Pesquisa revela que quase a metade da população não tem acesso a água potável na Grande Belém

Instituto Trata Brasil revela que 44,6% da população da RBM não tem água potável e mais de 91% não têm esgoto

Thiago Vilarins
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Os moradores dos municípios que compõem a Região Metropolitana de Belém (RMB) são os que mais sofrem no País pela carência de serviços básicos de saneamento. Além de possuir, disparadamente, os maiores índices de população sem acesso à água tratada, coleta e tratamento de esgoto, a metrópole surge como uma das mais vulneráveis pelos impactos da falta dessa infraestrutura na renda, empregos e doenças, com efeito direto na elevação nas despesas com saúde pública.

É o que revela o Painel Saneamento Brasil, lançado na última semana pelo Instituto Trata Brasil, Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) formada por empresas que atuam na área de saneamento e proteção de recursos hídricos. A plataforma mostra dados sobre saneamento básico e seus impactos socioeconômicos nas 200 maiores cidades do País. A pedido de O LIBERAL, o instituto fez uma análise cruzando os dados da RMB (Belém, Ananindeua, Benevides, Castanhal, Marituba, Santa Isabel do Pará e Santa Bárbara do Pará) com os índices nacionais e das demais regiões metropolitanas do País (Manaus, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Goiânia).

Pelo levantamento, metade dos habitantes da Grande Belém (44,6%) não tem acesso à rede de água potável. Em números absolutos, são 1.002.666 pessoas nesta situação, o que equivale, por exemplo, à toda população de Maceió (AL). Essa proporção chega a ser três vezes superior a média nacional, onde 16,6% estão nesta situação. Ainda para efeito de comparação, o segundo maior índice de população sem acesso à água tratada é da Região Metropolitana de Fortaleza, com 25,3%; enquanto em São Paulo, o melhor cenário dentre as metrópoles, são apenas 1,3%.

Outros dados alarmantes são que 91,4% da população da RM de Belém (2.052.604 pessoas) não tem coleta de esgotos e somente 0,8% dos esgotos gerados são tratados. Nacionalmente, essas médias são de 47,6% e 45,1%, respectivamente. “A conclusão de que as regiões com menor índice de saneamento básico são as que têm os piores índices de desenvolvimento fica mais evidente quando se analisa os números da Região Metropolitana de Belém. Além disso, notamos que estão se mexendo muito pouco para alterar essa situação. Esse é um ponto importante para a sociedade entender e se mobilizar”, avaliou o pesquisador do Trata Brasil, Fernando Garcia.

O estudo mostra que entre 2010 e 2017 a RMB gastou, com doenças associadas a falta de saneamento (diarreias, verminoses, hepatite A, leptospirose, esquistossomose, entre outras), mais de R$ 23,2 milhões em internações, numa média aproximada de R$ 2,9 milhões por ano. Em média, foram 8.092 internações por ano e 25 óbitos confirmados. “Esses registros são os mais altos do País. E quando a gente vê a taxa de incidência de doenças associadas a falta de saneamento, no caso da Região Metropolitana de Belém, são 25 internações a cada 10 mil habitantes. No Brasil, é metade: 12,46. Na Região Metropolitana de São Paulo, a incidência cai para 2,81 - quase um décimo do indicador da RMB. E foi essa proporção que ficou evidente quando a gente construiu essa ferramenta: esse impacto socioeconômico relacionado a falta de saneamento básico”, explicou o pesquisador, lembrando ainda que nessas áreas proliferam mais as doenças do mosquito Aedes aegypti (dengue, febre Chikungunya e Zika vírus), que não estão nessas contas.

Salário menor reflete a ausência de serviços

A ausência de abastecimento de água, coleta e tratamento dos esgotos também pune residentes das áreas sem acesso aos serviços, uma vez que recebem salários menores no final do mês. Em média, quem mora em área com abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto na Região Metropolitana de Belém ganha salário 81,65% maior do que quem mora em regiões sem acesso a esses serviços, aponta o Instituto Trata Brasil.

