🏳️‍🌈 Mês do Orgulho: barbearia gera oportunidades de trabalho para pessoas LGBTQIAPN+; vídeo

Rafael Ferreira é homem trans e abriu sua própria barbearia somente com funcionários LGBTQIAPN+ pela necessidade de um espaço inclusivo

Hannah Franco
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O mercado de trabalho para a população LGBTQIAPN+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais/Transgêneros/Travestis, Queer, Intersexual, Assexual, Pansexual e Não-binários) ainda é desafiador, com preconceitos e falta de oportunidades igualitárias. Essa exclusão é ainda maior para pessoas trans e travestis, que enfrentam a discriminação pela identidade de gênero.

Pensando nisso, Rafael Ferreira, homem trans de 29 anos, decidiu empreender para incluir a comunidade no ambiente profissional. Ele é sócio-proprietário do estúdio Tman Barber, uma barbearia apenas com funcionários trans e voltada para o atendimento ao público LGBTQIAPN+, localizada no bairro do Telégrafo (Rodovia Arthur Bernardes, nº 448).

O espaço trabalha para ser um local seguro e acolhedor para a comunidade, promovendo a antidiscriminação, diversidade e oferecendo suporte às pessoas trans em um ambiente diverso, inclusivo e produtivo.

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Empreendedorismo inclusivo

Um dos principais desafios enfrentados pelas pessoas trans e travestis no mercado de trabalho é a discriminação durante o processo de contratação, já que, muitas vezes, esses candidatos são rejeitados com base na sua identidade de gênero. Ao lado de sua esposa, Danyelle Duarte, Rafael abriu a TMan Barber para oferecer mais oportunidades para as pessoas da comunidade. "A iniciativa de abrir uma empresa junto com a minha sócia e contratar somente pessoas LGBTQIAPN+ veio principalmente do preconceito que eu passei aqui fora, de não conseguir um trabalho, de não conseguir me manter por conta da minha sexualidade e identidade de gênero. Então veio dessa necessidade de ter um espaço para que essas pessoas consigam um trabalho digno de respeito", explica o barbeiro.

Não há dados públicos concretos sobre acesso a emprego, trabalho e renda de pessoas trans no Pará. No entanto, um relatório do Grupo Pela Vidda, no Rio de Janeiro, com apoio do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, revelou que o preconceito impede que uma parte da população brasileira se profissionalize. O resultado da pesquisa mostrou que apenas 15% dos participantes trans trabalham com carteira assinada. 

De acordo com informações da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), cerca de 73% das pessoas travestis e transexuais enfrentam dificuldades para concluir o ensino médio. Rafael chegou a fazer o ensino médio, enquanto ainda era cisgênero. Porém, foi na faculdade que sentiu dificuldades em concluir sua formação, por conta do preconceito durante a transição. "Eu comecei fazendo curso de Educação Física, logo no início da transição, e foi muito difícil incluir meu nome social. Sempre me chamavam pelo nome antigo, sabendo que era Rafael e era uma situação muito constrangedora", disse o rapaz que sentiu necessidade de largar a graduação. "Como eu não tava sendo respeitado, foi muito difícil me manter ali, até eu ir na diretoria tentar mudança do nome social, mas eu não consegui na época e isso fez com que eu desistisse de um sonho", contou.

 

 

Apesar disso, Rafael conta que tais questões o incentivaram ainda mais a começar seu próprio negócio. "Todos esses acontecimentos, de mercado de trabalho e desistência do curso, me influenciaram. Então eu comecei a estudar barbearia e consegui um espaço em casa mesmo, pra cortar cabelo. Daí eu e minha esposa tivemos a ideia de ensinar alguns homens trans para trabalharem junto comigo", disse Rafael, que ensinou cinco homens e contratou um deles.

Thiago Rodrigo foi um dos homens que fizeram o curso e hoje em dia é barbeiro chefe do estúdio. "Na época eu vi que o Rafael tinha postado sobre o curso com um valor bem simbólico e eu estava desempregado. Alguns meses depois eu comecei a trabalhar aqui, vi que tinha a oportunidade de fazer uma renda e também pelo o que o espaço significa", conta o funcionário, que diz ser um local diferente. "Barbearia geralmente é um local conhecido por ser machista, que conversa só sobre mulher e futebol, e aqui é diferenciado, tem tanta coisa legal pra se falar e aprender", disse.

Atualmente, a TMan tem quatro funcionários homens trans, contando com Rafael, uma tatuadora travesti indígena e, sua esposa e sócia, uma mulher pansexual. "A gente tem muito essa ideia de passar ensinamentos sobre barbearia, empreendimento e o que mais a gente souber, para que as pessoas saiam daqui aptas para abrir seu próprio negócio e que saibam que são capazes", disse o proprietário.

