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Dia Internacional da Mulher Negra Latinoamericana e Caribenha reforça o protagonismo feminista da mulher preta

Data é uma representação das lutas de mulheres negras, que vão além dos desafios que muitas outras mulheres já enfrentam

Ana Carolina Matos

Celebrado neste 25 de julho, o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha marca o protagonismo feminino negro em uma luta contra as opressões de gênero e raça. A necessidade de um olhar mais cuidadoso é corroborada quando atenta-se para as estatísticas de violência. Em 2020, o Brasil teve 1.350 feminicídios. Deste total, 61,8% das vítimas eram mulheres negras, o que representa a morte de 834,3 pessoas. 

Os dados da 15ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em julho de 2021 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, só reafirmam que a data, que nasceu de um encontro na República Dominicana, em 1992, aponta a necessidade de reflexão da luta diária e o caminho bem mais longo a ser percorrido por este grupo da sociedade.

Para a pesquisadora Zélia Amador, o espaço geograficado partilhado por estas mulheres é interligado também "não só na questão do racismo, mas também da discriminação racial e na discriminação de gênero". Militante do movimento negro, co-fundadora do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará (Cedenpa), participante da Operativa Nacional da Coalizão Negra por Direitos e professora emérita da Universidade Federal do Pará (UFPA), Amador aponta que a data é importante para lançar uma reflexão.

"É necessária para fazer com que a sociedade entenda as diversas opressões que recaem sobre essas mulheres, repense, reflita e busque uma saída justa pra eliminar as diversas discriminações que transformam esta ser humano num ser vulnerabilizado", diz Zélia.

Para ela, a discussão precisa ser amplificada para outros grupos sociais. "Essa questão não diz respeito somente ao grupo que sofre. É uma questão que tem que preocupar a todas as pessoas que estão empenhadas em transformar a sociedade numa sociedade justa e igualitária. Não é uma luta só das mulheres. É importante mobilizar para que se reflita e se busque novos caminhos", sustenta

Segundo a professora, é comum associar o feminismo negro apenas ao movimento realizado nos Estados Unidos, mas essa é uma pauta que também é trazida por mulheres negras de outros continentes. "Aos poucos, a gente vai, cada vez mais, organizando esse pólo, essa parte do continente. Quando a gente ouve falar de feminismo negro, a gente sempre tem pensado nas estadunidenses, mas existem mulheres nessa região do continente que estão na luta. E tanto estão que conseguiram instituir o 25 de julho como dia de luta das mulheres dessa região", afirma. 

No mesmo dia, o Brasil celebra o Dia da Mulher Negra, que foi instituído no dia 2 de junho de 2014, por meio da Lei Nº 12.987. A data também celebra também o Dia Nacional de Tereza de Benguela, líder quilombola de destaque, que resistiu à escravidão, lutando pela comunidade negra e indígena que vivia sob a liderança dela, ao longo de duas décadas, no século XVIII.

 

Desafios vividos por mulheres negras precisam são lembrados e marcados numa data específica

Lívia Noronha, coordenadora da Mulher de Belém (Combel) e militante do movimento negro, explica que o Dia Internacional da Mulher, celebrado no dia 8 de março, não contempla os desafios vividos por mulheres que são negras. "Nós temos especificidades. Desde a saúde integral da mulher negra, com relação à segurança, ao acesso aos direitos... Como nós não nos sentimentos inteiramente contempladas, somente com o termo mulher, com aquilo que é voltado para as mulheres, que historicamente tem sido voltado para mulheres brancas, nós precisamos de um dia que marcasse a nossa resistência, a nossa luta e que fosse também um espaço para debates, para que nós nos olhássemos nos nossos olhos e discutíssemos as nossas pautas e as nossas prioridades", enfatiza.

Segundo ela, enquanto a ocupação de uma mulher em um espaço de poder ainda é pequena, quando isto ocorre, o número de pessoas não-brancas é quase inexistente. "Se olharmos o mercado de trabalho, quem são as mulheres que hoje já ocupam a maioria dos cargos de gestão, dos cargos de poder? São mulheres brancas. Se olharmos pras universidades, quem são as professoras universitárias? A maioria são mulheres brancas. Mas se a gente olha pra informalidade, se a gente olha pros centros, pros CRFs, pros presídios femininos, a maioria é de mulheres negras", exemplifica.

Noronha explica que há uma somatória de opressões a serem combatidas. "Nós vivemos numa sociedade que é estruturalmente racista e machista. Nós, mulheres negras, sofremos a intersecção entre o machismo e o racismo. É uma soma. O machismo que nós sofremos é diferente do machismo que as mulheres brancas sofrem, porque ele já vem somado com o racismo", aponta.

Para ela, os problemas precisam ser apontados e discutidos, para que haja mudança. "É preciso que a gente dê visibilidade pra essas desigualdades para que nós possamos discuti-las e a partir daí pensar políticas públicas afirmativas para combatê-las e enfrentá-las", conclui.

O Liberal