“Esta distinção salarial se dá sobretudo nas áreas mais precárias, em que o cidadão convive muito próximo aos esgotos, além de outros problemas socioeconômicos”, cita o estudo. Em valores, o rendimento mensal do trabalho das pessoas que moram em residências com acesso integral ao saneamento básico na RMB é de R$ 2.552,00 - R$ 30.624,00 por ano. Os que moram em residências com água, mas sem coleta de esgoto, tem rendimento mensal de R$ 1.641,00, enquanto quem não tem nenhuma infraestrutura básica, a renda no mês é de R$ 1.404,90 (R$ 16.858,80 no ano).

O presidente do Trata Brasil, Édison Carlos explica que “quando a pessoa morou e mora numa área sem saneamento, a tendência é que ela se desenvolva menos, tanto na escola quanto na formação profissional. Ela tende a faltar mais à escola, faltar mais ao trabalho.. Tem impacto na formação profissional”. De acordo com ele, aumenta neste caso a chance de ter um emprego de menor qualificação e com menor salário. “O salário é consequência de uma vida toda com uma condição sanitária ruim. A pessoa não ganha menos só porque mora ali. Ganha menos porque foi submetida, ao longo da vida, a condições de saneamento ruins, o que faz com que ela tenha mais doenças”.

Sobram verbas, mas investimento é reduzido

 

A pesquisa defende que o investimento em saneamento básico cria empregos não apenas pela necessidade de mão de obra para as construções, mas também pela operação posterior. No entanto, ao longo dos oito anos analisados (2010-2017) só foram investidos R$ 404.642.599,41 em obras de saneamento nos municípios da RMB, que geraram apenas 1.202 postos de trabalho - que não contribuíram em nada para a redução das 141 mil pessoas desempregadas na Grande Belém, segundo os dados mais recentes (dezembro/2018) do IBGE. Como comparativo, no mesmo período, São Paulo investiu R$ 19 bilhões em obras de expansão das redes de água e esgotos e geraram 35.048 empregos diretos. “Para se ter uma ideia, em 2017, os governos federal, estadual e municipal investiram por habitante da Região Metropolitana de Belém, com obras de saneamento, R$ 14. Na média nacional, foram R$ 54 por habitante. Na Região Metropolitana de São Paulo são R$ 125,47. Ou seja, São Paulo é uma região que já tem um bom abastecimento de água, um suprimento melhor de coleta e tratamento de esgoto, mas ainda assim investe um recurso maior”, disse Fernando Garcia.

“É óbvio que as regiões de menor desenvolvimento econômico, onde se enquadra a Região Metropolitana de Belém, não vão ter capacidade, delas sozinhas, realizarem todo esse investimento. No caso da região de Belém e as demais metrópoles do Norte e Nordeste torna-se muito importante o apoio do Ministério de Desenvolvimento Regional, ou seja, usar a estrutura federativa para fornecer recursos para essas regiões implantar saneamento de forma subsidiária. Isso tem efeito de curto prazo importante, na geração de emprego, de renda; em médio prazo, reflete na redução de despesas de saúde, na melhoria da produtividade; e a longo prazo, vai melhorar a condição de desenvolvimento socioeconômico dessas regiões , trazendo-as em direção das regiões mais desenvolvidas do País. Dinheiro tem, sobra todo ano recurso do FGTS alocado e disponível para empréstimo e ninguém vai lá pegar. O mesmo acontece no BNDS. Há recursos de crédito suficiente, falta uma política de Estado para investir nessa área”, completou. Questionado sobre os resultados do Trata Brasil sobre a RMB, o governador Helder Barbalho disse a O Liberal que lamenta o descaso dos últimos governos e que já contraiu empréstimos internacionais para reverter esse quadro nos próximos anos. “Primeiro temos que lamentar essa constatação, que não é de hoje. Uma constatação que é fruto dos baixos investimentos executados e realizados pelas gestões passadas, que sacrificam a sociedade a acesso a serviços tão essenciais. Nós estamos fazendo agora investimentos volumosos na área de saneamento. São mais de R$ 260 milhões, entre investimentos de abastecimento de água e tratamento de esgoto, fortalecendo a companhia de saneamento e, ao mesmo tempo, cobrando eficiência para que a Cosanpa seja superavitária, para que nós possamos ao longo dos próximos anos mudar essa realidade e ampliar a cobertura de abastecimento de água e tratamento de esgoto do Estado, disse.

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