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Círio – A festa de todos

João Antônio Lima / Especial para O Liberal

 

O Círio de Nazaré, celebrado todo 2° domingo de outubro em Belém do Pará, é, sem dúvida, daqueles eventos que marcam os que tiveram/têm a oportunidade de presenciá-lo. Um modo recorrente de designá-lo é “Natal dos Paraenses”, por ser ocasião de confraternização entre as famílias e um ponto síntese do povo do Pará. De fato, ao redor da berlinda e o que ela enseja, todos se sentem próximos uns dos outros, fazendo dessa festa uma “Festa de Todos”.

Ao longo da década de 1980, o tema do Círio era sempre o mesmo: “A festa de todos os irmãos”. Não se pode negar a hibridez que vemos nas diversas manifestações do Círio de Nazaré, seja pela própria devoção à Virgem sob a invocação de “Nazaré”, herdada de Portugal e que, no Pará, ganhará contornos próprios, seja pelas expressões de fé e de cultura, que estão para além da esfera católica.

Há dois símbolos que podem significar essa união que o Círio expressa - uma vertical e outra horizontal. A vertical é simbolizada pelo ex-voto que dá nome à procissão, pois “Círio”, na verdade, é uma grande vela com a qual os promesseiros homenageiam aquela por cuja intercessão receberam o almejado pedido. Os promesseiros levando as formas de cera figuram a sua união com a Virgem de Nazaré, representando a dádiva recebida do céu.

Por outro lado, o sentimento mais latente que o Círio propicia se dá em sua dimensão horizontal, tornado presente pela corda. Atrelada à berlinda, une “num só nó” a Virgem aos seus devotos, ou ainda, os devotos uns aos outros. Precisamente aqui reside uma das forças que torna o Círio algo tão marcante, o sentimento de unidade em meio à diversidade.

Se, na procissão o vertical e o horizontal, tocam-se, como chegam até nossas casas? A maniçoba no fogo, a mesa posta, a família reunida e o tempo, regido pela “Santinha”, misturam os limites entre o público/familiar, conectando as famílias ao redor de uma mesma experiência, agregando pessoas, afetos, cheiros e saudades (como quem vem do interior e de outros Estados para rever os familiares).  

Além dessa religiosidade que o Círio expressa, há uma dimensão cultural que lhe é muito particular. Como já dito, o que nele vivenciamos é marca importante da vida de parte dos paraenses. Momentos como o “Auto do Círio”, os festejos antes/durante/depois das procissões, tudo isso em conjunto dá à cidade uma aura que sentimos apenas nesse período do ano.

Se o Círio é uma “festa de todos”, o contexto atual em razão da pandemia, torna ainda mais presente o caráter híbrido e adaptativo dessa manifestação. Se as ruas não podem ser tomadas pelo “mar de gente”, por enquanto, as casas continuam a ser o espaço do aconchego. Ano passado e hoje, o sobrevoo da imagem parece apenas um lenitivo para a impossibilidade da grande procissão, no entanto, pode e deve ser ocasião de expressar ainda mais a união de cada um de nós com Ela e nossa uns com os outros. Em tom de prece, resgato um trecho do Hino “Bendita Sois Maria”, publicado no Jornal A Palavra, em 10 de outubro de 1926:

Ó Virgem do céu Rainha,

Terna Mãe do Redentor,

Sem igual é vosso encanto

Terra e céus encheis de Amor.

 

João Antônio Lima é Historiador e Professor

joaolima@ufpa.br

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