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LINOMAR BAHIA

LINOMAR BAHIA

Jornalista e radialista profissional. Exerceu as funções de repórter, redator e editor de jornais e revistas, locutor, apresentador e diretor de emissoras de rádio e televisão. Articulista dominical de O Liberal há mais de 10 anos e redator de memoriais, pronunciamentos e textos literários. | linomarbahiajor@gmail.com

Quem te viu, quem te vê...

Linomar Bahia

Bolos foram servidos e medalhas concedidas em celebração dos 407 anos de fundação desta Santa Maria de Belém do Grão Pará sem, contudo, sinalizar um futuro animador, estimulando a nostalgia sobre um passado que sobrevive apenas na saudade. Quando muito, consolam vestígios do que tem sobrevivido à terrível associação entre a ação do tempo e a carência administrativa. Consolados pelo adágio de que recordar é viver, pensamentos viajam e vão buscar o bem-querer nas relíquias que ainda restam.

Cada aniversário enseja a reflexão sobre o quanto Belém continua engrossando a lista da “terra do já teve”. Recorrendo à história, encontramos a primeira capital brasileira a ter lampião nas ruas e gás encanado nas casas, sediar a agência número 3 do Banco do Brasil, os charmosos bondes de poltronas de palhinha e fiel cumpridor da pontualidade britânica. Ou fazer ouvir na famosa acústica do palco do Teatro da Paz a nata dos intérpretes e companhias da ópera internacional, sob medida ao fausto de então.

Estreitas relações com o “Velho Mundo” nos presentearam com os parques e jardins e boulevares no estilo cosmopolita da “Art Nouveau” predominante na Europa do final do século XIX, sob uma atmosfera intelectual e artística que valeu à capital paraense a denominação de “Paris dos Trópicos”. Também contam capítulos desse “ontem” as caixas d´água monumentais, de que resta apenas a de São Brás, os mercados de ferro trazidos da Inglaterra, uma “Palmeira” de pães e doces e os galpões do porto.

Nesses 407 anos do aporte de Caldeira Castelo Branco, fustigado pelos franceses de Napoleão Bonaparte, foram plantadas mangueiras para atenuar a temperatura equatorial e dar frutos agradáveis aos paladares e danosos aos carros. Construíram templos e palácios correspondentes à bonança e bom gosto da época, enriquecidos pela fase áurea da borracha. O caboclo Plácido encontrou a imagem de Nazaré e inaugurou a devoção, renovada a cada outubro nos tantos louvores à Virgem.

Quem te viu e quem te vê, Belém. Vê traços desbotados de um tempo que não volta mais. Pouco mais que a visão das águas pelas bordas da cidade que a incúria municipal permitiu ocupar. Vagas lembranças do Largo da Pólvora, um depósito de munição transformado em Praça da República. Uma Praça Batista Campos desfigurada, como desfigurados têm sido praças e prédios, que de tanto “tombados” pelas custódias patrimoniais, vão tombando literalmente para reviverem apenas na saudade.

Essa cidade de toques europeus, que inspiraram o pernambucano Manuel Bandeira a poetizar seus encantos em “Bem-Bembelelém - Viva Belém, morena gostosa, em te quero bem...” vai morrendo na perda das joias arquitetônicas e no sepultamento do que já foi a metrópole mais europeia do Brasil. Quem sabe, o espírito de Antonio Lemos encarnará em alguém que restabeleça os encantos que, apesar dos pesares, continuam sendo cantados por renitentes amantes, para celebrar os anos que virão.

 

Linomar Bahia é jornalista e escritor

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