silvia cita o projeto “Lendas e Realidades: os mitos amazônicos e o impacto que provocam”. A iniciativa visa conscientizar sobre como a ação humana pode influenciar positiva ou negativamente a conservação da fauna silvestre. O projeto foi aprovado pelo Programa Estadual de Incentivo à Cultura Semear, criado pelo Governo do Pará, que estimula a consciência, o conhecimento e o respeito pela cultura local.

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