Erveiras do Ver-o-Peso comemoram reconhecimento como Patrimônio Cultural Imaterial do Pará
Tradição que atravessa gerações é celebrada por mulheres que mantêm viva a cultura das ervas e banhos do Ver-o-Peso
Sentimento de orgulho, emoção e gratidão. Assim definem as erveiras do Mercado do Ver-o-Peso o título de Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial do Estado do Pará, concedido por meio da lei nº 11.128, publicada no dia 2 de setembro no Diário Oficial da União. A distinção valoriza o ofício dessas mulheres que produzem e comercializam ervas, banhos e produtos naturais voltados ao cuidado da saúde física e espiritual, e reconhece a força de uma tradição que atravessa gerações.
Maria dos Anjos Paixão, de 75 anos, que trabalha há cinco décadas no mercado e se emociona ao falar sobre o título. “Isso representa tudo para mim. Desde que comecei, trabalhei muito e, até hoje, estou aqui. É muito importante para mim manter esse meu serviço”, diz, emocionada.
Maria mantém viva a tradição familiar na barraca que era do marido, já falecido, com a ajuda dos filhos. A rotina começa antes do nascer do sol e segue até o final da tarde. “Eu, minha filha e meu filho trabalhamos aqui todos os dias. Chego às seis e meia da manhã e ficamos até o final da tarde. Meu filho trabalha lá dentro, mas aqui a gente se organiza para dar conta de tudo”, explica Maria.
Ela conta que o reconhecimento como patrimônio cultural é motivo de orgulho e esperança: “É muito gratificante saber que nosso trabalho, feito com amor e dedicação, agora é reconhecido oficialmente. Isso dá visibilidade e mostra que nossa cultura é importante”.
Filha segue os passos da mãe
Márcia Cardoso, filha de Maria, vende ervas há quase 20 anos e aprendeu o ofício acompanhando a mãe. Para ela, assumir a tradição familiar é motivo de orgulho. “Aqui eu comecei através da minha mãe. É um orgulho muito grande ver que faço parte dessa história. Minha mãe está há 55 anos trabalhando, mostrando a força da mulher para sustentar a família. É muito gratificante ver”, afirma Márcia.
Ela ressalta a importância do reconhecimento oficial: “No Pará, as pessoas que vêm de fora procuram pelos perfumes, pelos banhos e pelo cheiro das ervas. Ser reconhecida como patrimônio cultural dá ainda mais visibilidade à tradição”.
Márcia explica que o trabalho das erveiras vai além da venda: envolve conhecimento, fé e dedicação diária. “Temos banhos com funções específicas, como o ‘abre-caminho’ ou o ‘banho de proteção’. Cada erva tem um significado e ajuda na saúde e na espiritualidade das pessoas”, conta.
Produtos que encantam e atraem visitantes
Entre os itens mais procurados estão banhos de ervas, óleos medicinais e perfumes naturais. Maria detalha que os clientes chegam de diferentes lugares para buscar esses produtos.
“Aqui, os cheiros são famosos, e o pessoal procura muito os banhos. Temos vinte e uma ervas, e cada uma tem um objetivo. Alguns banhos são para proteção, outros para atrair prosperidade. É um trabalho que encanta quem vem de fora e mantém viva a nossa cultura”, afirma.
Márcia reforça que cada produto tem uma história: “As garrafadas e os perfumes são feitos com nossas ervas e passam por processos específicos. Não é apenas vender, é transmitir conhecimento e tradição”.
Uma vida dedicada às ervas
Josiane Santos, 44 anos, é um exemplo de como a tradição se mantém viva: ela começou a trabalhar no Ver-o-Peso ainda na barriga da mãe. “Sou uma erveira de barriga”, brinca.
Para Josiane, o reconhecimento reforça a valorização do trabalho e da tradição familiar. “É importante ser valorizada, porque nosso trabalho sustenta nossas casas e mantém viva a nossa cultura. Os clientes procuram pelos perfuminhos, as essências, as garrafadas e as ervas, tudo feito aqui mesmo. É muito gratificante”, conta.
Ela explica que a rotina das erveiras exige esforço e dedicação, mas é recompensadora: “O trabalho começa cedo e é pesado, mas ver que as pessoas valorizam o que fazemos e reconhecem nossa tradição faz tudo valer a pena”.
O valor cultural das ervas e banhos
Para as erveiras, a importância vai além do comércio: é preservar uma identidade cultural e espiritual. “O banho de ervas, o perfume, o atrativo… tudo isso faz parte da nossa história. Mostrar isso às pessoas é como compartilhar um pouco da alma do Pará”, explica Maria.
Josiane complementa: “Estamos cuidando da saúde física e espiritual das pessoas, mantendo viva uma tradição que atravessa gerações. É um legado que queremos passar adiante”.
O olhar do visitante
Quem também sente a força da tradição é Raiane Lima, carioca, que visita Belém com frequência e não deixa de passar pelo Ver-o-Peso. “Visitar Belém e não comer peixe e não comprar um banho de cheiro é como se não tivesse vindo”, afirma.
Ela conta que aprendeu a tradição ainda no Rio de Janeiro, por influência da família, e mantém o costume: “Banho de cheiro, eu só ando com ele. Está até hoje na minha bolsa em casa. É algo que me acompanha e faz parte da minha fé”.
Raiane reforça a importância de divulgar e conhecer a cultura local: “Quando alguém vem a Belém, sempre indico conhecer um banho de cheiro, comprar os óleos e sentir os aromas do mercado. É uma experiência que faz parte da identidade do estado”.
Preservando a cultura paraense
O título de Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial do Estado do Pará reforça a importância de preservar e divulgar tradições populares que atravessam gerações. Para Maria, Márcia e Josiane, essa visibilidade é também uma oportunidade de mostrar para a sociedade a riqueza da cultura local.
No coração do Ver-o-Peso, entre aromas e cores, as erveiras seguem com sua missão: cuidar da saúde física e espiritual dos clientes e manter viva uma tradição que é patrimônio do Pará.
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