CONTINUE EM OLIBERAL.COM
X

Pesquisa científica revela potencial de microrganismos encontrados no solo do Parque do Utinga

Pesquisadores identificam novas bactérias com potencial farmacológico

Fabrício Queiroz/Especial para O Liberal
fonte

O solo está por toda parte, mas ainda assim é o recurso natural menos lembrado quando se fala na Amazônia. Sua importância perpassa desde o desenvolvimento de florestas e culturas agrícolas até a mitigação do efeito estufa com o sequestro de carbono, mas é analisando sua composição e substâncias a níveis microscópicos que cientistas vêm descobrindo ainda mais benefícios e potenciais de uso dessa riqueza que está bem debaixo dos nossos pés.

Uma empreitada desse tipo ocorre no Parque de Ciência e Tecnologia (PCT) Guamá, onde pesquisadores do Laboratório de Engenharia Biológica (EngBio) se dedicam a identificar e descobrir microrganismos de interesse para a biotecnologia. Um estudo publicado na revista Microbiology Spectrum chamou atenção para os resultados promissores obtidos com amostras coletadas no Parque Estadual do Utinga, em Belém.

Foi durante o doutorado de Ana Carolina Miranda em Genética e Biologia Molecular que essa nova fronteira de pesquisa passou a ser explorada na Universidade Federal do Pará. Em seu projeto, Ana Carolina tinha o objetivo de avaliar o genoma de bactérias encontradas no solo da área florestal do Parque do Utinga e investigar o potencial desses microrganismos de produzir moléculas para fins biotecnológicos.

A metodologia combina técnicas de sequenciamento de DNA, já dominadas pelos pesquisadores da UFPA, com a análise do metaboloma, que pode ser incorporada graças à parceria com o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), de São Paulo. A partir do metaboloma é possível fazer uma verificação completa das substâncias produzidas pelos organismos estudados.

“Quando a gente bate os nossos dados com os bancos de dados internacionais, a gente viu que os genes presentes nessas bactérias aqui da região eram desconhecidos. E quando a gente fez o metaboloma também, o resultado foi parecido, com a maioria deles não estando presente em bancos de dados conhecidos. Esse foi um grande ensaio em que mostramos que ainda tinha muita coisa desconhecida para a ciência”, resume a pesquisadora.

No total, cerca de 100 tipos diferentes de bactérias desconhecidas foram encontradas nas amostras. Dentre elas, duas do gênero streptococcus e uma do gênero bacillus foram selecionadas para análise completa devido à sua capacidade de produzir substâncias com possível aplicação biotecnológica e farmacológica. “A pesquisa encontrou muitas classes químicas interessantes que podem atuar ou que fazem parte, por exemplo, da grande parte dos antibióticos, dos antifúngicos e antitumorais, além de que podem ser utilizados na indústria como alternativa ao uso de substâncias sintéticas”, explica.

Diante dos resultados animadores encontrados em Belém, o Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-Bio) autorizou a realização de pesquisas de campo em todas as  29 unidades de conservação estaduais. A possibilidade de novas descobertas anima Ana Carolina Miranda, que vê um grande potencial de absorção desse conhecimento no sistema produtivo. 

“A aplicação é muito ampla. Moléculas que são biologicamente produzidas não têm tanta degradação quanto uma substância química. Tem também a possibilidade de utilizar essas moléculas na agricultura porque essas bactérias podem atuar na promoção de crescimento de plantas e proteger contra fitopatógenos. Além disso, essas moléculas podem ser úteis para indústria de cosméticos, sendo uma alternativa a substâncias que fazem mal de alguma forma ao ambiente ou até ao próprio usuário”, exemplifica.

Inovação

O potencial do uso do solo é enorme. O caminho é longo até que novos produtos gerados a partir desses materiais cheguem às prateleiras, mas os primeiros e importantes passos já foram dados. Atualmente, cerca de 40 pesquisadores e estudantes da iniciação científica à pós-graduação trabalham no EngBio em projetos que contribuem para avançar no conhecimento sobre a biodiversidade amazônica e a geração de novas oportunidades para a agregação de valor aos recursos locais.

A expectativa é acelerar esses resultados principalmente a partir da recente criação do projeto “Iwasa’i: Centro Avançado de Pesquisa e Inovação Biotecnológica da Amazônia Oriental”, coordenado pelo professor Artur Silva. A iniciativa, além de fortalecer a aliança da genômica com a tecnologia do metaboloma, também vai ampliar os investimentos em formação de recursos humanos qualificados e infraestrutura científica.

Dessa forma, a ideia é conectar a ciência básica com as demandas do mercado por novos produtos eficientes e sustentáveis. O avanço permitido pelos projetos do EngBio permite, por exemplo, que as bactérias sejam cultivadas em laboratório para reproduzir as substâncias desejadas sem promover a destruição do meio ambiente nem exploração predatória dos recursos ali existentes.

“Quando se estuda microrganismos, em uma coleta de 10 gramas de solo a gente consegue milhares de microrganismos. De posse dessa informação genética, é possível produzir isso em laboratório, enquanto o ambiente continua preservado. Ou seja, a gente pegou o mínimo de matéria e conseguiu desenvolver diversas análises. Isso significa ter desenvolvimento científico aliado ao desenvolvimento sustentável’, ressalta Ana Carolina Miranda.

Assine O Liberal e confira mais conteúdos e colunistas. 🗞
Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Amazônia Viva
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!