Saúde mental exige atenção na pandemia
Se não for tratada de forma adequada, ansiedade gerada no período do isolamento social pode acarretar uma série de dificuldades emocionais

O distanciamento social temporário, falta de opções de lazer, sensação de privação de liberdade, incertezas, medo de ficar doente, medo de perder alguém, preocupação com as contas e trabalho, o bombardeio de informações, o lockdown que pode deixar tudo mais difícil e restrito ainda... a pandemia de covid-19 — a doença causada pelo coronavírus sars-cov-2 — bagunçou as rotinas de todo o planeta. O enfrentamento a um inimigo invisível aos olhos, mas altamente contagioso e tão letal, trouxe um outro risco à saúde, mais especificamente à saúde mental: ansiedade.
Um estudo da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que acompanhou 1.460, em 23 estados, apontou que desde que as medidas de distanciamento social temporário se tornaram mais amplas, os índices de adoecimento mental de algumas pessoas aumentaram. A ocorrência de estresse agudo subiu de 6,9% para 9,7% entre os entrevistados (40% a mais). Depressão passou de 4,2% para 8% (90% a mais). E ansiedade passou de 8,7% para 14,9% (71%) e já era um índice alto.
O Centro de Valorização da Vida (CVV) oferece apoio emocional gratuito a quem está sofrendo com pensamentos suicidas, depressão, ansiedade ou pensamentos violentos. É possível conversar, de forma sigilosa, pelo telefone 188 ou pelo chat do site cvv.org.br, a pessoa que estiver precisando escolhe o meio que achar mais conveniente. O CVV tem atendimento 24 horas por dia.
Pensamentos suicidas, sentimentos de tristeza prolongada, ansiedade, medo excessivo e reações violentas ou agressivas são sintomas de doenças da mente e que podem ser tratados. Muitas vezes, o ódio também é um sintoma. E se esse sentimento levar a pensamentos violentos ou suicidas, procure ajuda. E uma forma gratuita, de terapia online — sem necessidade de sair de casa no meio da pandemia — é pelo projeto Psicologia Pará - Rede de Apoio Psicológico, que pode ser acessado pelo site psicologiapara.net.br. É uma iniciativa do Governo do Estado e psicólogos voluntários.
Ansiedade existe de várias formas. Pode até ser saudável e funcional, como observa a psicóloga Fabiane Pereira, professora do curso de Psicologia da Uninassau. Uma coisa é ficar ansioso por algo importante ou bom que vai acontecer. E é normal ficar ansioso, por preocupação ou nervosismo, com algo que pode ser ruim. Mas quando essa sensação não passa e os medos, anseios, preocupações e nervosismos se acumulam e começam a causar transtornos, já é uma doença se instalando. O que não faltam, na pandemia, são gatilhos para essas sensações. Coisas que podem "travar" uma pessoa e afetar a saúde física de muitas maneiras.
Toda atenção a sintomas psicossomáticos
O primeiro ponto é ter em mente, lembra a professora, é que a pandemia é uma situação inédita, uma condição aversiva e incontrolável, que provoca uma dificuldade de previsão do que está por vir. Além disso, é importante salientar que, mesmo quem ainda não apresentou os sintomas, pode vir a desenvolver porque estão todos na mesma condição. Muitos estudos indicam que situações em que não se tem controle e informações suficientes, há tendência de aumentar o nível de ansiedade.
"Temos um cenário em que as principais preocupações se relacionem ao medo do contágio, ao medo de precisar de serviços de saúde e não receber o tratamento adequado, a morte de pessoas queridas e sobre quando a vida voltará ao normal. O isolamento físico, de modo repentino, como no caso da quarentena, pode ir além da proteção contra o contágio do vírus. A redução nos contatos familiares, com os amigos e colegas de trabalho pode aumentar a chance de desenvolver ansiedade e depressão", analisa Fabiane.
Ter essas emoções sem controle e ocupando a mente por muito tempo, eventualmente, alerta Fabiane, vai levar a alguns sintomas da ansiedade doença: alterações no sono, distúrbios alimentares, dificuldades de concentração e pode chegar a redução de imunidade, dores musculares causadas pela tensão, dor de cabeça, tontura, pânico, coração acelerado, confusão, respiração desregulada, falta de ar — e aqui mora o perigo, pela confusão com sintoma da covid-19 —, náuseas, reações gastrointestinais e uma série de outras reações que variam muito de pessoa para pessoa, condições e contextos. Até inflamações na pele podem surgir.