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Preconceito e persistência no mercado

A transfobia e o preconceito são questões sérias e persistentes na sociedade, e esse foi um dos principais desafios enfrentados pela equipe ao abrir a barbearia. Rafael conta sobre um dos casos de discriminação que enfrentaram no estabelecimento. "Não foi fácil, né? As pessoas viam que aqui só entrava LGBT e xingavam. Teve uma situação de um carro parar aqui na frente e as pessoas gritarem 'Aí só corta cabelo de viado' e a gente se assustou. Foi a partir desse dia que a gente entendeu que ia passar por isso praticamente todos os dias", relatou.

A transfobia pode ser definida como o medo, a aversão ou o ódio direcionado às pessoas transgênero, travestis e transexuais, e se manifesta de diferentes formas, desde atitudes discriminatórias até violência física e verbal. Segundo um relatório da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), em 2022 o Brasil continuou sendo o país com mais mortes de pessoas trans e casos de transfobia do mundo pelo 14º ano consecutivo. 

 

 

Apesar dos números alarmantes, a TMan Barber resiste. "A gente corre vários riscos de vida, ficamos muito vulneráveis, justamente por expor que somos LGBT. Mas a gente não desiste e, agora, acho que as pessoas entenderam que a gente não vai sair daqui, que vamos resistir. Se apoiar, manter firme e forte é o que vai levar a gente para onde devemos ir", disse.

Espaço acolhedor para a comunidade LGBTQIAPN+

O acolhimento de pessoas trans em espaços é um aspecto fundamental para promover a inclusão e garantir que todos se sintam bem-vindos e respeitados em diferentes ambientes. "Queremos que elas venham no estúdio e se sintam acolhidas e respeitadas por nós. Temos um espaço seguro que a gente consegue fazer um serviço de qualidade, que é a nossa missão, pra trazer essas pessoas pra cá. Aqui não existe outro espaço que seja igual o nosso com um recorte de pessoas da comunidade, com uma bancada somente de homens trans. As pessoas chegam aqui totalmente livres para serem quem elas realmente são, porque sabem que não vão ser desrespeitadas", diz Rafael.

Por conta do espaço seguro, a barbearia recebe clientes que moram longe, mas que fazem questão de frequentar o estabalecimento. Como é o caso de Lana Larrá, transfeminista e ativista LGBTQIPN+, que frequenta a barbearia desde o começo. Hoje ela mora distante do local, mas não deixou de ser uma cliente fiel. "Eu venho fortalecer o trabalho da minha comunidade, de pessoas trans, sabe? Tem tanta gente invisibilizada e que não tem emprego formal, mas que lutou pra sobreviver de alguma forma. E esse é o trabalho do Rafa e do Thiago, que são dois homens trans que estão diariamente na luta e ganharam formas de auto sobrevivência", explica Lana.

image Rafael Ferreira e Lana Larrá na TMan Barber (Igor Mota/OLiberal)

Além de oferecerem serviços de barbearia, os funcionários dialogam com quem necessita de um acolhimento e entendimento sobre as dificuldades de pessoas trans. "Pessoas que estão no processo de transição chegam aqui e conseguem desabafar com a gente e pegar informações de saúde, porque conseguimos fazer uma orientação. Eu acho isso tão importante, por mais que a gente não seja da área da saúde, sabemos como orientar para que aquela pessoa faça uma transição segura, que não faça por conta própria", conta Rafael. 

"Desde o início do nosso empreendimento percebemos que as pessoas que vinham não se entendiam e, ao chegar e conhecer a gente, abriam a mente. Muita gente não sabe que aqui em Belém tem um hospital que faz essa transição de forma segura e isso é muito importante", diz Rafael. A unidade a qual ele se refere é o Jean Bitar (HJB), único hospital público do Pará a ofertar esses atendimentos a comunidade trans. Através do Projeto Casulo, o paciente pode ser encaminhado para Policlínica Metropolitana para realizar o processo transexualizador de redesignação sexual.

"Eu me orgulho muito do espaço que a gente tem, porque as pessoas se sentem amadas. É um respeito, é um carinho muito grande e eu acredito que a importância do nosso espaço é que as pessoas venham e se sintam acolhidas com a gente", conclui.

Quer aprender mais sobre as pessoas LGBTQIAPN+? Assista o vídeo.

*(Hannah Franco, estagiária de jornalismo, sob supervisão de Tainá Cavalcante, editora web de OLiberal.com)

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