Dia dos Pais: veja como é a experiência de ter filhos em uma fase mais madura da vida
Desafios, aprendizados e afeto que fazem da maturidade uma transformação única e significativa na paternidade
Muitos homens vivenciam a experiência de ser pai depois dos 40, 50, 60 e outras idades de uma fase mais madura da vida. Com planejamento ou de forma espontânea, muitos desses homens assumem o papel de educar, acolher e acompanhar o crescimento dos filhos, com carreiras mais consolidadas ou aposentadoria, estabilidade financeira, mais tempo para si e outros olhares para a rotina de uma família. Entre eles está o comerciante de Belém, Marcelo Lins, de 54 anos, pai de quatro filhos, sendo que dois ainda são crianças.
Quando era jovem, Marcelo teve seus primeiros filhos, Giovani e Calil, hoje com 25 e 22 anos, respectivamente, com a primeira esposa. Décadas depois, vieram Haniel, de 10 anos, e Hian, de 4, com a segunda esposa, Moriel Barros. “Eu tive meus primeiros filhos com 27 e 28 anos, ainda bem novo. Naquela época, eu estava começando minha vida, minha carreira, tudo era muito diferente. Quando eles nasceram, o mundo ainda era outro. Hoje, olhando para trás, vejo o quanto amadureci”, diz Marcelo.
Depois de tantos anos, Marcelo foi surpreendido pela chegada de Haniel e Hian, filhos que vieram para transformar novamente sua rotina e sua vida. “Foi uma surpresa, uma bênção que eu nem esperava mais. Quando os meninos nasceram, eu já tinha os cabelos brancos e muita experiência, mas também muito cansaço. A gente não tem mais o pique de antes.”, avalia.
Criar os filhos com essa diferença de gerações levou o comerciante a várias reflexões sobre a forma de aproveitar a vida. “O amor é o mesmo para todos, claro, mas o jeito de cuidar muda. Hoje, eu tenho mais paciência, mais calma. A maturidade ajuda a entender melhor o que eles precisam, e eu tento estar mais presente, mais atento a cada fase.”
O impacto das diferenças geracionais não é só com os filhos, mas com o mundo em geral: “Os dois mais novos vivem grudados no celular, jogando, mexendo no WhatsApp... Já os mais velhos cresceram numa época sem tudo isso, onde era tudo diferente. Então eu precisei aprender junto com eles, me adaptar ao que eles gostam para estar mais próximo”, comenta.
O desafio da rotina e a alegria da paternidade tardia
A rotina não é fácil, especialmente porque Marcelo precisa equilibrar o trabalho e a vida familiar. “Às vezes, chego cansado, não tenho mais aquela energia toda, mas ser pai é prioridade. Mesmo quando bate o cansaço, eu faço questão de estar com eles, de participar do dia a dia”, aponta Marcelo.
Quando fala sobre a decisão de ser pai novamente, Marcelo é sincero: “Não foi algo que planejamos. Foi Deus, como eu costumo dizer. A gente já estava só nós dois, mas a vida trouxe esses dois meninos para iluminar nossa casa de novo. E, apesar dos desafios, não me arrependo de nada.”
Mesmo com o amor que sente, Marcelo sabe que a paternidade tardia provoca reações curiosas nas pessoas ao redor. “Já ouvi gente dizer que meus filhos eram meus netos. Às vezes, quando saio com eles, tem gente que me olha estranho, como se não acreditasse. Mas eu sei o que é ser pai, independente da idade”, finaliza.
Para os pequenos, a idade do pai não importa. “Meu pai é o melhor do mundo”, diz Haniel, com brilho nos olhos. O irmãozinho Hian, com seu jeitinho meigo, complementa: “Eu gosto do meu pai velhinho, porque ele me ajuda e cuida de mim.”
Já com o segundo dos quatro filhos, Calil, a relação é marcada por amizade e companheirismo, o mesmo sentimento que ele estende aos irmãos mais novos, por quem nutre um carinho especial, ajudando o pai, agora mais velho, a cuidar deles.
“Minha relação com meu pai é de muito respeito, porém também nos tratamos como amigos de trabalho, passeio. Temos muito em comum entre decisões e jeitos de escolhas. E minha relação com meus irmãos menores é ótima e, com meu pai tendo uma certa idade, ajudo em relação a cuidar e até mesmo brincar e sair para se divertir. Mas é bom ver que mesmo com a idade que ele se encontra, ainda é um pai muito presente, fazendo o que pode para ver todos os filhos felizes”, contou.
Maturidade emocional como aliada
A paternidade na maturidade não é apenas uma questão cronológica, ela também carrega implicações emocionais e afetivas profundas. O psicólogo José Victor Rodrigues, de Belém, explica que, apesar de cada experiência paterna ser única, há diferenças marcantes entre os homens que têm filhos na juventude e aqueles que decidem ser pais após os 50 anos.
“Quando comparamos pais mais jovens com os mais velhos, com certeza os vínculos são diferentes, pois estamos falando de homens que nasceram em gerações distintas, e essas vivências influenciam diretamente sua paternidade”, afirma o especialista.
Entre os fatores que mais impactam essa relação: a maturidade emocional. Pais mais velhos, segundo José Victor, tendem a lidar melhor com o estresse cotidiano e a reconhecer as emoções dos filhos com mais empatia. “Essa habilidade faz com que esses pais busquem reconhecer e validar as emoções dos filhos por meio do acolhimento, criando um ambiente familiar mais seguro e estável. Deste modo, também tornam-se modelos de maturidade emocional para os filhos.”