"Uma crise de pânico, que pode ser a principal situação que leve a alguém pensar que esteja enfrentando a ansiedade, é caracterizada por um período curto, de 10 a 15 minutos, com todos os sintomas de ansiedade em uma intensidade elevada. Nesse momento, a pessoa não consegue organizar bem seus pensamentos, mas uma atividade não pode ser esquecida: respiração diafragmática. Para isso, coloque a mão no abdômen, perto do umbigo, feche os olhos e busque concentrar na respiração. Inspire pelo nariz, encha os pulmões, leve o ar até o abdômen percebendo como ele se movimenta, segure o ar por dois tempos, mantendo a barriga os pulmões cheios, expire lentamente pela boca, contando até cinco, esvaziando completamente o pulmão e o abdômen. Repita até sentir melhoras e relaxamento", recomenda a professora.
Quadros de sofrimento emocional e mental precisam de mais cuidado e atenção
Todas essas coisas, ou algumas delas, em diferentes combinações, podem ser sentidas durante esse período atípico em que todo o mundo se encontra. Em maior ou menos intensidade. Novamente, varia muito entre cada organismo. Mas é com quem já tem um quadro de enfrentamento de alguma doença da mente que é preciso ficar atento, como aponta a psicóloga Nathalia Otero.
"Pra quem já vem de um histórico de ansiedade, é comum apresentar uma desordem emocional em períodos de isolamento social e limitação de liberdade. Muitas pessoas acabam adoecendo mentalmente, havendo necessidade de atenção maior com as questões psicológicas e até físicas. Muitos precisam recorrer não somente a terapia contínua, mas ao uso de medicações também", comenta a psicóloga.
É importante identificar os gatilhos que desencadeiam esses sintomas, reforça Nathalia. "Muitos adoecem não do vírus que se instalou no mundo, mas sim do fator emocional que acaba gerando doenças psicossomáticas, que também são relevantes e requerem muito cuidado", complementa.
Uma curiosidade que a psicóloga observou, em alguns atendimentos, foi o aumento de pequenos acidentes domésticos. As pessoas estão mais tempo em casa e às vezes nervosas. Podem tropeçar, se bater, se cortar, se queimar, quebrar coisas involuntariamente, cometer erros no home-office, errar nas comidas... o leitor lembra que a perda de atenção e concentração pode ocorrer? Pois bem, leva a isso.
Com o tempo extra que algumas pessoas ganharam, forçosamente, a psicóloga sugere uma reinvenção pessoal. Isso inclui começar a cuidar de si mesmo como nunca antes, tanto física quanto mentalmente. Ela cita: optar por práticas mais saudáveis, relações interpessoais mais leves, redescobrir gostos, focar em atividades que ficaram esquecidas (leitura, desenho, jogos, arte, música...). E alguns atos simbólicos de limpeza física (livrar-se de roupas, objetos que não servem mais) e mental (livrar-se de pensamento ruins para si e sobre outras pessoas).
Para tudo isso, Nathalia aponta que é um ótimo momento para se fazer terapia. Devido às limitações e insegurança de ficar se deslocando, há terapias online e algumas com preços até bem acessíveis. E ainda, projetos experimentais de atendimento a distância ou mesmo gratuitos. Basta procurar nas redes sociais digitais quem está mais perto e atuando em algum trabalho desses.
Pequenas medidas para amenizar os sintomas da ansiedade na pandemia
◆ Evite o acesso e excesso de informações
◆ Gerencie sua rotina em casa
◆ Utilize a tecnologia para se aproximar de quem você gosta
◆ Dê início à atividades que você gosta
◆ Pratique o hábito da leitura
◆ Descubra novos talentos
◆ Divida sorrisos e invenções com as pessoas que moram com você
◆ Pratique meditação
◆ Faça terapia online semanalmente
◆ Cuide mais da sua higiene pessoal
◆ Participe de alguma atividade solidária
◆ Entre em contato com as pessoas que ama
◆ Faça pausas no trabalho remoto, se alongue e faça atividades físicas
◆ Respire e beba água
(Fonte: Psicóloga Nathalia Otero e professora Fabiane Pereira)
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