A relação entre pais mais velhos e filhos pequenos também é marcada por uma diferença geracional que pode tanto aproximar quanto afastar. O psicólogo observa que visões de mundo distintas entre gerações podem gerar conflitos, mas ressalta que o respeito mútuo e o diálogo são chaves para o fortalecimento do vínculo. “Quando pais escutam ativamente e filhos se sentem ouvidos, a comunicação tende a ser mais saudável.”
Mas a idade também traz receios. O psicólogo aponta que é comum que esses pais se preocupem com a própria saúde, com a falta de disposição para acompanhar o ritmo das crianças e com a possibilidade de não estarem presentes em fases importantes do desenvolvimento dos filhos.
“Medo de não terem disposição física para brincar com as crianças, medo de talvez não conseguir estar presentes em outras etapas do desenvolvimento dos filhos, medo de não conseguir lidar com demandas relacionadas à tecnologia, sociais ou até culturais dos filhos. Eles podem se sentir inseguros, apresentar questionamentos acerca da sua paternidade, se realmente estão sendo bons pais, e podem desenvolver até mesmo culpa por não terem tido filhos quando eram mais jovens”, pondera.
Sobre as pressões sociais, o psicólogo destaca que ainda há preconceitos ligados à paternidade tardia. A sociedade tende a associar a figura paterna à juventude, o que pode gerar inseguranças nos homens mais velhos. “Esses pais podem sentir limitações físicas ou de saúde, e isso, somado às expectativas externas, pode alimentar sentimentos de culpa ou medo de não serem bons o suficiente”, afirma. Ainda assim, ele reforça que a maturidade costuma trazer recursos emocionais valiosos, como empatia, escuta e segurança, que favorecem a construção de vínculos afetivos profundos.
Essa pressão, inclusive, pode fazer com que tentem compensar com superproteção, o que, segundo ele, pode gerar impactos no desenvolvimento emocional da criança. “A superproteção ou o excesso de zelo podem estar relacionados ao medo de talvez não estarem presentes para os filhos por muito tempo e à pressão de ser um pai perfeito. De modo geral, a intenção é boa, mas pode impactar no desenvolvimento da criança, podendo gerar dependência emocional, baixa tolerância à frustração e até mesmo ansiedade”, alerta.
Apesar dos desafios, o especialista acredita que a paternidade tardia pode ser muito rica quando vivida com presença e afeto. “É essencial que esses pais estejam atentos ao tempo de qualidade, à escuta ativa, ao carinho e ao vínculo no dia a dia. Além disso, contar com uma rede de apoio, da parceira, da família, da escola e até da psicoterapia pode fazer toda a diferença para que se sintam mais seguros e conectados com os filhos.”
Homens também enfrentam os efeitos do ‘relógio biológico’
Apesar de mais comum entre mulheres, a preocupação com o "relógio biológico" também se estende aos homens. Segundo o urologista João Frederico Andrade, de Belém, embora a fertilidade masculina se mantenha por mais tempo, com possibilidade de reprodução até os 80 anos, existem, sim, impactos da idade no corpo e na saúde reprodutiva. “O espermatozoide é produzido diariamente, mas o processo completo de maturação leva cerca de 75 dias. Ou seja, os homens continuam férteis, mas, com o passar dos anos, alguns fatores podem interferir na qualidade dessa produção”, explica.
Entre os principais fatores que comprometem a fertilidade masculina após os 50 anos estão o sedentarismo, o tabagismo, doenças crônicas como o diabetes, além de alterações prostáticas comuns com o envelhecimento. No entanto, ele ressalta que a idade, por si só, tem uma influência leve na saúde dos espermatozoides. “O risco de má formação genética existe, mas é discreto se comparado ao impacto da idade nos óvulos das mulheres”, afirma o médico.
O especialista reforça que o estilo de vida é determinante. Homens que mantêm hábitos saudáveis, como alimentação equilibrada, prática regular de atividade física e boas noites de sono, tendem a preservar a fertilidade e a saúde dos testículos por mais tempo. “A qualidade do espermatozoide está diretamente ligada à saúde geral do corpo. Bons hábitos fazem diferença.”
Em casos de paternidade planejada após os 50 anos, o especialista recomenda uma avaliação médica completa, incluindo exames laboratoriais, espermograma e avaliação da próstata e do trato urinário. “Mesmo sendo biologicamente possível, é importante que o homem esteja em boas condições de saúde para garantir não apenas a concepção, mas também qualidade de vida para acompanhar o crescimento do filho.”
Ele também observa que a paternidade tardia já se tornou uma tendência. “Muitos homens têm filhos com novas parceiras após os 50 anos, sem maiores dificuldades. Diferente das mulheres, que após os 40 muitas vezes precisam recorrer à fertilização assistida, o homem pode continuar fértil naturalmente.”
Por fim, o urologista esclarece que a andropausa, caracterizada pela queda natural e gradual dos níveis de testosterona nos homens, não é tão intensa quanto a menopausa vivenciada pelas mulheres. Embora possa haver esta redução hormonal no envelhecimento, a libido e a função reprodutiva em homens podem se manter.
“A disposição para cuidar dos filhos, no entanto, está mais ligada à saúde emocional do que aos níveis de testosterona. O que pesa mesmo é o estado mental, não só o físico”, finaliza.
*Laura Serejo (estagiária de jornalismo, sob supervisão de Fabiana Batista, coordenadora do núcleo de Atualidades)
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